Principais Atualidades de 2016
Ciência:
técnica pode tornar realidade a produção de “bebês sob medida”
Pontos-chave
Uma nova técnica de edição do DNA conhecida como
CRISPR promete grandes avanços na biologia e na medicina, mas desperta polêmica
pelo potencial de alterar genes humanos e produzir “bebês sob medida”.
Uma nova técnica de manipulação do genoma conhecida
como CRISPR/Cas9 (pronuncia-se “crísper-cás-nove”) vem conquistando cientistas
ao redor do planeta. Criada em 2012, hoje ela se popularizou e promete
impulsionar descobertas nas áreas de biologia e medicina.
A expectativa é que no futuro o uso da CRISPR/Cas9 em
pesquisas possa curar doenças genéticas alterando o DNA (conjunto de moléculas
que carrega a informação genética de todos os seres vivos). Mas essa técnica
abre caminho para outra possibilidade: realizar uma “edição” do genoma de maneira
barata, fácil e precisa.
A CRISPR (sigla em inglês para “clustered regularly
interspaced short palindromic repeats”; em português, repetições palindrômicas
curtas agrupadas e regularmente interespaçadas) é um mecanismo de defesa do
corpo humano. Trata-se de uma parte do sistema imunológico bacteriano, que
mantém partes de vírus perigosos ao redor para poder reconhecer e se defender
dessas ameaças no futuro.
A segunda parte desse mecanismo de defesa é um
conjunto de enzimas chamadas Cas, que podem cortar precisamente o DNA e
eliminar vírus invasores. Existem diversas enzimas Cas, mas a mais conhecida é
chamada Cas9. Ela vem da Streptococcus pyogenes, uma bactéria conhecida por
causar infecção na garganta.
Como
funciona o método
O método usa uma proteína (enzima chamada Cas9) guiada
por uma molécula de RNA que corta as fitas de DNA em pontos específicos e ativa
vias de reparo. É possível desativar, ativar ou inserir novos genes. Embora
tenha sido descoberta em 2012, a técnica tornou-se mais popular nos últimos
dois anos. Uma justificativa para isso é que ela permite que a modificação de
genomas com uma precisão nunca antes atingida.
“É como um canivete suíço que corta o DNA em um local
específico e pode ser usado para introduzir uma série de alterações no genoma
de uma célula ou organismo”, diz a definição da técnica da bióloga Jennifer
Doudna, da Universidade da Califórnia, em Berkeley (EUA), uma das pioneiras na
aplicação do mecanismo.
Ao retirar partes defeituosas do genoma, pesquisadores
estão conseguindo eliminar mutações em células de animais e plantas. Em janeiro
deste ano, cientistas norte-americanos utilizaram a técnica para cortar a parte
de um gene defeituoso em ratos com distrofia muscular de Duchanne, doença
genética rara. O experimento permitiu que as células dos animais produzissem
uma proteína essencial para os músculos. A pesquisa foi o primeiro caso de
sucesso da CRISPR/Cas9 em mamíferos vivos.
Cientistas já estão encontrando novas formas de
aplicações da técnica, como desenvolver terapias que ajudem na cura de doenças
como câncer, leucemia e hemofilia. Algumas pesquisas testam limites éticos da
ciência e reavivam os debates sobre experimentos com embriões humanos e
mutações nos genes humanos.
Com a técnica, seria possível “forçar” organismos a
repassarem certos traços genéticos hereditários, sejam naturais ou inseridos
pelo método. O temor é que essa possibilidade abra precedentes para a criação
de “bebês sob medida”.
Por exemplo, cientistas poderão editar genes para
gerar bebês com características físicas específicas, como a cor dos olhos, do
cabelo ou da pele. A possibilidade do “design” de bebês ainda não foi
comprovada, mas novas pesquisas podem avançar nessa questão.
Em 2017, o Instituto Karolinska de Estocolmo, na
Suécia, obteve aprovação para testar a técnica em embriões humanos. Eles
esperam que, por meio da desativação de determinados genes, seja possível
compreender melhor os primeiros estágios do processo de desenvolvimento humano.
O objetivo é melhorar a eficácia dos tratamentos de fertilização.
O
primeiro teste em humanos
No final de 2016, cientistas chineses já anunciaram
testes de engenharia genética com embriões humanos. A equipe queria consertar
um gene defeituoso, causador da talassemia beta. O resultado da edição não
obteve sucesso --os genes modificados sofreram mutações aleatórias.
No estudo chinês, foram utilizados embriões não
viáveis, que nunca poderiam gerar um bebê. Agora os cientistas do Instituto
Karolinska estão usando zigotos sadios que estavam congelados em clínicas de
fertilização, mas seriam descartados.
No Reino Unido, o uso da CRISPR/Cas9 foi aprovado
recentemente para pesquisas em embriões humanos que buscam melhorar a qualidade
das fertilizações in vitro e reduzir o número de abortos.
Os especialistas afirmam que a edição em linhagens
germinativas (óvulos e espermatozoides) apresenta barreiras como o risco de
edição imprecisa, dificuldade de prever efeitos danosos e dificuldade de
remoção da modificação. Serão necessários inúmeros experimentos para conseguir
a possibilidade da alteração de forma precisa e segura.
Outro temor da comunidade científica é que, em mãos
erradas, a tecnologia que edita o DNA possa reavivar ideologias perigosas como
a eugenia, que prega a “melhoria genética” das populações humanas. Durante a
Segunda Guerra Mundial, o nazismo usou a eugenia para justificar o genocídio
dos judeus e de minorias. O Estado buscou eliminar da sociedade alemã qualquer
tipo de pessoa que não fosse ariana ou que apresentasse alguma deficiência
mental ou física.
No entanto, o design de bebês ainda é realidade muito
distante. Além da falta de pesquisas que asseguram a estabilidade do processo,
o tema deve passar por uma forte regulação judicial. Atualmente, muitos países
proíbem estudos com embriões humanos. No Brasil, a lei de biossegurança
brasileira, de 2005, deixa claro ser proibida a “engenharia genética em célula
germinal humana, zigoto humano e embrião humano”.
Guerra
na Síria: cessar-fogo tenta negociar fim do conflito após cerco em Aleppo e
morte de embaixador russo
Pontos-chave
Aleppo, a segunda maior cidade síria, era controlada
por rebeldes na guerra civil da Síria. A retomada da cidade é um importante
avanço estratégico para o presidente sírio Bashar al-Assad.
As tropas do presidente cercaram Aleppo, confinando
seus moradores. Casas foram invadidas e muitos civis foram mortos.
O cerco gerou uma crise humanitária e a ONU teme um
massacre e a morte em massa de civis. A retirada de moradores foi negociada ao
longo de dezembro.
No dia 19 de dezembro, logo na sequência da retirada
em massa de civis de Aleppo, um policial matou a tiros o embaixador russo na
Turquia, Andrei Karlov. Antes de efetuar os disparos, o policial turco disse
agir como vingança pela tragédia da cidade de Aleppo, que voltava às mãos de
Assad com apoio bélico do governo russo.
Rússia e Turquia tentam costurar um acordo de
cessar-fogo entre o governo sírio e os rebeldes. A Rússia apoia as tropas de
Bashar al-Assad.
Após cinco anos de conflitos, a guerra civil na Síria
teve mais um episódio marcante: a retirada de civis de Aleppo, a segunda maior
cidade do país e que hoje está praticamente em ruínas devido a explosões,
bombardeios, confrontos e embates civis. Nos próximos dias, é esperada a vitória
de Bashar al-Assad em Aleppo.
Aleppo tornou-se um símbolo do conflito. Desde
setembro de 2015 a cidade é disputada entre as forças sírias, apoiadas pela
Rússia, e rebeldes opositores ao governo do presidente Bashar al-Assad.
A estratégia das forças do governo é fazer um cerco à
cidade, com apoio aéreo russo. Desde 15 de novembro a ofensiva do regime avança
de forma acelerada, visando o controle total dos bairros
Dentro do atual cenário, a retirada dos civis
confinados era algo positivo, já que pontos da cidade controlados pelos
rebeldes estavam cercados pelas forças militares, impedindo o acesso da
população a suprimentos essenciais como água, comida e remédios.
Antes desse bloqueio e do cessar fogo para a retirada
dos civis, o governo do presidente Bashar al-Assad colocou em prática o plano
de retomada da cidade, sem no entanto, evitar atos bárbaros, considerados crime
contra a humanidade. A ofensiva aconteceu entre 27 de novembro e 9 de dezembro.
Casas foram invadidas e moradores foram executados à
queima-roupa. Há relatos de abusos sexuais por parte dos militares, boatos de
que mulheres cometeram suicídio e mataram as próprias filhas para fugir da
violência, além de bombardeios indiscriminados. O conselheiro da ONU para a Síria,
Jan Egeland, falou em “massacre de civis desarmados, de homens jovens, de
mulheres, de crianças, de funcionários de saúde”, que poderiam ter sido
cometidos pelas forças do governo ou milícias que apoiam Assad.
A questão foi novamente parar na ONU para que uma
retirada “pacífica” de civis fosse negociada. A retirada aconteceu a partir do
dia 14 de dezembro, mas novos confrontos bélicos entre militares e
manifestantes quebraram o cessar-fogo. Depois, no dia 18, dois ônibus que
realizavam a retirada da população foram atacados, paralisando novamente o
processo.
Houve uma fuga em massa. Mais de 20 mil pessoas foram
retiradas dos redutos rebeldes de Aleppo e levadas para bairros controlados
pelos opositores do governo. A retomada da cidade representa a maior vitória de
Assad desde o início da guerra em 2011, que deixou mais de 310 mil mortos e
provocou o deslocamento de metade da população do país.
No entanto, o conflito no país continua repercutindo
no mundo. No dia 19 de dezembro, logo na sequência da retirada em massa de
Aleppo, um policial matou a tiros o embaixador russo na Turquia, Andrei Karlov,
em uma galeria de arte em Ancara. O crime foi cometido na frente de
jornalistas, visitantes e câmeras que registravam o discurso do embaixador.
Antes de efetuar os disparos, o policial turco disse agir como vingança pela
tragédia da cidade de Aleppo, que voltava às mãos de Assad com apoio bélico do
governo russo.
Para especialistas e representantes dos governos russo
e turco, o incidente poderia colocar mais obstáculos na geopolítica da guerra
da Síria. Os dois países estão de lados opostos no tabuleiro: a Rússia dá apoio
incondicional a Assad, enquanto a Turquia defende uma reação mais controlada do
governo sírio para evitar mais mortes e chegou a oferecer treinamento aos
rebeldes.
Para a surpresa de muitos, os dois países se uniram
para acordar um cessar-fogo entre o governo sírio e os rebeldes a partir da
meia-noite do dia 30 de dezembro, a ser seguido por negociações de paz. O
objetivo do acordo, segundo divulgaram os governos russo e turco, é conseguir
uma solução em concordância com a resolução 2254 do Conselho de Segurança da
ONU.
Aprovada por unanimidade em dezembro de 2015, a
resolução 2254 deu à ONU um papel reforçado na promoção do diálogo entre os
lados opostos e nas negociações de uma transição política, endossando um
calendário para o cessar-fogo, para uma nova Constituição e para eleições.
O maior problema da guerra da Síria hoje é que não se
trata apenas de rebeldes x forças do Exército sírio. Em cinco anos, o conflito
se multiplicou e envolve centenas de grupos armados: forças do governo sírio,
rebeldes, curdos, radicais islâmicos e potências estrangeiras. De um lado,
Rússia e Irã apoiam o governo da Síria. De outro, os Estados Unidos e países
europeus apoiam os rebeldes que buscam derrubar Assad. Talvez a única coisa em
comum entre todos esses grupos seja a resistência ao Estado Islâmico.
Tudo isso é um grande obstáculo a ser vencido na hora
da negociação de um amplo acordo de paz. Afinal, é preciso que todos os lados
decidam pela paz, deixando seus interesses individuais em segundo plano. Resta
saber se isso será possível ou se a sangrenta guerra na Síria ainda terá vida
longa.
Anfíbios
: Por que estão desaparecendo?
Pontos-chave
Os anfíbios estão morrendo a taxas alarmantes. Esses
animais são muito sensíveis a alterações tanto do ambiente aquático como do
solo e do ar.
A perda do habitat natural, doenças provocadas por
fungos, as mudanças climáticas, espécies invasoras, o comércio ilegal de
animais silvestres e a poluição do ar e da água.
Os anfíbios são animais especialmente sensíveis a
alterações climáticas. Eles são animais ectotérmicos, ou seja, são incapazes de
controlar fisiologicamente a temperatura corporal. Extremos de temperatura
podem afetar o metabolismo desses animais.
O fungo Batrachochytrium dendrobatidis (Bd) é apontado
como uma das principais causas do declínio das populações de anfíbios em
diferentes regiões do mundo.
O Brasil possui a maior fauna de anuros do mundo
(sapos, rãs e pererecas), com quase 900 espécies já identificadas.
Imagine uma noite de verão. O ar está úmido, você está
perto de um rio e escuta o vibrante coaxar de sapos, que podem ser ouvidos de
longas distâncias. Esse som tão comum está se tornando cada vez mais raro.
Biólogos temem que o planeta esteja passando por uma
extinção em massa de animais. A defaunação – como é conhecida a diminuição
acentuada da biodiversidade– avança a passos largos. Projeções estimam que o
volume de vertebrados caia, até 2020, para um terço do nível de 1970.
Os anfíbios são o grupo de animais vertebrados mais
ameaçado de extinção. Sapos, rãs, pererecas, salamandras, cobras-cegas e
cecílias estão morrendo a taxas alarmantes. Um levantamento publicado em 2010
na revista Science revelou que mais de 40% das espécies de anfíbios estavam
ameaçadas de extinção.
Em outubro deste ano, a morte de um sapo comoveu a
comunidade científica. Batizado com o nome de Toughie, o animal faleceu no
Jardim Botânico de Atlanta, nos Estados Unidos. Ele era oficialmente o único
exemplar vivo da espécie sapo-franja. Toughie foi capturado em 2005 nas
florestas do Panamá, em um local que havia mortandade em massa de sapos.
Estudos estimam que desde a década de 1970, mais de
200 espécies de sapos foram extintas. Toughie foi um dos vários animais em
extinção, cuja imagem foi projetada na Basílica de São Pedro durante as
negociações climáticas em Paris, no ano passado.
Os anfíbios sempre foram animais resistentes, capazes
de se adaptar a grandes transformações. Eles existem há mais de 350 milhões de
anos e foram os primeiros animais a apresentar musculatura para se sustentar
fora da água e “caminhar” na Terra. Sobreviveram a diversas glaciações e à
catástrofe que exterminou os dinossauros. Diante de tamanha facilidade de
adaptação, por que hoje eles estão tão vulneráveis?
Essas alterações climáticas históricas ocorreram em
períodos longos. Apesar de muitas espécies se extinguirem, muitas outras foram
capazes de migrar para ambientes favoráveis e assim sobreviver. O problema é
que a pressão sob o ambiente hoje está sendo feita em uma velocidade maior que
a de evolução ou adaptação de muitas espécies.
A palavra em anfíbio vem do latim (anfi = duplo e bios
= vida) e os define como animais que passam parte do ciclo de vida em ambiente
aquático e parte em ambiente terrestre. Os anfíbios precisam da umidade e são
animais especialmente sensíveis a alterações climáticas, tanto do ambiente aquático
como o do solo e do ar.
Eles são animais ectotérmicos, ou seja, são incapazes
de controlar fisiologicamente a temperatura corporal. Extremos de temperatura
afetam diretamente o metabolismo desses animais.
O fenômeno do aquecimento global aumenta a temperatura
dos ambientes frescos e úmidos onde vivem os anfíbios e podem tornar esses
locais mais desertos e inadequados para a sua sobrevivência. Mas não é só a
temperatura. Os eventos climáticos mais extremos estão ficando mais comuns.
O desaparecimento do sapo-dourado da Costa Rica é
atribuído a uma mudança do clima. Ele foi visto pela última vez em 1989 e desde
então seu paradeiro é um mistério. A reprodução dessa espécie acontecia somente
na temporada chuvosa e sob condições ideais. Em 1987, uma longa estiagem deixou
o ar seco e causou uma redução drástica no número de anfíbios, o que pode ter
sido fatal para sua sobrevivência e das novas gerações. Uma seca inesperada
pode secar um depósito de água no solo e matar todos os ovos e larvas que ali
viviam.
A poluição de águas e a chuva ácida (resultado da
poluição do ar) também afetam diretamente os anfíbios. A pele deles é muito
permeável. Quando eles entram em contato com a água poluída, podem absorver
substâncias tóxicas fatais.
Esse parece ser o caso dos sapos do Lago Titicaca, na
América do Sul. Em outubro, 10 mil exemplares da espécie Telmatobius coleus
foram encontrados mortos. A causa mais provável é a poluição gerada pelo
despejo do esgoto de indústrias próximas.
O contato com espécies exóticas (que não são naturais
do habitat) também altera o equilíbrio da cadeia alimentar. Os axolotes são um
tipo de salamandra e vivem nos lagos próximos à Cidade do México. A poluição
dos lagos e a introdução de espécies forasteiras como a carpa asiática e a
tilápia africana (quem comem esses pequenos animais) estão acabando com os
axolotes. Biólogos mexicanos calculam que sua extinção poderia chegar antes de
2020.
Mas espécies de anfíbios que estão desaparecendo
também vivem em áreas isoladas e preservadas, onde não existem córregos sujos
ou poluentes. O que estaria acontecendo?
Umas das principais causas da extinção em massa em
florestas é o fungo Batrachochytrium dendrobatidis, ou Bd, que pode ser
considerado um verdadeiro exterminador de anuros (sapos, rãs e pererecas) e
salamandras.
O Bd foi identificado em 1998 no Panamá e hoje está
presente em todos os continentes. Esse fungo causa uma doença na pele e tem
sido apontado como a causa da extinção de até 700 espécies de anfíbios nas
últimas três décadas. Em uma floresta panamenha, pesquisadores identificaram
que o fungo foi responsável pela morte de 30 espécies de anfíbios em apenas um
ano.
Ao encontrar um anfíbio hospedeiro, o Bd se aloja na
pele fina e úmida dele e pode alterar o equilíbrio de eletrólitos(íons) dos
músculos, podendo dificultar a respiração e até levar a um colapso cardíaco.
Após ser contaminado, um sapo doente dura apenas poucas semanas. O fungo pode
dizimar um grupo completo.
Outros parasitas também podem ser letais, como o fungo
Batrachochytrium salamandrivorans ou Bsal, que está dizimando algumas
populações de salamandras na Europa e os ranavírus, que atacam os girinos.
A globalização e o comércio internacional de animais
agrava o problema, pois ao introduzir espécies exóticas em um ambiente, elas
podem espalhar doenças novas em animais nativos que não tem imunidade a elas.
O Brasil possui a maior fauna de anuros do mundo
(sapos, rãs e pererecas), com quase 900 espécies já identificadas. Mas poucos
estudos são feitos para monitorar essas populações.
Os principais motivos do declínio de anfíbios por aqui
são o desmatamento, a poluição e a intensa pressão antrópica, provocada pelo
crescimento das cidades e da agricultura, que torna os ambientes naturais mais
fragmentados e cada vez menores.
Muitos anfíbios precisam de ambientes específicos para
se reproduzir. Por exemplo, uma espécie de perereca que deposita ovos em
bromélias depende dessas plantas para sua população existir.
A maior parte das espécies consideradas em perigo
vivem na Mata Atlântica. Esse bioma possui grande diversidade, mas foi reduzido
a 7% de sua cobertura original. O avanço das fronteiras agrícolas sob outros
biomas, como a Amazônia e o Cerrado também representam uma ameaça, muitas vezes
em espécies que ainda nem foram descobertas.
A diminuição dos anfíbios no mundo põe em risco o
equilíbrio ecológico do planeta e pode aumentar as populações de insetos, algas
e outros organismos dos quais eles se alimentam. Além disso, pode haver perdas
nas pesquisas para novos e potenciais medicamentos. Salamandras, por exemplo,
são reconhecidas pela capacidade de regeneração de partes do corpo.
Biologia:
cientistas descobrem 1.445 novos vírus em seres invertebrados
Pontos-chave
Em novo estudo publicado na Nature, cientistas revelam
ter descoberto 1.445 novos vírus em seres invertebrados –aqueles sem espinhas
dorsais, como insetos, aranhas e vermes.
Os invertebrados são hospedeiros de uma grande
diversidade de vírus.
Eles são organismos microscópicos e apresentam
diferentes formas e tamanhos. Estão por toda parte: no ar, no fundo dos
oceanos, no subsolo e dentro do corpo humano. Sua estrutura é formada por
material genético (moléculas de RNA ou DNA) com uma cobertura de proteína.
Alguns cientistas nem os consideram seres vivos, porque não têm metabolismo
próprio: para se multiplicar, invadem as células de animais e plantas.
A palavra “vírus” tem origem no latim e significa
veneno. Os vírus são considerados como o maior inimigo da vida porque causam
doenças como a gripe, dengue, ebola, catapora, zika, sarampo, paralisia
infantil, varíola, AIDS, febre amarela, entre muitas outras.
Apesar dos perigos que esse punhado de viroses
representam para a saúde, elas são apenas uma pequena fatia da virosfera.
Em novo estudo publicado na revista científica Nature,
cientistas revelam ter descoberto 1.445 novos vírus. O trabalho é resultado de
uma colaboração entre a Universidade de Sydney e o Centro Chinês para Controle
e Prevenção de Doenças em Pequim.
O “mapeamento” desses vírus foi feito com novas
tecnologias em metagenômica, método de pesquisa que utiliza o material genético
recuperado diretamente a partir de amostras ambientais.
Os cientistas escolheram estudar o material genético
de mais de 200 espécies de invertebrados (aqueles que não possuem espinha
dorsal), como insetos, aranhas, vermes e moluscos. Muitos deles que vivem
próximos a nós. Os invertebrados são o grupo mais populoso do planeta e
representam 97% de toda a espécie animal.
“Este estudo inovador reescreve o livro de virologia,
mostrando que os invertebrados transportam um número extraordinário de vírus,
muito mais do que pensávamos”, disse o professor Edward Holmes, do Instituto
Marie Bashir de Doenças Infecciosas e Biossegurança, que liderou as pesquisas
em Sydney.
Segundo o professor Holmes, a maioria dos grupos de
vírus que infectam vertebrados, incluindo seres humanos, são de fato derivados
daqueles presentes em invertebrados, ou seja, eles são os hospedeiros “originais”
para muitos tipos de vírus.
O estudo também descobriu que esses vírus estão
associados aos invertebrados por bilhões de anos, ao invés de milhões de anos
como se acreditava.
Diante das recentes epidemias, a descoberta de 1.445
vírus pode ser considerada assustadora. Mas calma --segundo os cientistas do
estudo, é provável que apenas alguns deles sejam patogênicos (causadores de
doenças) e que a maioria não seja transmitida facilmente aos humanos.
Apesar de os insetos serem hospedeiros de inúmeros
vírus, Holmes avalia ainda que as pessoas não precisam ter medo deles, porque
apenas uma minoria provoca doenças contagiosas, como a zika e a dengue. Ele
também lembra que os insetos são fundamentais para o equilíbrio do ecossistema.
As conclusões desse estudo podem explicar melhor a
origem, a evolução, as formas de transmissão e propagação e as melhores
técnicas de tratamento de diferentes doenças causadas por vírus.
Vírus
e doenças emergentes
Em 1899, o botânico holandês Martinus Beijerinck
(1851-1931) demonstrou que o agente da doença do mosaico do tabaco era menor do
que uma bactéria e que de alguma forma ele incorporava-se às células de uma
planta hospedeira viva. Ele foi o primeiro a identificar o que seria um vírus e
por isso é considerado o "pai da virologia".
Existem vírus em todas as espécies que tem células. Os
vírus foram isolados e fotografados pela primeira vez na década de 1950. Desde
então, a pesquisa na área da virologia evoluiu em ritmo acelerado, com novas
ferramentas de laboratório disponíveis.
É impossível calcular o número total de vírus que
existem no planeta e quais serão as doenças do futuro. A certeza é que cada vez
mais teremos contato com vírus desconhecidos. Isso porque a população mundial
está expandindo e circulando por novas áreas.
Ao entrar em locais nunca antes habitados, o homem
pode ter contato com novas espécies e microorganismos estranhos. Nessa
situação, o vírus já habitava o local, estando inerte e inofensivo, muitas
vezes por milhares de anos. Ao entrar em contato com seres vivos e encontrar
condições adequadas, pode se hospedar neles e espalhar infecções até então
desconhecidas. São considerados emergentes vírus como o zika vírus e o ebola,
responsáveis por recentes epidemias.
Além disso, o vírus pode sofrer mutação em contato com
estimulantes externos e novas estirpes virais podem ser formadas pela troca de
genes entre diferentes cepas. Por exemplo, quando um animal é infectado por mais
de uma cepa viral, seus genes podem se misturar e formar partículas virais com
novas propriedades. Cada mutação pode trazer mudanças no comportamento do
vírus.
O mundo globalizado representa um desafio à saúde
pública. Numa sociedade conectada e que viaja com frequência, vírus letais têm
o potencial de se espalhar rapidamente por diversos pontos do planeta, num
fenômeno conhecido como pandemia (epidemia globalizada).
Dia
Mundial da Luta contra a Aids: mortalidade cai no Brasil, mas doença avança
entre homens jovens
Pontos-chave
Desde 1981, 25 milhões de pessoas morreram em todo o
mundo por doenças relacionadas à Aids. De lá para cá, muita coisa mudou. Com o
avanço das pesquisas médicas, o HIV deixou de ser uma infecção letal.
827 mil brasileiros são portadores do vírus HIV.
Segundo o Ministério da Saúde, a epidemia está estabilizada. Ainda assim, mais
de 41 mil novos casos surgem por ano no país e não há uma queda de novas
infecções. 112 mil brasileiros desconhecem ter o vírus.
A doença tem avançado principalmente entre homens
jovens. Os casos de Aids no Brasil aumentaram 40%, de 2006 a 2015, entre jovens
de 15 a 24 anos.
No Brasil, a mortalidade pela doença caiu 42% em 20
anos, com a ampliação do diagnóstico e do tratamento.
Simbolizado por um laço de fita vermelho, o Dia
Mundial de Luta contra a Aids é celebrado em 1º de dezembro. A data foi criada
em 1998 e serve para dar visibilidade à doença, combater o preconceito e
informar corretamente as formas de transmissão do vírus.
A Aids não tem cura, está em todos os continentes e
ainda representa um dos problemas de saúde mais graves em todo o mundo. Hoje,
mais de 33 milhões de pessoas vivem com HIV e o número tende a aumentar,
principalmente na África e na Ásia.
No Brasil, os dados mais recentes do Ministério da
Saúde estimam que 827 mil pessoas sejam soropositivas. A epidemia é considerada
estável pelo governo, com taxa de detecção em torno de 19,1 casos para cada 100
mil habitantes. Ainda assim, mais de 41 mil novos casos surgem por ano no país
e não há perspectiva de uma queda de novas infecções.
Do total de infectados brasileiros, 455 mil pessoas
estão em tratamento e 260 mil sabem do seu estado, mas não começaram a se
tratar. E mais: 112 mil desconhecem sua condição, o que eleva a chance de
transmissão involuntária para outras pessoas. Elas podem ter o vírus e não
sentir nenhum sintoma.
A boa notícia é que o número de vítimas fatais vem
apresentando redução no país. Nos últimos 20 anos, houve uma queda de 42,3% nas
mortes provocada pela doença. A taxa caiu de 9,7 óbitos para cada 100 mil
habitantes em 1995 para 5,6 óbitos em cada 100 mil habitantes em 2015. Para o
Ministério da Saúde, o resultado se deve a campanhas de incentivo ao
diagnóstico e à adesão a tratamentos ainda no estágio inicial.
Outro dado positivo é a diminuição na transmissão do
HIV de mãe para filho --o índice caiu 36% de 2010 a 2015. Os motivos são a
ampliação da testagem no pré-natal e o aumento da oferta de medicamentos para
gestantes.
Mas ainda existem motivos para preocupação. Embora a
epidemia de Aids seja considerada estável, o Brasil enfrenta agora o desafio de
blindar o crescimento da incidência da doença entre jovens.
Segundo pesquisa do Ministério da Saúde, os casos de
Aids entre jovens de 15 a 24 anos aumentaram 40% de 2006 até 2015 em todo país.
Entre os motivos apontados estão a falta de acesso a
serviços de saúde e a menor adesão desse grupo ao tratamento --pesquisas
indicam que essa população não mantém o hábito de frequentar unidades de saúde.
Entre os jovens de 18 a 24 anos, apenas 57% estão em tratamento.
Mas o principal fator tem a ver com a falta de
prevenção: os jovens estão usando menos preservativos nas relações sexuais. O
fato é que muitos contraem a doença porque estão mal informados, não porque não
existam campanhas educativas. A avaliação dos médicos sobre a epidemia entre
jovens é atribuída a uma mudança cultural.
É possível que essa nova geração tenha perdido o medo
da Aids, por acreditar que ela é uma doença do passado ou que ela não mate
tanto quanto antes. Muitos também acreditam que, se pegar o vírus, é só tomar
um remédio que está tudo bem. O resultado dessa falsa percepção pode ser a
falta de uso de preservativos durante as relações sexuais.
Os jovens de sexo masculino constituem o maior número
de infecções por HIV no Brasil. A pesquisa revelou uma queda no número de
mulheres infectadas, em todas as faixas etárias. Em 2015, houve 1 caso de
mulher infectada para cada 3 casos de homens. Em 2006, a proporção era 1 caso
de mulher para cada 1,2 casos de homem.
A preocupação é ainda maior com a população jovem gay.
Em 2014, o Ministério da Saúde estimou que 0,4% da população brasileira estaria
infectada pelo HIV. Mas, entre homens que fazem sexo com outros homens maiores
de 18 anos, a taxa subiria para 10,5%.
Outros grupos vulneráveis ao contágio são formados por
profissionais do sexo e por usuários de drogas, especialmente nas camadas mais
pobres da população.
A
doença e sua transmissão
A Aids é uma doença causada pelo HIV, sigla para Vírus
da Imunodeficiência Humana. Ela se caracteriza pelo enfraquecimento do sistema
imunológico do corpo. Mas ter o vírus não significa necessariamente ter Aids.
Uma pessoa é considerada soropositiva quando apresenta o HIV no sangue. Quando
manifesta forte deficiência no sistema imunológico, ela é considerada doente.
O HIV destrói o sistema imunológico e se “alimenta”
das células que defendem o corpo de infecções e doenças. Quanto mais o vírus
ataca, mais vulnerável o corpo fica. Quando o organismo não tem mais forças
para combater os agentes externos, aparecem micróbios e doenças oportunistas
--como a tuberculose, pneumonia, a meningite ou o sarcoma de Kaposi, um tipo de
câncer. Se não tratadas, essas infecções podem levar à morte.
Uma vez que o HIV se instalou no corpo, o portador
pode transmiti-lo para outra pessoa através de relações sexuais sem
preservativos ou pelo contato com sangue contaminado (transfusão de sangue,
cortes no corpo e compartilhamento de seringas). Uma mãe que tenha HIV e não
faça o tratamento também pode transmitir o vírus para o filho, tanto na gestação
quanto na amamentação.
A detecção do vírus é feita por exame de sangue e os
tratamentos mais comuns são feitos com a combinação de drogas antirretrovirais
que têm como objetivo aumentar a sobrevida das pessoas infectadas. Elas atuam
no fortalecimento das defesas do organismo e na prevenção de infecções.
Aids
ontem e hoje
O mundo começou a viver uma epidemia de Aids a partir
da década de 1980. Os primeiros casos da doença surgiram em países africanos,
mas o primeiro registro oficial foi em 1981, nos Estados Unidos.
Nos primeiros anos da doença, foram definidos alguns
grupos de risco para caracterizar os mais expostos ao HIV. Os grupos de maiores
vítimas eram os homossexuais masculinos, os usuários de drogas injetáveis e os
profissionais do sexo.
Por ter se espalhado rapidamente em comunidades gays,
a Aids ganhou a referência pejorativa de “peste gay”, o que fez o preconceito
aumentar ainda mais contra essas minorias.
Mas, logo depois, a doença apareceu em homens
heterossexuais, mulheres e crianças que haviam passado por cirurgias ou
recebido transfusões de sangue. A sociedade aprendeu que o vírus não escolhia
gênero ou opção sexual e que ele havia se tornado uma epidemia planetária.
Atualmente não se usa mais a expressão “grupo de
risco”. O mais correto é falar em comportamentos ou situações de riscos, porque
o vírus se espalha de forma geral, todo mundo pode pegar. São considerados os
principais comportamentos de risco ter relações sexuais sem proteção e compartilhar
seringas e agulhas.
No início, a medicina ainda não sabia como
diagnosticar a enfermidade. Teve até quem achasse que a Aids pudesse ser
transmitida pelo ar. O pânico assustou profissionais de saúde e portadores. O
tempo entre o diagnóstico e a morte era de apenas seis meses. A infecção pelo
HIV passou a significar uma verdadeira sentença de morte. Em 1983,
pesquisadores isolaram o vírus pela primeira vez e, em 1987, surgiu a primeira
droga para ajudar no tratamento da doença.
A falta de informação sobre a doença fez com que os
portadores de HIV fossem discriminados. Muita gente se recusava a apertar a mão
ou mesmo tocar em soropositivos. Ainda hoje existe um forte estigma a ser
combatido.
A sociedade tinha a imagem de que a doença era realmente
mortífera. A geração de jovens que cresceu nessa época presenciou a morte de
ídolos como os cantores Freddie Mercury, Cazuza e Renato Russo, o jogador de
basquete Magic Johnson e o cartunista Henfil e seu irmão Betinho.
Desde 1981, 25 milhões de pessoas morreram em todo o
mundo por doenças relacionadas à Aids. De lá para cá, muita coisa mudou. Com o
avanço das pesquisas médicas, a síndrome deixou de ser letal. Quem faz o
tratamento e toma corretamente os medicamentos pode viver muitos anos e levar
uma vida quase normal.
Enquanto isso, a ciência sonha em descobrir uma vacina
segura e eficaz. Diversos compostos já estão sendo testados. O maior obstáculo
é a complexidade do HIV, um vírus com alta taxa de mutação.
O Brasil é considerado pela Organização Mundial da
Saúde como um dos países mais avançados em programas de prevenção e tratamento
da doença. O modelo brasileiro virou referência e prevê a produção de remédios
localmente, sem o pagamento de royalties para laboratórios internacionais. Aqui
o teste de HIV pode ser feito gratuitamente em postos de saúde, que também
distribuem medicamentos e preservativos de graça.
África:
o continente devastado pela Aids
A África é o continente que reúne o maior número de
pessoas contaminadas. Sete em cada dez ocorrências de Aids no mundo se
concentram no continente africano. A doença já matou 17 milhões de africanos.
Em alguns países, as estatísticas são assustadoras. Em
Botsuana, mais de um terço da população adulta vive com o HIV. Na África do
Sul, 20% da população está contaminada, no total de 4,2 milhões de pessoas.
A doença possui uma relação direta com a pobreza. Dos
33 milhões de soropositivos no mundo, 90% vivem em países pobres. Os governos
não possuem recursos para bancar o alto custo do tratamento e realizar programa
eficientes prevenção. E, como a população produtiva está morrendo, esses países
estão ficando ainda mais pobres. O futuro parece ainda mais comprometido: a
África concentra 90% dos casos de crianças com HIV.
A
negação da política: os políticos nunca foram tão impopulares?
O que você pensa quando escuta alguém dizendo “não
gosto de política”? A política é uma atividade inerentemente humana e está
sempre presente em nossas vidas. Ela faz parte da organização social, da
administração de um município, estado ou nação. De tudo que é público.
O político é o profissional eleito ou indicado que
atua na esfera da organização pública. Em eleições recentes, diversos
candidatos sem tradição na política conquistaram popularidade justamente por se
apresentarem como não políticos --pessoas que não possuem experiência política
e trajetória no governo.
Na cidade de São Paulo, o prefeito eleito João Doria
(PSDB) repetiu inúmeras vezes em sua campanha a expressão “não sou político,
sou empresário”. Ele apostou na imagem de gestor e administrador de empresas
bem sucedidas, algo bem distante dos políticos tradicionais.
Em Belo Horizonte (MG), o prefeito eleito Alexandre
Kalil (PHS), empresário e ex-presidente do clube de futebol Atlético Mineiro,
lançou o slogan “Chega de político” e repetiu diversas vezes que era contra a
chamada “velha política”. Apesar de ter sido apontado por seus oponentes como
um candidato sem propostas, seus eleitores o veem como uma alternativa de
mudança, uma terceira via entre a polarização do PT e PSDB.
Também chama a atenção o alto índice de abstenção de
votos, com eleitores que votaram branco, nulo ou que não compareceram à
votação. Na capital mineira a abstenção foi de 22,77%. Em São Paulo, 21,84% dos
eleitores deixaram de votar. A porcentagem representa o maior índice de
abstenções e votos inválidos das últimas seis eleições municipais. Um sintoma
da falta de engajamento da população na política.
A afirmação de que um candidato não é um político é
errada. Isso porque toda disputa eleitoral é política e todo cargo político
envolve práticas políticas como a negociação, o debate ou votações. É
impossível governar apenas baseado em critérios técnicos. Por exemplo, uma
proposta do prefeito pode ser votada ou fiscalizada por vereadores.
Embora seja contraditório, o discurso da negação da
política tenta agradar e atender às expectativas de um público que tem rejeição
a políticos. É uma estratégia de comunicação que pode fazer sentido para eleitores
ansiosos por mudanças.
As manifestações populares que ocorreram no Brasil em
2013 desencadearam, entre outras reações, o sentimento coletivo de rejeição a
políticos. Durante as manifestações era comum a hostilização de pessoas com
símbolos partidários. Novas demandas sociais surgiram, sem que os políticos
pudessem dar uma resposta ou oferecer saídas.
Uma pesquisa feita pelo Instituto Ibope, em julho de
2015, mostrou que a confiança do brasileiro nos partidos caiu de 30 para 17,
numa escala de zero a 100. Essa decepção é uma consequência da crise nacional e
da sucessão de escândalos de corrupção que envolvem um grande número de
políticos do país, como os revelados pela operação Lava Jato.
Neste cenário, a estratégia de campanha de muitos
candidatos nas últimas eleições foi apostar na própria história e na força da
figura pessoal, sem dar muito destaque ao partido. Assim, atraíram votos de
quem não tolera a classe política e acredita que os políticos são corruptos,
desonestos, incapazes ou ladrões.
Um
novato nos Estados Unidos
Em novembro deste ano, o republicano Donald Trump foi
eleito presidente dos Estados Unidos. Sem experiência na política, ele é dono
de grandes empresas e chegou a apresentar um programa de TV nos EUA.
No início da sua candidatura, Trump representava um
tiro no escuro e alcançou o índice de rejeição mais alto da história das
pesquisas eleitorais nos EUA. Hillary Clinton, sua adversária democrata, também
tinha um alto índice de rejeição, com uma imagem que para muitos soava como a
continuidade do que já existe, “o mais do mesmo”.
Durante sua campanha, Trump repetia que não era “um
político de profissão”. Além disso, ele abusou do politicamente incorreto e
usou em toda sua campanha um discurso agressivo que envolvia críticas a
imigrantes, latinos, mulheres, mulçumanos e afro-americanos.
Apesar de ser considerado repulsivo por grande parte
do eleitorado norte-americano, a falta de papas na língua transformou Trump
como alguém que falava o que pensa. Coisas que nenhum político costuma externar
abertamente. Um discurso que fazia sentido principalmente para trabalhadores
brancos de baixa escolaridade, uma eleitorado que foi fundamental para que
Trump ganhasse.
No mundo inteiro, os índices de popularidade dos
governantes e dos políticos estão bem abaixo das médias históricas. As pessoas estão
desencantadas com a política, seja ela a tradicional ou a futura.
Segundo analistas, a decepção da sociedade com os
políticos é um fenômeno explicado por um conjunto de fatores. Os principais
fatores seriam a crise econômica e a recessão, que afetaram praticamente todos
os países do mundo ao longo da última década.
Historicamente, o índice da popularidade dos
governantes varia junto com as taxas de crescimento da economia. Se a economia
está bem, a população fica mais satisfeita. A crise também tende a aumentar o
desejo de mudança e a eficácia de discursos radicais e extremistas.
Outro fator a influenciar a política são as redes
sociais, que permitem o aumento de conexões e a troca de informações entre as
pessoas. Nas redes sociais, as polêmicas, as manifestações de ódio e a atuação
de um político se espalham rapidamente. Assim como o poder de mobilização para
uma causa.
A
negação da política e sua relação com o totalitarismo
“Deviam acabar com os partidos políticos”, “eu me
orgulho de não votar”, “o que importa é o candidato, não o partido” são frases
comuns e que demonstram o desencanto com a atividade política.
Mas o que seria um mundo sem política? Seria um lugar
mais autoritário. Um espaço sem diálogos, debates de ideias e participações
coletivas em decisões de interesse público ou da sociedade.
A palavra autoritarismo significa um modo
antidemocrático de exercer o poder. Em um mundo onde a política tem espaço, o
povo pode fazer escolhas. A eleição e a pressão popular para vetar ou aprovar
medidas afetam decisões em todos os campos: saúde, emprego, educação, leis,
obras, economia, assistência social entre outros. É por isso que um povo que se
desinteressa pela política negligencia seus próprios direitos.
O filósofo político Norberto Bobbio define um regime
autoritário como aquele que privilegia a autoridade governamental e concentra o
poder político nas mãos de uma só pessoa ou de um só órgão, colocando em
posição secundária as instituições representativas. São algumas características
a ausência de Parlamento e de eleições populares e a falta de diversidade de
partidos (outras posições políticas não são aceitas).
Após a Primeira Guerra Mundial (1914-1918), a economia
da Europa estava em frangalhos. Em meio à crise, o continente assistiu ao
surgimento de ideologias autoritárias: o nazismo e o fascismo.
A crise de 1929 agravou a situação da Alemanha,
ocasionando o desemprego e favorecendo a ascensão do Partido Nazista ao poder,
liderado por Hitler. O regime nazista tinha como características o nacionalismo,
o militarismo e o antissemitismo.
O movimento fascista surgiu na Itália no início da
década de 1920 e acabou inspirando outros regimes de políticos de viés
totalitário, como os da Espanha e de Portugal. Foram características desse
regime a forte hierarquia partidária e a valorização do aparato militar.
A União Soviética também viveu um regime autoritário,
sob o governo comunista de Stálin (1924 a 1953), com forte controle do Estado e
cerceamento às liberdades individuais.
Se a negação da política pode levar a um esvaziamento
da democracia, a resposta para a mudança parece estar na mudança da política. O
que levaria a um dilema: se são os políticos que têm o poder de fazer reformas
e mudar as regras da política, como mudar?
O voto consciente (aquele que é baseado na análise de
informações), o controle social, a conduta ética e a cobrança por resultados
parecem ser caminhos mais seguros para a transformação e para a escolha dos
futuros governantes.
Desinformação
na era da informação: o compartilhamento de mentiras e boatos na internet
Pontos-chave
Cada vez mais são compartilhadas notícias falsas pela
internet.
A divulgação de histórias falsas pode ter
consequências reais, como causar prejuízos financeiros, constrangimentos,
injúria e difamação de pessoas, empresas e organizações.
Em nosso tempo, todos nós podemos produzir e receber
informação. Se por um lado essa possibilidade democratiza a comunicação, por
outro facilita a divulgação de conteúdo feito sem responsabilidade.
O termo “pós-verdade” foi eleito pela Universidade de
Oxford como a palavra do ano de 2016. Ele diz respeito a circunstâncias nas
quais fatos objetivos e reais têm menos importância do que crenças pessoais.
O 13º salário será extinto pelo Governo brasileiro.
Obama chuta porta em protesto contra Trump. Diabo aparece em foto tirada no
Maranhão. O que essas notícias têm em comum? Todas são falsas e se espalharam
rapidamente pela internet.
Uma informação gera conhecimento, ajuda a pessoa a
construir uma opinião sobre determinado assunto e aprimora o debate público.
Mas quantas informações falsas você já compartilhou nas redes sociais ou em
grupos do WhatsApp?
Não é porque algo está publicado por amigos ou em
formato de notícia que necessariamente é verdade. Muitas vezes passamos para a
frente algo que nem paramos para pensar de onde veio. É necessário cada vez
mais cuidado e racionalidade ao ler as notícias.
Em novembro deste ano, o Facebook e o Google
anunciaram que vão combater sites que propagam notícias falsas, impedindo que
estas plataformas utilizem seus serviços de publicidade.
As medidas das duas companhias surgiram após o
Facebook ser acusado de influenciar no resultado das eleições dos Estados
Unidos. A rede social difundiu informações falsas que teriam beneficiado Donald
Trump, o candidato eleito. Uma das notícias inverídicas populares foi a de que
o papa Francisco havia dado seu apoio ao candidato republicano.
Os boatos sempre existiram. Antes mesmo de existir a
escrita, o “ouvir dizer” era o único veículo de comunicação nas sociedades. O
rumor é uma prática que pode existir em qualquer grupo ou classe social. Basta
lembrar da brincadeira do telefone sem fio, na qual uma mensagem passa de boca
em boca.
O estudioso francês Kapferer define boato como “uma
proposição ligada aos acontecimentos diários, destinada a ser aumentada,
transmitida de pessoa a pessoa, habitualmente através da técnica do ouvir
dizer, sem que existam testemunhos concretos capazes de indicar exatidão”.
Mas por que tantas pessoas acreditam em boatos, mesmo
aqueles de teor absurdo? Os psicólogos norte-americanos Allport e Postman
afirmam que qualquer necessidade pode dar movimento a um rumor. O desejo
obstinado de se acreditar nele, nossos medos, esperanças, curiosidades,
inseguranças, tensões, ideologias, crenças e preconceitos.
Outro fator é a confiança na pessoa ou veículo que
transmitiu o fato. Grande parte das notícias nas redes sociais são
compartilhadas por amigos e conhecidos nos quais os usuários têm confiança, o
que aumenta a veracidade de uma história.
Para um boato existir, ele precisa ser propagado.
Segundo Kapferer, se não houve uma ambiguidade ou se a importância ou
relevância de um fato for nula para o público-alvo, não haverá a multiplicação
da notícia.
Com a evolução da tecnologia que permite o acesso à
internet, mais pessoas puderam se conectar à rede. Os boatos digitais ganharam
os apelidos de “hoax”. São histórias falsas que circulam na internet. Recebidas
por e-mail ou compartilhadas em sites de relacionamento, elas aparecem a todo
momento.
Marcas também se aproveitam da dinâmica das redes
sociais para “fabricar” notícias com potencial de viralidade. É o caso da
notícia do enterro de um carro pelo milionário Chiquinho Scarpa. Em 2013, ele
havia chamado a imprensa para cobrir o enterro de seu carro de luxo no jardim
de sua mansão. Mas, depois de toda a controvérsia que levantou, Chiquinho
revelou que tudo tinha um motivo bem mais nobre: o lançamento de uma campanha
de doação de órgãos. Alguns veículos fizeram a cobertura ao vivo e caíram na
pegadinha.
A divulgação de histórias falsas pode ter
consequências reais, como causar prejuízos financeiros, constrangimentos,
injúria e difamação de pessoas, empresas e organizações. Em casos extremos,
pode originar ações violentas. Em 2014, uma mulher foi espancada até a morte na
cidade de Guarujá (SP), depois de ser acusada, em boatos em redes sociais, de
que sequestrava crianças. No entanto, ela era inocente.
O
jornalismo e a checagem de informações
A tradicional produção de notícias por empresas
jornalísticas consistia em produzir e disseminar uma informação, a partir de
uma equipe de profissionais e um acesso restrito a fontes. O emissor emitia a
mensagem para o receptor, em um processo praticamente sem mediações. A imprensa
exercia o papel de ser o porta-voz do mundo real.
Em nosso tempo, todos nós podemos produzir e receber
informação. Com a internet, o cidadão pode criar a informação e a colocar em
tempo real em relatos, vídeos e fotos. Se por um lado essa possibilidade
democratiza a comunicação, por outro, facilita a divulgação de conteúdo feito
sem responsabilidade.
O jornalista trabalha com a credibilidade dos fatos. O
compromisso com a verdade e a apuração precisa são fundamentais para o
jornalismo e permitem que um veículo seja uma fonte de informação confiável e
de credibilidade.
Um dos processos necessários à prática jornalística é
a apuração, a etapa de checagem de informações. O jornalista deve checar os
dados para ver se um fato é real ou não. Para isso, ele pode realizar
entrevistas com diversas fontes, levantar informações das fontes citadas,
conferir dados, cruzar fatos e estabelecer conexões e contextos. Sem a
checagem, o que se apresenta é um conjunto de dados que podem estar incorretos,
incompletos ou que reflitam o interesse de uma pessoa e não o interesse
público.
O sociólogo T. Shibutani afirmou que “o boato é o
mercado negro das informações”. O uso das redes sociais representam um desafio
a mais nessa questão. Agora é possível produzir um boato e em pouco tempo
espalhar a notícia para milhares de pessoas.
O problema aumenta quando a pessoa só se informa pelas
redes sociais. Em junho, o Facebook alterou seu algoritmo para diminuir o
alcance de postagens de sites noticiosos e privilegiar posts de amigos e
familiares. Esse mecanismo pode ter uma consequência inusitada: aumenta a
probabilidade dos usuários receberem informações de quem pensa igual a ele --e,
portanto, corrobora seu ponto de vista.
Muitas vezes as notícias falsas vão parar em jornais
conceituados da grande imprensa como se fossem verdadeiras. Em 2014, isso
aconteceu com a história da suposta exigência do ditador norte-coreano Kim
Jong-Un, que teria imposto a todos os homens daquele país o seu corte de
cabelo. A informação repercutiu pelo mundo e foi publicada como verdadeira na
mídia online, corrompendo, deste modo, a credibilidade jornalística de
apuração.
Como separar o joio do trigo, ou seja, o que é real do
que é falso? A recomendação é que antes de compartilhar qualquer informação,
quando possível, seja verificada a sua veracidade.
Em um contexto de avalanche de informações e de rápida
disseminação, a checagem se tornou uma atividade ainda mais complicada. Como
checar tudo? A imprensa possui um papel estratégico nessa necessidade. Porém, a
busca pelo furo de reportagem ou pelo clique mais rápido são alguns dos motivos
que fazem com que muitos veículos da imprensa deixem o compromisso da checagem
de lado.
A demanda de checar um grande volume de dados fez
surgir serviços e organizações especializadas em descobrir a veracidade das informações
que circulam na sociedade. Em 2015, 64 grupos praticavam a checagem de fatos e
dados publicados pela imprensa em mais de trinta países.
Existem ainda serviços que verificam a veracidade de
dados e declarações públicas de políticos e personalidades. No Brasil, são
exemplos a Agência Lupa e os sites Aos Fatos, Detector de Mentiras e o projeto
Truco, da Agência Pública. Boatos populares da internet também são desmentidos
por sites como Boatos.org e E-farsas, que identificam fraudes e montagens.
Recentemente o Google inaugurou o serviço “Fact
Check”. A proposta é que o internauta que navegue pelo Google Notícias possa
visualizar a tag “fact check”, que garante que a informação não é falsa e que o
criador do conteúdo atendeu a determinados critérios de qualidade. No momento,
apenas usuários do Reino Unido e Estados Unidos conseguem enxergar a
sinalização sobre os fatos de cada notícia. A tendência é que esse tipo de serviço
de verificação aumente.
A
ascensão da era da pós-verdade
O termo “pós-verdade” foi eleito pela Universidade de
Oxford como a palavra do ano de 2016. O adjetivo diz respeito a circunstâncias
nas quais fatos objetivos e reais têm menos importância do que crenças
pessoais.
A palavra é cada vez mais usada na cobertura de temas
políticos. Segundo analistas, a verdade está perdendo importância no debate
político e as pessoas não estão sendo influenciadas por argumentos racionais e
pelos fatos concretos. Elas estão tomando decisões com base em suas emoções,
sentimentos e crenças, ou seja, suas visões de mundo.
Assim, um boato de algo que não aconteceu mas que
esteja alinhado à visão de mundo de uma pessoa ganha destaque com a
pré-disposição dela em acreditar naquilo. E a sua circulação massiva e sem
controle produz um efeito de verdade. O problema é que a pessoa nega o
conhecimento, pois prefere acreditar na mentira, em algo que corrobore ou que
não abale suas crenças.
São exemplos o boato divulgado de que o papa Francisco
apoiava a candidatura de Donald Trump. Outro exemplo é a saída da Grã-Bretanha
da União Europeia, apelidada de “Brexit”. Durante a campanha pelo Brexit, foram
espalhados boatos mentirosos de que a permanência no bloco custava à
Grã-Bretanha US$ 470 milhões por semana. Apesar de infundadas, denunciar as
informações falsas não foi suficiente para mudar a opinião pública. As mentiras
foram inventadas para inflar preconceitos e radicalizar posicionamentos.
Poluição:
92% da população global respira ar poluído
Pontos-chave
Um relatório da Organização Mundial da Saúde publicado
em setembro conclui que 92% da população mundial vive em locais onde a poluição
do ar excede os limites estabelecidos pela organização.
A poluição põe a saúde em risco e pode provocar
doenças e mortes precoces.
A OMS estima que cerca de 3 milhões de mortes ao ano
estejam ligadas à poluição externa do ar.
Faça uma pausa para inspirar e expirar. Não importa
onde você vive, as chances dos seus pulmões inalarem poluição são altas.
Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), nove em cada dez pessoas respiram
mal no mundo. O ar limpo está se tornando um privilégio de poucos.
Os dados são de um relatório da entidade publicado em
setembro, que alerta que 92% da população global vive atualmente em áreas onde
os níveis de qualidade do ar ultrapassam os limites mínimos de segurança
estabelecidos pela entidade.
O estudo recolheu amostras do ar em mais de três mil
localidades rurais e urbanas pelo planeta. A qualidade do ar está piorando na
maioria das cidades monitoradas e o ambiente está cada vez mais degradado.
Entre 2008 e 2013, os níveis de poluição aumentaram em 8%. Como os países continuam a se industrializar
e se urbanizar, a tendência é que esse número aumente.
Na pesquisa, foram detectadas partículas poluentes
presentes no ar como o dióxido de enxofre (SO2), monóxido de carbono (CO) e
dióxido de nitrogênio (NO2). O limite de tolerância determina se o ambiente é
considerado insalubre. A OMS recomenda que a concentração de partículas não
ultrapasse 25 ppm (partes por milhão)
A poluição do ar tem uma relação direta com a
qualidade da saúde humana e hoje é a principal causa ambiental de doenças. No
corpo, partículas poluídas podem provocar irritação nos olhos, dor de cabeça,
tontura e sonolência. Em alta concentração, podem causar doenças respiratórias,
cardíacas, derrame e diversos tipos de câncer, como o de pulmão. Reduzir a
poluição ajuda as famílias a ficarem mais saudáveis, economizarem em gastos
médicos e aumenta a produtividade no trabalho.
A OMS estima que cerca de 3 milhões de mortes ao ano
estejam ligadas à poluição externa do ar. De acordo com a organização, quase
90% delas são registradas em países de baixo desenvolvimento. As regiões mais
afetadas são a África, o Oriente Médio e a Ásia. Quase dois em cada três óbitos
foram contabilizados no sudeste asiático e em regiões ocidentais do Pacífico.
Quem lidera o ranking dos países mais contaminados é o
Turcomenistão, com 108 mortes por cada 100 mil habitantes. Depois vêm
Afeganistão, Egito, China e Índia.
No Brasil, a média foi de 14 mortes a cada 100 mil
habitantes, um nível considerado moderado. A pior cidade é Santa Gertrudes, em
São Paulo, que aparece como a 175ª cidade mais poluída do mundo. A culpa é de
um polo industrial de produção de cerâmica.
As principais fontes de poluição do ar resultam da
queima de combustíveis fósseis, ao aumento da frota de veículos motorizados nas
cidades, às atividades industriais em geral e à queima do lixo.
Nos países asiáticos, o uso de termoelétricas para
gerar energia é responsável por grande parte dos poluentes atmosféricos. Já na
África, muitas regiões são desertas e pouco povoadas. As partículas de poluição
não provêm da indústria, mas da poeira do deserto transportada pelo vento. Em
ambas as regiões também é comum a poluição provocada pelo uso de madeira,
esterco ou biomassa para aquecer o fogão. Atualmente, 17% das emissões mundiais
de CO2 são produzidas no cozimento doméstico.
As crianças constituem o grupo de maior
vulnerabilidade à poluição. Elas respiram duas vezes mais rápido do que um
adulto, e seus sistemas respiratório e imunológico são mais vulneráveis. A
Unicef estima que 1 em cada 6 mortes de crianças com menos de cinco anos em
2015 deveu-se à pneumonia, uma doença em que metade dos casos ocorrem por
poluição ambiental.
O país mais poluente do mundo é a China. O uso de
carvão como principal fonte de energia, o amplo parque industrial e o número
crescente de veículos faz com que parte do país esteja permanentemente
encoberto por uma névoa opaca de poluentes. Em alguns lugares, a concentração
de partículas de poluição chega a ser centenas de vezes mais densa que o
recomendado pela OMS. É comum os chineses saírem na rua com máscaras cirúrgicas
para se protegerem da poluição ambiental.
Em 2014, a Academia de Ciências Sociais de Xangai
publicou um relatório dizendo que a poluição severa de Pequim estava tornando a
cidade inabitável para humanos. Num dia poluído em Pequim, a concentração de
partículas finas atinge 300 microgramas por metro cúbico. O nível máximo
recomendado é 25 por dia.
Na Índia, as termoelétricas são as principais
responsáveis por grande parte dos poluentes atmosféricos. A cidade de Nova Déli
já apresenta 900 microgramas de partículas poluentes por metro cúbico. Nas
zonas rurais do país, o que preocupa é a poluição interna, aquela produzida
dentro das casas. Ela é provocada pela queima de combustíveis ao cozinhar – 81%
das casas rurais do país usam biomassa para aquecer os alimentos.
A poluição atmosférica causa danos ao meio ambiente e
provoca chuva ácida (contaminando rios e lagos) e o efeito estufa. A deposição
dos poluentes atmosféricos nas plantas pode levar à redução da sua capacidade
de fotossíntese, provocando, por exemplo, queda da produtividade agrícola (e da
produção de alimentos) e o desequilíbrio de ecossistemas.
Nas cidades europeias, a principal causa de poluentes
é o gás que sai dos escapamentos dos carros. Na Europa, a OMS calcula que as
emissões geradas pelos automóveis são responsáveis por 75 mil mortes prematuras
todos os anos.
O Brasil também possui zonas de alta concentração de
poluentes. Na cidade de São Paulo (SP), 5 mil mortes seriam evitadas anualmente
se a recomendação da OMS fosse atingida. E mais: um paulistano que tem hoje 30
anos poderia ter a sua expectativa de vida ampliada em quase 16 meses se a
poluição do ar da cidade estivesse em um limite seguro.
Como
solucionar?
Diminuir a poluição atmosférica de uma cidade envolve
uma série complexa de iniciativas: um bom planejamento urbano, um sistema
eficiente de mobilidade (o que reduz o número de veículos em circulação), o uso
adequado do solo e a redução da utilização de carvão e madeira para energia.
Na Índia, já existem fogões movidos a energia solar.
Na Espanha, diversas cidades estão limitando a circulação de carros e
investindo em transporte público. Na China, o governo anunciou uma série de
medidas para tentar recuperar a qualidade do ar das principais cidades. O
investimento em tecnologias limpas, como a energia solar, está ficando cada vez
mais comum.
Em 2015, o Acordo de Paris sobre o clima conseguiu a
adesão de 195 países para o compromisso de adotar medidas que reduzam as
emissões de gases de efeito estufa, causadores do aumento da temperatura
global. O pacto faz com que novas medidas sustentáveis sejam implementadas.
Uma das soluções mais simples e eficientes para combater
a poluição urbana é o plantio de árvores. Elas filtram o ar sujo e podem
remover até um quarto do material particulado no raio de algumas centenas de
metros.
Além disso, elas também esfriam o clima. Uma árvore
pode diminuir a temperatura à sua volta em até 2º C, o que reduz as ilhas e
ondas de calor e os efeitos do aquecimento global. A Organização das Nações
Unidas (ONU) recomenda que uma cidade tenha pelo menos 12 metros quadrados de
área verde por habitante.
Um recente estudo da organização The Nature
Conservancy (TNC) revela que um investimento global de US$ 100 milhões ao ano
em plantio de árvores pode oferecer cidades mais frescas a 77 milhões de
pessoas, além de decréscimos mensuráveis da poluição a 68 milhões de
habitantes.
Brasil
vive epidemia de sífilis: falta de uso da camisinha é a principal causa
Pontos-chave
O número de casos de sífilis (doença sexualmente
transmissível provocada por uma bactéria) vem aumentando no Brasil. Este ano, o
Ministério da Saúde divulgou que o país vive uma nova epidemia de sífilis.
Segundo especialistas, a atual epidemia tem causas
multifatoriais, como a falta de medicamentos, a baixa qualidade dos exames
pré-natal e a falta de uso de preservativos nas relações sexuais.
A maior preocupação é com a transmissão de mulheres
grávidas para os fetos. A doença pode provocar aborto e más-formações no bebê.
A principal forma de transmissão da sífilis é pelo
contato sexual e por isso o uso da camisinha é a melhor arma de prevenção. Nos
últimos anos, pesquisas revelam que o uso de preservativos tem diminuído no
Brasil, principalmente entre a população jovem.
O Brasil vive uma nova epidemia de sífilis, uma doença
sexualmente transmissível (DST). O Ministério da Saúde divulgou dados recentes
mostrando que o número de pessoas infectadas no Brasil aumentou 32,7% entre
2014 e 2015, chegando a 65.878 casos no ano passado. O aumento é considerado
expressivo em todas as faixas etárias.
As gestantes constituem um dos grupos de maior risco.
Os casos de sífilis congênita (transmissão da mãe grávida com sífilis para o
bebê) cresceram de forma espantosa. A taxa de bebês com sífilis congênita em
2015 foi de 6,5 casos a cada mil nascidos vivos - 13 vezes mais do que é
tolerado pela Organização Mundial de Saúde e 170% a mais do que o registrado em
2010.
A bactéria da sífilis é capaz de atravessar a barreira
placentária e infeccionar o feto durante a gestação ou na hora do parto. As
consequências podem ser graves para o bebê e ocasionar problemas físicos,
mentais e até a morte.
Segundo especialistas, a atual epidemia tem causas
multifatoriais como a falta de medicamentos, a baixa qualidade dos exames
pré-natal e principalmente a falta de uso de preservativos em relações sexuais.
A sífilis é uma doença muito antiga e ficou conhecida
no século 14, na Europa. O termo sífilis originou-se de um poema, com 1.300
versos, escrito em 1530 pelo médico e poeta Girolamo Fracastoro em seu livro
intitulado Syphilis Sive Morbus Gallicus (“A sífilis ou mal gálico”). Ele narra
a história de Syphilus, um pastor que amaldiçoou o deus Apolo e foi punido com
o que seria a doença sífilis.
Durante a Idade Média, a doença era considerada muito
perigosa e fez milhares de vítimas. O impacto foi tamanho que a infecção foi
considerada pela Igreja como um castigo dos céus. Ao longo da história a
sífilis foi a causa da morte de muitas personalidades, como o poeta Charles
Baudelaire (1821-1867), o escritor Oscar Wilde (1854-1900) e o gângster Al
Capone (1899 - 1947).
Foi apenas no final do século 19, com as pesquisas de
Louis Pasteur, que a ciência constatou que a sífilis estava relacionada à ação
de microorganismos presentes no corpo. Mais tarde, o médico Alexander Fleming
(1928) descobriu a penicilina, substância que inibia o crescimento de certas
substâncias. Ela foi o primeiro antibiótico usado com sucesso no tratamento de
infecções causadas por bactérias e contribuiu para diminuir a incidência da
doença nas décadas seguintes.
Também chamada de cancro duro, a sífilis é causada
pelo contágio com a bactéria Treponema palidum, que pode ser transmitida
facilmente por meio do contato com feridas ou lesões de pessoas infectadas,
através de transfusões sanguíneas e durante a gravidez ou parto, da mãe para o
filho.
A infecção causa o aparecimento de uma ferida nos
órgãos sexuais. Ela se caracteriza por ter bordas elevadas e avermelhadas.
Esses sintomas podem desaparecer no estágio mais avançado da doença. Depois de
semanas ou meses, podem aparecer manchas no corpo, especialmente nos pés e
mãos. Se não tratada, a sífilis pode provocar paralisia, cegueira, problemas
cerebrais, respiratórios e cardíacos. Ela ainda pode facilitar a transmissão de
HIV, o vírus da AIDS.
O tratamento é relativamente simples, feito por
antibióticos. A pessoa e seu parceiro devem ser tratados. O Sistema Único de Saúde
(SUS) dispõe de um teste rápido, capaz de diagnosticar a doença em até 30
minutos.
A principal forma de transmissão da sífilis é pelo
contato sexual e por isso o uso da camisinha é a melhor arma de prevenção. Em
outubro deste ano, o Ministério da Saúde iniciou novas campanhas publicitárias
para alertar a população dos perigos da doença e orientar quanto à prática do
sexo seguro
Pesquisas revelam que o uso de preservativos tem
diminuído no Brasil nos últimos anos. De acordo com dados do Ministério da Saúde
divulgados em 2015, 45% da população sexualmente ativa do país não havia usado
preservativo nas relações sexuais nos últimos 12 meses. Os dois motivos
alegados pela maioria das pessoas é que a camisinha 'reduz o prazer' e que
existe confiança no parceiro. Como resultado, o número de casos de DSTs voltou
a crescer.
O uso do preservativo começou a se intensificar após a
descoberta do vírus HIV, na década de 1980. Neste período o HIV era considerado
fatal. Com o aumento da prevenção, a sífilis se tornou uma doença cada vez mais
incomum no Brasil e no mundo. A partir dos anos 2000, novos tratamentos para a
AIDS começaram a surgir e a população passou a se preocupar menos com o uso de
preservativos. A partir dos últimos cinco anos, o número de casos voltou a
subir. Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia, os brasileiros de 13
a 15 anos são os que menos se protegem na hora da relação sexual.
A diminuição do uso do preservativo não acontece
apenas no Brasil. Ela é uma tendência global e está causando o reaparecimento
de antigas DSTs nos Estados Unidos e na Europa.
Além da mudança comportamental da população, outro
fator que contribuiu para a atual epidemia de sífilis é o desabastecimento da
penicilina benzatina do mercado. Esse antibiótico é essencial para o tratamento
de sífilis e está em falta em muitos postos de saúde e hospitais públicos. Em
janeiro, um levantamento feito pelo Ministério da Saúde apontou que 60,7% dos
estados brasileiros relatavam desabastecimento de penicilina. Essa situação dificulta
o tratamento de infectados. Também faltam recursos para o diagnóstico da
doença, feito por exames laboratoriais.
Há ainda mais um fator para preocupação. A Organização
Mundial da Saúde (OMS) alerta que três das DSTs mais comuns estão ficando
intratáveis: sífilis, clamídia e gonorreia. O problema é o uso inadequado e
exagerado de medicamentos. As bactérias responsáveis por essas doenças estão se
tornando cada vez mais resistentes aos antibióticos utilizados no tratamento. A
OMS recomenda uma mudança nos tratamentos para essas doenças, como o uso do
antibiótico certo para cada caso e em doses mais controladas do que se tem
usado até agora.
Biologia:
Estudos sobre autofagia das células abrem fronteiras para a medicina
Pontos-chave
O vencedor do prêmio Nobel de Medicina de 2016 foi o
biólogo japonês Yoshinori Ohsumi. Ele fez pesquisas fundamentais para decifrar
os mecanismos da autofagia.
Autofagia é o processo pelo qual a célula consegue
digerir seu próprio conteúdo. Pesquisadores concluíram que a autofagia não
induz à morte e seria um mecanismo de sobrevivência das células. Sua função é
digerir os componentes celulares danificados, como se fosse uma usina de
reciclagem.
A autofagia é acionada por estímulos externos. A
célula começa a produzir proteínas que se ligam umas às outras até formar
membranas chamadas de autofagossomos. A membrana envolve os componentes
celulares a serem eliminados.
A autofagia tem um papel duplo: ajuda a sobreviver e a
eliminar células de todo tipo, saudáveis ou tumorais. Estudos sobre esse
mecanismo são cruciais para entender como prolongar a vida das células sadias e
reduzir a das tumorais.
Você sabia que as nossas células possuem a capacidade
de autodigestão e que isso acontece o tempo todo? Esse foi o tema de pesquisas
do vencedor do prêmio Nobel de Medicina de 2016, o biólogo japonês Yoshinori
Ohsumi, professor do Instituto Tecnológico de Tóquio. Ele foi laureado por suas
contribuições para a pesquisa sobre os mecanismos da autofagia - processo biológico
em que as células digerem a si mesmas e se renovam, eliminando e reaproveitando
proteínas. "Hoje ainda temos mais questões sobre a autofagia para
esclarecer do que quando comecei", declarou o cientista à imprensa.
A palavra autofagia vem do grego e significa “comer a
si mesmo”. O processo foi detectado pela primeira vez na década de 1960. Na
época, pesquisadores observaram que as células do corpo são capazes de destruir
determinados componentes internos por meio da produção de algumas proteínas. Mas
até o início dos anos 1990, quase nada se sabia sobre esse processo, que ainda
era visto como de pouca importância.
A partir de 1988, Yoshinori Ohsumi começou a estudar
as células de leveduras, organismos unicelulares usados na fabricação de pão,
vinho e cerveja. O biólogo identificou a autofagia nesses organismos e mostrou
que o mesmo sistema funcionava no corpo humano. Ele ainda descobriu 15 genes
responsáveis pelo processo de autodestruição seletiva de componentes das
células, o que levou a pesquisa sobre o tema para um novo patamar.
A partir dos genes, os especialistas conheceram quais
são e como interagem as proteínas que levam adiante esse mecanismo de limpeza
celular. Os resultados desses estudos mostraram que a autofagia é controlada
pela produção em cascata de proteínas e complexos proteicos, cada um deles
responsável pela regulação de um estágio específico.
Em um modelo simples, a autofagia é acionada por
estímulos internos ou externos: mudanças ambientais, substâncias químicas,
causas patológicas (vírus, radiação), um defeito celular ou condições adversas,
como a privação de alimentos.
Sob estímulo, as células entram em autofagia e começam
a produzir proteínas que se ligam umas às outras até formar membranas chamadas
autofagossomos. Essas membranas envolvem os componentes celulares a serem
eliminados antes de causarem problemas. Em seguida, esse conteúdo é digerido
por enzimas produzidas pelo lisossomo, organela que atuaria como um
“compartimento de reciclagem”. Ao participar da linha de desmontagem celular,
essas estruturas levam adiante a transformação de resíduos em matéria- prima
para moléculas novas.
Mas por que existe esse mecanismo biológico?
Inicialmente, os pesquisadores achavam que o ele seria apenas um tipo de morte
celular, semelhante ao mecanismo da apoptose (a morte celular geneticamente
programada). Com as descobertas, concluíram que a autofagia não induz à morte,
mas à sobrevivência e resistência das células, o que passou a ser considerado
como um artifício bastante sofisticado dos organismos.
Agora se sabe que a autofagia é essencial para o
funcionamento adequado das células. Trata-se de uma função na qual podem
destruir toxinas e organismos invasores e prevenir o surgimento de muitas
doenças.
A função também é acionada em situações de escassez,
como a fome, na qual a célula pode reaproveitar o máximo de nutrientes
possíveis, o que regula o metabolismo do corpo e aumenta as chances de
sobrevivência.
Como pode ser acelerada ou retardada, a autofagia
tornou-se uma estratégia nova para combater doenças e prolongar a vida das
células sadias. No campo da medicina, a autofagia abriu perspectivas de novas
aplicações para medicamentos, principalmente nos estudos sobre o câncer.
A possibilidade de regular a autofagia a partir de estímulos
muito bem definidos é promissora. Cientistas poderão aumentar a eficiência de
substâncias químicas que atuam como remédios, no combate a diversos tipos de
tumores e doenças.
Um composto químico, por exemplo, pode estimular a
produção de proteínas e acionar os processos que levam à morte da célula de um
tumor. Em um estudo publicado em 2008 na revista PNAS, pesquisadores italianos
mostraram que o lítio poderia acionar a autofagia e adiar a progressão da
esclerose lateral amiotrófica, uma doença neurodegenerativa.
Um estudo da Universidade de Cambridge também revelou
que o uso do lítio combinado com o composto rapamicina combate a doença de
Huntington, responsável pela perda contínua da funcionalidade dos neurônios. Os
resultados sugerem que a autofagia remove proteínas malformadas que atrapalham
o funcionamento de células nervosas.
No entanto, a autofagia tem um papel duplo: é capaz de
eliminar as células normais e também as tumorais. A falha no processo, a
degradação excessiva ou as mutações dos genes da autofagia, podem fazer com que
a célula não consiga se livrar de partes defeituosas ou elimine partes
saudáveis.
A lesão tecidual que resulta da autofagia defeituosa
causa inflamação, infecções e favorece o aparecimento de um tumor. Em casos de
desequilíbrios no processo, medicamentos também podem fazer o inverso: bloquear
ou inibir a autofagia e abrir caminho para a ação de remédios antitumorais,
evitando a lesão de células normais. O desafio é encontrar não apenas o remédio
certo, mas a dosagem certa.
Entender o processo de autofagia e como ele pode ser
acelerado ou retardado pode contribuir para novas pesquisas e tratamentos de
doenças degenerativas, como o Parkinson, o Alzheimer e a diabetes.
Brasil
avalia regulamentar a atividade de lobistas: mas o que é e para que serve o
lobby?
Pontos-chave
O lobby é a pressão que um grupo organizado ou uma
pessoa (lobistas, profissionais remunerados ou voluntários) exerce sobre
políticos e o poder público com o objetivo de influenciar as decisões políticas
em seu favor. Ele seria um instrumento democrático de representação de
interesses.
O Ministério da Transparência busca regulamentar a
profissão do lobista. As propostas de regulamentação do lobby no Brasil têm
como objetivos dar transparência à defesa de interesses diante do poder público
e equilibrar o jogo de interesses em torno dos processos decisórios.
Lobby e lobista são duas palavras que você já deve ter
visto mais de uma vez no noticiário político, especialmente com as operações
Lava Jato e Zelotes da Polícia Federal. Embora tenha uma conotação negativa no
Brasil, por ser muito associada à corrupção, praticar lobby não é ilegal.
Agora, o Ministério da Transparência está tentando
regulamentar a atividade no Brasil, o que pode encerrar um debate de décadas no
Congresso Nacional. Mas você sabe o que faz um lobista? Que interesses ele
defende e qual seu papel no cenário político e econômico?
A palavra “lobby” veio da língua inglesa, na qual
significa o salão de entrada de edifícios. Ela começou a ser usada para se
designar a atuação de representantes de interesses (os “lobistas”) que
esperavam a passagem de tomadores de decisões políticas pelo salão de entrada
dos edifícios onde eles se hospedavam ou trabalhavam para apresentar seus
pleitos.
O lobby é a pressão que um grupo organizado ou uma
pessoa (lobistas, profissionais remunerados ou voluntários) exerce sobre
políticos e o poder público com o objetivo de influenciar as decisões políticas
em seu favor. Ele seria um Instrumento democrático de representação de
interesses.
O lobby lícito pode trazer contribuições positivas
para os tomadores de decisão, ao trazer dados, análises, argumentos e
informações novas, ajudando-os a ter uma visão mais completa do impacto de uma
medida. Ou ainda, ajudar a fomentar o debate e a opinião pública e facilitar o
acesso de segmentos sociais a instâncias decisórias. Por exemplo: um grupo da
sociedade civil pode levar um abaixo-assinado nos gabinetes dos deputados para
apresentar argumentos sobre um determinado tema ou conseguir marcar uma
audiência pública para discutir a questão.
Em casos negativos, o lobby pode dar margem ao chamado
“tráfico de influência”, onde o decisor acaba tomando uma atitude em troca de
vantagem econômica ou concessão de privilégios a interesses determinados. A
forte influência de empresários e empresas na atuação dos parlamentares pode
ser uma porta de entrada para a corrupção. Por exemplo, uma empresa oferece
dinheiro a um deputado através de um lobista para que ele apresente uma emenda
que vai favorecer seu negócio o setor. Isso não é lícito e coloca o interesse
privado acima do interesse público.
No caso do contraventor Carlinhos Cachoeira, as
gravações da Polícia Federal somadas a uma rápida análise da prestação de
contas eleitorais dos políticos envolvidos mostra que a quadrilha financiou a
campanha da maioria deles. Empresários ligados ao bicheiro fizeram grandes doações
às campanhas do senador Demóstenes Torres (DEM-GO) e dos governadores Marconi
Perillo (PSDB-GO) e Siqueira Campos (PSDB-TO). Demóstenes, por exemplo, foi
flagrado num grampo dizendo que defenderia um projeto para legalizar os jogos
de azar no país, se Cachoeira quisesse. Ele também aconselhava o contraventor
sobre quais projetos poderiam prejudicá-lo.
O lobby por vias legais também pode refletir
desequilíbrios, como o favorecimento de interesses especiais. Por exemplo,
quando um setor econômico pressiona o governo para ter benefícios tributários
especiais, enquanto outros segmentos pagam tributos mais elevados.
Como funciona aqui e o que pode mudar?
No Brasil, a profissão de lobista possui um forte
estigma negativo, alimentado pela visão de atividades ilícitas. Hoje, segundo a
Abrig (Associação Brasileira de Relações Institucionais e Governamentais),
entidade representativa dos lobistas, há mais de 2.000 profissionais do setor
no país, atuando em escritórios de advocacia, consultorias, assessorias de comunicação
ou dentro das próprias empresas interessadas. Mas a falta de regras que
especifiquem o que pode e não pode ser feito abriu espaço para a corrupção.
Este é um dos argumentos utilizados para regulamentar a atividade no país.
A ideia do Ministério da Transparência é que os
lobistas passem a ser identificados e credenciados para atuar em prol de
empresas e entidades no governo brasileiro com mais transparência. Para isso,
seria instituído um cadastro ou registro público dos lobistas que circulam pelos
órgãos do governo, indicando para qual empresa ou entidade cada um atua, e
quais interesses ou objetivos representam.
O ministro da Transparência, Torquato Jardim, defendeu
a regulamentação da atividade no Brasil em uma audiência pública da CCJ
(Comissão de Constituição e Justiça) na Câmara dos Deputados, no início de
outubro. Na sessão, o ministro apresentou o relatório do Grupo de Trabalho
criado para propor mudanças à regulamentação do lobby.
O grupo definiu três pontos que devem ser considerados
para a atividade: 1) que ela aconteça de forma organizada (por canais
institucionais estabelecidos, com representantes identificados e procedimentos
transparentes; 2) que seja feita por grupos de interesse definidos e legítimos;
3) que a atividade seja exercida dentro da lei e da ética, com regras para
recebimento de presentes ou qualquer tipo de benefícios por agentes públicos.
Outra proposta é alterar a palavra lobby para “relações governamentais” ou
“representação social”.
Outros pontos já são consenso entre quem defende a
regulamentação. Por exemplo, a obrigatoriedade de disponibilizar na internet as
agendas das reuniões entre os agentes públicos e privados, assim como o
cumprimento de uma quarentena pelos funcionários públicos que desejarem
trabalhar como lobistas.
No Congresso, três PECs (Proposta de Emenda à
Constituição) sobre a regulamentação da atividade estão tramitando. Elas
estabelecem prerrogativas aos lobistas, como a possibilidade de debater temas
nas comissões do Legislativo e apresentar emendas a projetos, além de prever
restrições e a responsabilização desses profissionais por ato de improbidade
administrativa.
Outros países
Os Estados Unidos são o país onde o lobby é legalizado
há mais tempo, o que ocorreu por uma lei de 1995 que determina em quais
situações as empresas ou organizações (norte-americanas ou estrangeiras) devem
registrar na Câmara e no Senado quem fará lobby sobre o Congresso e o governo.
Sendo assim, os interessados no lobby devem registrar
em um formulário os temas sobre os quais têm interesse, quem serão os lobistas,
quanto pretendem gastar com a causa e quais setores do governo pressionará. Com
mais de 11.000 lobistas registrados, estima-se que nos EUA o lobby movimente
US$ 3,2 bilhões por ano. Ainda pela lei, os políticos não podem receber nenhum
presente ou “agrado” com valor superior a 250 dólares por ano.
Mas há modelos diferentes de praticar a atividade. No
Parlamento Europeu e na Comissão Europeia, desde 2011 os lobistas podem se
registrar voluntariamente. Já na Austrália, por lei, o cadastro é obrigatório.
No Canadá, a exigência só se aplica aos lobistas remunerados. No Reino Unido,
algumas associações de classe divulgam as listas de profissionais que atuam em
seu nome nos bastidores da política.
A regulamentação do lobby pode funcionar como uma
forma de combater a corrupção e o clientelismo político-partidário no país, bem
como aumentar a igualdade de acesso às instituições decisórias aos membros da
sociedade, reforçando a democracia participativa. No entanto, serão necessárias
regras efetivas para que, mesmo regulamentada, a atividade não beneficie apenas
quem tiver melhores condições econômicas.
Racismo
nos EUA: mortes de negros por policiais acirram tensão racial
Pontos-chave
As recentes mortes de negros pela violência policial
reacenderam as tensões raciais nos Estados Unidos.
No país, estatísticas mostram que pessoas negras têm
maior probabilidade de serem mortas pela polícia do que brancos.
O movimento civil Black Lives Matter contribuiu para
dar visibilidade ao problema.
O racismo é um problema histórico dos Estados Unidos.
No início do século 20, negros e brancos viviam em uma sociedade completamente
segregada. A situação era mais grave nos estados do sul.
Nas décadas de 1950 e 1960 o Movimento pelos Direitos
Civis lutou pela igualdade e pelos direitos da população negra.
Em setembro de 2016, a morte de dois homens negros
desarmados nos estados de Oklahoma e na Carolina do Norte causaram comoção e
revoltas nos Estados Unidos. Na cidade de Charlotte (Carolina do Norte), depois
de três noites de protestos barulhentos nas ruas, foi instaurado o toque de
recolher e declarado o estado de emergência.
Esses são os exemplos mais recentes de uma sucessão de
casos no ano que mantém acesa a polêmica sobre a existência de racismo
institucional entre as forças de segurança dos Estados Unidos. A questão está
cada vez mais em debate no país. A abordagem policial é diferente por causa da
cor da pele de uma pessoa?
Casos como esses inspiraram a criação do movimento civil
Black Lives Matter (Vidas Negras Importam, em português), que combate a
violência policial contra os negros e luta pelos direitos humanos da comunidade
negra. Criado em 2013, o movimento ganhou repercussão em todos os EUA.
Segundo os ativistas, o racismo ainda é um drama
cotidiano e os abusos de autoridade no país em relação aos cidadãos negros são
frequentes. Exemplos são muitos, como o uso excessivo da força, casos em que
homens negros são detidos ilegalmente pela polícia por terem um farol do carro
quebrado, ou crianças negras que são abordadas por brincarem com armas de
brinquedo.
O Black Lives Matter obteve grande visibilidade no
noticiário internacional e nas redes sociais, que popularizaram o slogan do
movimento. Na internet, é comum o uso da hashtag #BlackLivesMatter quando surge
um novo caso de morte de negros por policiais e que foi considerado injusto.
Manifestações nas ruas e o apoio de artistas como
Beyoncé, Jay-Z, Kanye West e Drake também foram fundamentais para a
visibilidade da causa. No início deste ano, a cantora Beyoncé publicou uma
carta aberta no seu site oficial criticando a polícia: “Estamos fartos e
cansados dos assassinatos de homens e mulheres jovens em nossas comunidades.
Depende da gente tomar posição e exigir que eles parem de nos matar. Nós não
precisamos de compaixão. Precisamos que todos respeitem nossas vidas”.
O primeiro grande protesto do movimento BLM aconteceu
em 2014, após a morte do jovem Michael Brown, na cidade de Ferguson, no estado
do Missouri. Ele estava desarmado quando foi alvejado pela polícia. O episódio
deu origem a protestos em todo o país e abriu um debate público que expôs o
racismo que continua a existir na sociedade norte-americana.
As estatísticas fundamentam a disparidade no uso da
força policial nos Estados Unidos e revelam que pessoas negras têm maior
probabilidade de serem mortas pela polícia do que brancos. Segundo dados do
FBI, em 2015, 37% das pessoas desarmadas mortas pela polícia americana eram
negras, embora os afro-americanos representem aproximadamente 13% da população.
Já o estudo Mapping Police Violence aponta que negros
têm até três vezes mais chances de serem mortos por policiais do que brancos.
Em casos de mortes em que a vítima não estava armada, essa possibilidade é de
até cinco vezes maior.
Nesse debate, o presidente Barack Obama assumiu um
importante papel. Em 2008, Obama foi eleito o primeiro presidente negro dos
Estados Unidos. O fato de um homem negro assumir a presidência foi considerado
por muitos como o início de uma nova era nas relações raciais. Mas as
desigualdades persistem. Os negros também formam a maior parte da população em
situação de pobreza (24%) e têm uma escolaridade menor do que brancos.
Apesar de Obama representar um importante símbolo, o
racismo ainda é uma ferida aberta nos EUA. A organização The Southern Poverty
Law Center, uma das mais importantes do país especializada em direitos civis,
fez um levantamento no qual mapeou a existência de 892 “grupos de ódio” no país
em 2015. Destes, 190 são ligados à Ku Klux Klan, organização racista que hoje
se define como um movimento político.
Segundo a organização, houve um aumento no número de
grupos racistas desde a virada do último século. Ao contrário do Brasil, nos
EUA não é crime divulgar conteúdo racista. Os motivos desse aumento seriam o
intenso fluxo de imigrantes (especialmente de latino-americanos) e as projeções
demográficas que mostram que os Estados Unidos estão passando por uma transformação
social e se tornando um país cada vez mais multirracial. A estimativa é de que,
em 2040, os brancos não serão a maioria da população norte-americana.
Uma história de luta por direitos
A segregação racial marcou a história dos Estados
Unidos e se tornou um assunto fundamental para entender a formação desta nação.
O território norte-americano foi colonizado principalmente pelos ingleses, que
instauraram o regime de escravidão na colônia, com o trabalho escravo de
africanos. Com a Declaração da Independência (1776), os americanos criaram o
primeiro Estado democrático sob os ideais da liberdade e da igualdade. Apesar
disso, a abolição só aconteceu no século 19, como um dos desdobramentos da
Guerra de Secessão (1861 – 1865).
Na sangrenta Guerra de Secessão, a questão racial foi
um dos fatores centrais. Os estados americanos do norte tentaram abolir a
escravidão nos estados do sul - cujo sistema de plantation era dependente da
mão de obra negra e escrava. Contrariados, os sulistas resolveram se separar do
resto do país e formaram a Confederação Americana, que foi derrotada.
Após a abolição, os negros continuaram a ser
considerados inferiores e colocados em uma posição subordinada. Também eram
proibidos casamentos inter-raciais e as lideranças políticas faziam de tudo
para impedir a população negra de ter acesso ao voto e a cargos de liderança.
No final do século 19, uma organização chamada Ku Klux
Khan ganhou milhares de adeptos e o apoio da aristocracia sulista. A
organização pregava a supremacia branca e agia com violência para perseguir
famílias negras. Praticavam crimes de ódio que espalharam medo pelos estados do
sul, como o linchamento, a tortura, assassinatos e incêndios. Os enforcamentos
de negros no sul viraram tema da canção "Strange Fruit" (Fruta
estranha), imortalizada pela cantora de jazz Billie Holiday (1915-1959).
Em 1869, um júri federal classificou a Ku Klux Khan
como uma organização terrorista. Foi então aprovada uma lei, conhecida como
Civil Rights Act, na qual crimes raciais passaram a ser julgados em âmbito
federal. Apesar disso, a partir de 1876, os estados do sul começam a aprovar
leis estaduais que buscavam impor a segregação racial em ambientes públicos.
Na prática, no início do século 20, negros e brancos
viviam em uma sociedade completamente segregada. A situação era mais grave nos
estados do sul, onde negros e brancos eram proibidos de estudar nas mesmas
escolas, frequentar as mesmas igrejas e compartilhar bebedouros ou espaços em
trens e ônibus. Por exemplo, um negro só podia se sentar num ônibus se todos os
brancos estivessem sentados.
A partir da década de 1950 começa o Movimento pelos
Direitos Civis, que lutou pela igualdade de direitos da população negra. Em
1954, a Suprema Corte dos Estados Unidos declarou inconstitucional a segregação
racial nas escolas públicas. No ano seguinte, a costureira Rosa Parks se negou
a ceder seu lugar no ônibus a um homem branco em Montgomery, no Alabama.
Seu protesto desencadeou um movimento de boicote de
mais de um ano ao transporte coletivo na cidade, no qual se destacou o pastor
batista Martin Luther King. O protesto culminou com uma resolução da Justiça
que tornou ilegal os ônibus segregados na cidade. O movimento pelos direitos
civis da população negra ganhava as ruas, também apoiado por militantes vindos
dos estados do Norte.
Em 1963, cerca de 250 mil pessoas marcharam em
Washington pelo fim da segregação racial, no evento que ficou conhecido como a
Marcha de Washington. O ponto alto foi o discurso do reverendo Martin Luther
King, considerado como um dos episódios mais marcantes da luta contra o
preconceito.
“Eu tenho um sonho que minhas quatro pequenas crianças
vão um dia viver em uma nação onde elas não serão julgadas pela cor da pele,
mas pelo conteúdo de seu caráter”. No ano seguinte, foi promulgada a Lei dos
Direitos Civis, que proibiu a discriminação racial nos EUA.
Tecnologia:
moeda virtual é o dinheiro do futuro?
Pontos-chave
No século 21, novas tecnologias prometem acabar com o
dinheiro físico. A tendência é que, nos próximos anos, a sociedade caminhe para
um mundo em que não haverá circulação de dinheiro físico e que sejam usadas
cada vez mais transações eletrônicas e moedas virtuais.
O Bitcoin é uma moeda virtual que ganha cada vez mais
popularidade. Em vez de existir uma instituição financeira responsável pelas
transações, todas as trocas monetárias ficam no livro de registro virtual
Blockchain.
Por representar riscos ao controle de fluxos
financeiros, países estão tentando criar barreiras para a circulação desse tipo
de moeda.
O dinheiro é um símbolo e meio de troca. E também
resultado de uma longa evolução. Ao longo da história, a humanidade já usou
todo tipo de objetos como moeda: búzios na Arábia, sementes nas Ilhas Salomão,
conchas na Suméria.
Na Roma Antiga, o pagamento dos soldados era feito com
uma porção de sal. Daí surge a palavra “salário”. No Ocidente, antes de
aparecer a cédula impressa, as moedas usadas eram geralmente o ouro, a prata e
o cobre.
No início do século 20, os governos nacionalizaram a
própria moeda, e o Banco Central de cada país tomaria o papel de criar,
implantar e assegurar o suprimento e o destino do dinheiro. Depois que as
cédulas são impressas, o dinheiro é repassado pelo governo aos bancos, que o
distribui para pessoas e empresas.
Com o surgimento da computação foram inventadas as
moedas virtuais, uma forma de dinheiro que não existe fisicamente, ou seja, não
é impressa em papel. Cartões de crédito e meios de pagamento online como PayPal
e aplicativos para celular são considerados dinheiro virtual, mas que utilizam
moedas tradicionais para realizar as transações de pagamento (como o real,
euro, libra ou dólar).
No século 21, novas tecnologias e modelos prometem
acabar com o dinheiro da forma como você conhece. A tendência é que, nos próximos
anos, a sociedade caminhe para um mundo em que não haverá circulação de
dinheiro físico.
Em 2015 o dinheiro vivo foi o principal meio de
pagamento no mundo. Países da Europa já começam a se preparar para uma nova
fase, com menos dinheiro em espécie. Na Suécia, já existem lojas que não
aceitam dinheiro.
Este ano, por exemplo, apenas um quinto de todos os
pagamentos de consumidores na Suécia foi feito em dinheiro. Já a Dinamarca
anunciou que quer se tornar o primeiro país do mundo a eliminar oficialmente a
circulação de dinheiro físico.
Os dois países argumentam que é mais fácil fiscalizar
o dinheiro eletrônico e assim evitar problemas como a lavagem de dinheiro, a
sonegação de impostos gerados pela economia informal e o caixa dois de
empresas.
A escalada do Bitcoin
A mudança mais significativa na tecnologia financeira
é atribuída às moedas virtuais criptografadas. O maior destaque é o Bitcoin,
que pode ser usado para comprar produtos e serviços na internet e em
estabelecimentos físicos conectados à rede.
Atualmente é possível comprar quase tudo com bitcoins:
eletroeletrônicos, roupas, livros, alimentos. Nos Estados Unidos, até
apartamentos e casas já foram vendidos dessa forma. Em Berlim, na Alemanha, existe um bairro
conhecido como bitcoinkiez ("bairro do bitcoin", em alemão), em que
todo o comércio local (restaurantes, bares e lojas) está disposto a receber na
moeda virtual.
O Bitcoin surgiu em 2008 e sua criação é atribuída a
um programador conhecido sob o pseudônimo de Satoshi Nakamoto. A moeda entrou
para a história e revolucionou o setor por ser o primeiro sistema de pagamentos
global totalmente descentralizado.
Imagine fazer transferências na internet com a mesma
facilidade com que se envia um e-mail. O modelo Bitcoin permite realizar
transações financeiras de forma direta, sem a necessidade de um intermediário.
Um sistema que pode acabar de vez com o banco físico.
Para o usuário, a maior vantagem da descentralização
seria a compra e venda com taxas mais baratas do que a de um banco tradicional
ou uma empresa de cartão de crédito. Existem ainda usuários que não querem
depender das políticas monetárias do governo ou de bancos, e aqueles que buscam
fazer uma reserva de valor, sem ficar expostos a riscos como o confisco do
dinheiro pelo Estado durante crises financeiras.
O sistema de bitcoins não é controlado por nenhum
Banco Central ou instituição bancária, mas por criptografia. É por isso que
essa invenção também pode ser chamada de “criptomoeda”. Desde então, outras moedas
similares surgiram no mercado.
O controle descentralizado está relacionado ao uso do
Blockchain, uma tecnologia de banco de dados que é semelhante a um livro de
registros virtual. Não existe um “dono” do sistema, que é aberto a qualquer um.
A Blockchain grava todas as transações realizadas com
Bitcoins e garante que uma unidade da moeda não seja utilizada duas vezes. Isso
faz com que a moeda virtual não seja falsificada. Cada moeda digital está
numerada e todas as transações são públicas e podem ser visualizadas pela
comunidade. Na prática, a Blockchain funciona como um livro público, que regula
o envio e o recebimento da moeda.
Quem quiser usar o Bitcoin precisa se cadastrar em
algum dos sites que trocam dinheiro real por bitcoins, como se fossem uma
agência de câmbio. Depois, basta criar uma conta com um código pessoal
criptografado e comprar o Bitcoin. O dinheiro fica guardado no computador de
cada um, como se fosse um arquivo ou um software.
O modelo é similar ao das redes P2P, usadas para
compartilhamento de arquivos na internet. Por isso, controlar a moeda virtual,
como fazem os bancos centrais com a moeda real, é muito difícil.
No início, o Bitcoin valia apenas alguns poucos
centavos e seu uso estava restrito a um grupo de entusiastas da tecnologia. Mas
logo sua popularidade cresceu e a moeda foi se valorizando, atraindo também
grandes investidores. Hoje, o Bitcoin tem um grande valor de mercado. Para se
ter uma ideia, até a data de fechamento deste texto, o valor de compra de 1
Bitcoin equivale a quase R$ 2 mil.
Quem “fabrica” esse dinheiro? Quem coloca o Bitcoin no
mercado são usuários chamados de “mineradores”, que cedem voluntariamente a
capacidade de seus computadores via internet para verificar as transações no
Blockchain e manter o sistema e funcionando. Em troca, são premiados com
bitcoins.
Mas como manter o valor da moeda estável? É preciso
que uma moeda seja escassa para que tenha valor e não gere inflação. O Bitcoin
foi projetado de modo a ser finito. Isso porque é baseado em fórmulas
matemáticas, diferente da moeda tradicional, que é lastreada em ouro e prata.
Uma pessoa não pode gerar a moeda infinitamente. Tanto que o sistema do Bitcoin
prevê que o máximo de moeda circulando será de 21 milhões de unidades, o que
deve acontecer por volta de 2140.
Críticas e riscos ao modelo do Bitcoin
O Bitcoin é baseado em um software de código aberto
que permite o anonimato dessas pessoas. Em alguns aplicativos de "carteira
virtual" é preciso ter uma conta de e-mail para fazer o registro, já outros
(a maioria) não é necessário nenhum tipo de identificação.
Devido a essa dificuldade de rastrear os usuários e
oferecer anonimato, a moeda virtual pode estimular o comércio de produtos
ilegais. Tanto que o Bitcoin tornou-se a principal moeda dos sites de comércio
ilícito na internet profunda (a deep web), com a venda de drogas e armas e
atividades de lavagem de dinheiro. Mas a polícia pode identificar o usuário se
encontrar o IP dela ou se ela fez qualquer transação de bitcoins em casas de
câmbio.
Em 2013, por exemplo, o FBI prendeu o criador do Silk
Road, site que funcionava como um grande portal de venda de drogas na internet.
As transações eram todas feitas em bitcoins. O site foi fechado e mais de 150
mil bitcoins foram apreendidos pela polícia - o equivalente a 100 milhões de
dólares na cotação de março de 2013.
Existe ainda o risco de uma conta ser hackeada. Em
2014, a Mt. Gox, considerada na época como a principal “bolsa de valores” do
Bitcoin, entrou em colapso e perdeu 500 milhões de dólares. O motivo? Um ataque
hacker ao seu sistema. Em 2016, A Bitfinex, empresa de Hong Kong especialista
em gestão de moedas virtuais, reconheceu que uma falha de segurança em suas
plataformas permitiu o roubo de 119.756 bitcoins, avaliados em 65,8 milhões de
dólares.
O fato de não estar atrelada a governos e bancos faz
com que o Bitcoin esteja fora do controle de fiscalização e flutuações
cambiais. Por esses motivos, representantes dos bancos centrais afirmaram que a
adoção de criptomoedas é um grande desafio para a habilidade dos bancos em
influenciar o preço do crédito (juros) para a economia. Ou seja, a adoção em
massa dessas moedas poderia enfraquecer o papel do Banco Central como regulador
do mercado.
Por representar riscos ao controle de fluxos
financeiros, países como a China, Rússia e a Índia estão tentando criar
barreiras para a circulação desse tipo de moeda. E como são um fenômeno
recente, as moedas virtuais possuem poucas leis que as regulamentam. A
legislação mundial sobre o assunto ainda está em construção e deve se
consolidar nos próximos anos.
Recentemente, uma juíza federal dos Estados Unidos
decidiu que o Bitcoin se qualifica como dinheiro, em ação penal que versava
prática de atividade financeira por pessoa não autorizada. No Japão, o governo
estabeleceu que os lucros e processos de compra relacionados ao Bitcoin devem
estar sujeitos à cobrança de impostos e monitoramento do Estado.
Síria
vive uma "miniguerra mundial": quem são os protagonistas desse
conflito?
Pontos-chave
A guerra civil da Síria começou em 2011 com protestos
antigoverno que foram reprimidos de maneira sangrenta pelo regime. A revolta
popular deu origem a uma guerra civil entre as forças leais ao presidente
Bashar al-Assad e oposicionistas.
Hoje o conflito se multiplicou e envolve centenas de
grupos armados: forças do governo sírio, rebeldes, curdos, radicais islâmicos e
potências estrangeiras.
De um lado, Rússia e Irã apoiam o governo da Síria. De
outro, os Estados Unidos e países europeus apoiam os rebeldes que buscam
derrubar o governo do presidente sírio Bashar al-Assad.
A Turquia apoia os rebeldes contra o presidente sírio
e ataca tropas curdas próximas a sua fronteira.
Em comum, todos lutam contra os radicais do Estado
Islâmico.
Analistas avaliam que a atuação de liderança da Rússia
e dos Estados Unidos lembra o período da Guerra Fria.
Imagens brutais de vítimas civis da guerra da Síria
assombraram os noticiários do mundo inteiro no mês de setembro e jogaram os
holofotes para a situação atual do país. No ataque, os dois principais
hospitais do leste da cidade de Aleppo foram bombardeados. O secretário-geral
da ONU, Ban Ki-moon, classificou os ataques como "crimes de guerra".
Quem estava por trás do bombardeio da cidade de Aleppo
não era o exército do presidente sírio Bashar al-Assad, mas as tropas russas,
que buscavam alvos nos bairros controlados pelos rebeldes. Mas o que está
acontecendo na Síria?
Depois de 5 anos e meio de guerra civil, ao menos 250
mil sírios morreram e 11 milhões de pessoas tiveram que deixar suas casas e
engrossar as filas de refugiados que buscam abrigo em outros países, segundo
dados da ONU e do Observatório Sírio de Direitos Humanos. Milhares deles fazem
parte da mais recente crise migratória na Europa.
A guerra civil da Síria começou em 2011 com protestos
antigoverno que foram reprimidos de maneira sangrenta pelo regime. A revolta
popular deu origem a uma guerra civil entre as forças leais ao presidente
Bashar al-Assad e oposicionistas. O
presidente sírio continua a lutar com o objetivo de reaver o controle sobre
todo o país.
Hoje o conflito se multiplicou e envolve forças do
governo sírio, rebeldes, radicais islâmicos e potências estrangeiras. O jornal
The Washington Post descreveu o que ocorre hoje na Síria como uma
"miniguerra mundial". Entenda os principais protagonistas desse
conflito hoje.
Estado Islâmico
O conflitou se agravou com a entrada no território dos
militantes radicais do Estado Islâmico (EI), que se aproveitaram da
instabilidade na região para fazer ofensivas relâmpago, conquistando
rapidamente novos territórios. O grupo jihadista foi criado em 2013 e cresceu
como um braço da organização terrorista al-Qaeda no Iraque. O EI atacou
povoados e cidades e declarou um califado na região entre o Iraque e Síria. O
grupo luta para derrubar o governo de Bashar al-Assad e expandir seus domínios.
Para isso, usa táticas brutais como assassinatos em massa e decapitações. Além
de importantes cidades, o EI domina reservas de petróleo, represas, estradas e
fronteiras.
O Estado Islâmico une os lados opostos neste conflito:
derrota-lo é o único objetivo que os rebeldes, o governo sírio e potências
estrangeiras têm em comum. Analistas internacionais avaliam que a tendência é
que em breve os militantes do Estado Islâmico fujam do Iraque e Síria rumo ao
Líbano.
Estados Unidos e Europa
Desde 2014 os Estados Unidos realizam uma intervenção
militar no país. Para isso, o país criou uma coalizão internacional responsável
por ataques aéreos no Iraque e na Síria.
O Estado Islâmico é o principal alvo dos EUA. O
presidente Barack Obama declarou que pretende destruir a força bélica do Estado
Islâmico e defende a saída do presidente sírio como medida imprescindível para
derrotar o grupo. Os norte-americanos ainda não enviaram soldados ao combate,
como já fizeram no Iraque e Afeganistão, mas possuem tropas para treinar e
fornecer armamentos a forças rebeldes locais.
A coalizão internacional liderada pelos EUA é chamada
de Forças Democráticas Sírias (FDS), e conta com milícias de combatentes
árabes, cristãos e curdos. As FDS combatem os extremistas do grupo EI e buscam
estabelecer uma Síria democrática no futuro.
A OTAN (Organização do Tratado do Atlântico Norte)
também realiza operações militares na Síria, mas de uma forma mais modesta. A
aliança militar congrega países da Europa e da América do Norte.
Rússia
A intervenção militar da Rússia começou em setembro de
2015, quando o presidente Vladimir Putin enviou bombardeiros, helicópteros e
mísseis de cruzeiro em apoio às Forças Armadas do presidente Bashar al-Assad. A
Síria representa a primeira intervenção militar das Forças Armadas russas fora
de suas fronteiras desde a retirada das tropas soviéticas do Afeganistão, em
1989.
O governo russo justifica a intervenção no país
afirmando que apoia o governo de Bashar al-Assad (tradicional aliado do
Kremlin) e que grupos terroristas constituem uma ameaça para a Rússia. O temor
é que extremistas islâmicos dominem a Síria e, em seguida, espalhem sua
influência para além do Oriente Médio. Além disso, a Rússia tem o interesse de
manter a base naval de Tartus, encravada no litoral sírio. A base é considerada
estratégica por sua localização no mar Mediterrâneo.
A Rússia tem sido alvo de críticas dos EUA e de países
membros da OTAN por seus ataques aéreos. Já o governo russo nega a morte de
civis. “Apesar de toda a gente nos acusar disso, não há qualquer prova que
bombardeamos civis. É falso", declarou Dmitri Medvedev, primeiro-ministro
da Rússia.
Em setembro, outro episódio esfriou as relações entre
Rússia e EUA. Um comboio de ajuda humanitária da ONU ficou sob fogo armado em
Aleppo, na Síria. Como resultado, 20 pessoas morreram e foram destruídos
caminhões com medicamentos para os moradores da cidade ocupada. Militares
americanos acusam os russos e forças sírias de abrirem fogo contra o comboio.
Os porta-vozes oficiais russos, porém, negam.
A relação da Rússia e da OTAN na Síria é lembrada por
muitos como uma herança da Guerra Fria, período conhecido pela tensão entre a
União Soviética e seus rivais ocidentais. "A política da OTAN em relação à
Rússia é pouco amistosa e, para ser sincero, parece que estamos a mover-nos
rapidamente para um período de nova Guerra Fria”, declarou o primeiro-ministro
russo.
Curdos
Os curdos são um grupo étnico e constituem a mais
numerosa população sem um Estado no mundo. Apesar disso, sentem-se parte do
Curdistão, território geocultural que engloba regiões de países como Iraque,
Turquia, Irã, Síria e Armênia.
Na Síria, os curdos formam cerca de 10% da população,
totalizando dois milhões de pessoas, mas nem sempre são tratados com igualdade
pelo resto da população e administrações anteriores.
As forças armadas curdas combatem o Estado Islâmico.
Parte dos curdos pertence à milícia Unidade de Defesa Popular, conhecida como
YPG. Desde o início da luta contra o EI, diversas vitórias da coalizão
internacional liderada pelos EUA contaram com ajuda dos curdos.
Turquia
A Turquia faz fronteira com a Síria. Sua maior
preocupação é manter a segurança de seus limites territoriais e evitar o fluxo
de armas e insurgentes. O país apoia os rebeldes que lutam contra o Estado
Islâmico, mas também quer paralisar o avanço de combatentes curdos.
Os grupos rebeldes apoiados pela Turquia são formados
por árabes sírios e turcos que lutam sob a bandeira do Exército Livre da Síria.
Esse grupo faz oposição ao governo do presidente Bashar al-Assad e tenta
derrubá-lo.
A milícia curda YPG, apoiada pelos Estados Unidos, é
vista como inimiga da Turquia. Para o governo turco, a YPG é um grupo
terrorista considerado uma extensão do Partido dos Trabalhadores do Curdistão
(PKK), que é proibido na Turquia.
Os turcos combatem há três décadas a insurgência curda
no sudeste do país. Por isso, eles temem que ganhos da YPG na Síria fortaleçam
os militantes do PKK no território turco.
Apesar de negar oficialmente que enviou tropas para a
Síria, o exército da Turquia divulgou que realizou bombardeios contra alvos do
YPG no norte sírio. O temor do governo
turco é que o grupo armado domine as cidades próximas à fronteira assim que o
EI for expulso e declare-as como um território autônomo, aumentando a tensão
entre o governo turco e os curdos.
Os Estados Unidos e a Europa consideram o PKK um grupo
terrorista, mas enxergam a YPG como uma entidade separada e forte aliada no
conflito sírio. Essa divergência causou tensões com a Turquia, país membro da
OTAN.
O primeiro-ministro turco, Binali Yildirim, declarou
que se preocupa com a formação de um "corredor do terror" na
fronteira. "Estamos ali para proteger nossa fronteira, dar segurança de
vida e propriedade para nossos cidadãos e assegurar a integridade da Síria.
Nunca permitiremos a formação de um Estado artificial no norte da Síria."
A Turquia ainda possui uma posição chave no conflito.
Depois que a Turquia abateu um avião russo, a Rússia impôs sanções comerciais
sobre o país. A OTAN também se posicionou contra o avanço militar russo e
causou uma tensão diplomática. Após a recente tentativa de golpe na Turquia, o
presidente turco Recep Tayyip Erdogan reclamou da falta de apoio do Ocidente.
Agora Rússia e Turquia tentam reaproximar as relações.
Irã
O Irã é uma potência regional e aliado histórico do
governo de Assad. O presidente iraniano Hassan Rohani disse que apoia o governo
da Síria na luta contra os rebeldes, considerados terroristas. O Irã também se
opõe ao Estado Islâmico. O EI é uma milícia sunita que vê os persas como
hereges que devem morrer.
O país já participou de ataques contra rebeldes ao
lado da Rússia. Para o Irã, a subordinação de Assad é chave para impor freio à
influência de seu grande rival na região, a Arábia Saudita.
Arábia Saudita e países do Oriente Médio
A Arábia Saudita integra desde o início a coalizão
liderada pelos EUA para atacar o EI. Também se opõe a Bashar Al-Assad e apoia
rebeldes sunitas. O país está disposto a enviar tropas por terra.
Recentemente a Arábia Saudita rompeu relações com o
Irã. Os dois países disputam a influência regional no Oriente Médio. Em várias
ocasiões, ficaram em lados opostos de disputas, como na guerra civil da Síria.
Outros países do Oriente Médio integram a coalizão
liderada pelos EUA: Bahrein, Jordânia, Catar e Emirados Árabes Unidos. Já
Israel apoia a queda do governo de Bashar al-Assad, aliado do Irã e do grupo xiita
libanês Hezbollah (tradicional inimigo de Israel).
Religião:
o que o burquíni tem a ver com Estado laico e laicismo?
Pontos-chave
A proibição do uso do burquíni em praias francesas tem
sido defendida na França a partir de dois argumentos: a defesa do Estado laico
e a defesa da libertação do corpo das mulheres.
Um Estado laico é aquele que não possui uma religião
oficial e pratica a separação jurídica e política entre Estado e religião. Ou
seja, defende a autonomia e a não interferência de crenças religiosas ou
espirituais nas instituições públicas.
Existem dois tipos de laicidade: a neutra e a
pluriconfessional. O Estado laico neutro veta todo e qualquer símbolo e
discursos religiosos nos poderes e instituições públicas. Já a laicidade
pluriconfessional traz o respeito à diversidade religiosa e brechas para que
elas influenciem em doutrinas do Estado.
A laicidade pluriconfessional é mais próxima do que é
praticado no Brasil hoje. O Brasil é um Estado laico e a Constituição Federal
garante a liberdade de pensamento e a liberdade religiosa como um direito
constitucional.
Desde julho de 2016, mais de dez cidades da França
decretaram a proibição do uso do burquíni em suas praias. O burquíni é o traje
de banho usado por mulheres muçulmanas e que cobre o corpo da cabeça aos pés.
Ele surgiu recentemente na moda e hoje representa uma opção para mulheres
muçulmanas que não se sentem confortáveis em exibir partes do corpo na praia ou
que são proibidas de fazê-lo pela religião.
A proibição dessas vestimentas em espaços públicos tem
sido defendida na França a partir de dois argumentos: a defesa do Estado laico
e a defesa da libertação do corpo das mulheres.
O primeiro-ministro francês, Manuel Valls, declarou
que a peça de vestuário não é compatível com os valores da França. Segundo ele,
seu uso afronta a laicidade do país. “As praias, como qualquer espaço público,
têm de estar livres de qualquer reivindicação religiosa”.
Já a política Marine Le Pen, Líder da Frente Nacional,
partido de extrema-direita francês, declarou que as peças de roupa não fazem
parte da cultura local. "É uma
questão de laicismo republicano, de ordem pública, certamente; mas, além disso,
trata-se da essência da França: a França não aprisiona o corpo da mulher, não
esconde metade da população sob o pretexto errado e odioso do medo de que a
outra metade caia em tentação."
A decisão de vários municípios de proibir o uso da
peça islâmica nas praias francesas provocou uma forte polêmica na França. Os
véus mulçumanos já são proibidos em escolas públicas francesas, primárias e
secundárias, desde 2004. Agora políticos querem estender a proibição para as
universidades. A deputada francesa Nadine Morano sugeriu até que as mulheres
não francesas que reincidirem na quebra da lei do burquíni sejam expulsas do
país.
Críticos das medidas proibitivas alegam que elas são
um reflexo da crescente islamofobia no país, com a radicalização do discurso de
que o islamismo e a presença de muçulmanos imigrantes na França “trazem
problemas”. A questão se agravou com a forte tensão provocada pelos recentes
ataques terroristas na França.
Também se discute a visão etnocêntrica dos franceses.
Etnocentrismo é um conceito antropológico que ocorre quando um indivíduo ou
grupo de pessoas discrimina o outro, julgando-se melhor ou pior, seja por causa
de sua condição social, pelos diferentes hábitos ou manias, por sua forma de se
vestir, ou pela sua cultura.
Além disso, apesar da proibição usar um discurso sobre
a libertação do corpo, ao impor uma regra de vestimenta para a mulher
frequentar o espaço público, as mulheres estariam sendo discriminadas e seus
direitos humanos estariam sendo violados. Escolher o que vai vestir sem interferência
do Estado seria um direito humano básico.
O Estado laico, laicismo e a liberdade religiosa
O argumento de muitos políticos franceses que defendem
a proibição de vestimentas muçulmanas é a defesa do Estado laico, considerado
um dos pilares da civilização francesa. A questão da laicidade gera debates
acalorados no país.
Em 2013, a França adotou nas escolas públicas a “Carta
da Laicidade”, que proíbe o uso do véu islâmico nas escolas, da estrela de Davi
ou da cruz, além de proibir a ausência de alunos durante festas religiosas. Na
ocasião, Vicent Peillon, o então ministro da educação, declarou: “a laicidade é
uma batalha que não opõe uns aos outros, mas uma batalha contra aqueles que
querem opor uns aos outros".
Um Estado laico, secular ou não confessional é aquele
que não possui uma religião oficial e pratica a separação jurídica e política
entre Estado e religião. Ou seja, defende a autonomia e a não interferência de
crenças religiosas ou espirituais nas instituições públicas.
Esse princípio foi um ponto central da visão política
que surgiu após a Idade Moderna. A Revolução Francesa trouxe o conceito de
liberdade como um direito dos cidadãos e um dever do Estado.
No Ocidente, historicamente a Igreja Católica e o
Estado exerciam um regime de união, sendo a religião um elemento central e
legitimador da ordem social. Na Idade Média, por exemplo, a religião era a
principal esfera da vida humana e exercia grande influência na ordem política.
Tanto que nesse período aconteceu a Inquisição, uma espécie de tribunal
religioso criado na Idade Média para condenar todos aqueles que eram contra os
dogmas pregados pela Igreja.
É a partir do século 18 que o Estado desvincula-se da
Igreja e passa a adotar a neutralidade com questões religiosas. Em um Estado de
Direito, o poder emana do povo, ou seja, é o povo que elege seus
representantes. Além disso, o poder é regulado pelo direito. O Estado adota um
conjunto de normas, um documento escrito que enumera e limita os poderes
políticos e assegura os direitos fundamentais e individuais dos cidadãos.
O Estado teocrático ocorre quando há uma mistura de
Direito com Religião, em que o líder do Estado é ao mesmo tempo um líder
religioso e que pode criar leis a partir de uma visão espiritual. O Estado
adota uma religião oficial e todos são orientados a seguir essa crença.
Exemplos atuais de regimes desse tipo são o Irã, país
controlado pelos aiatolás, líderes religiosos islâmicos, e o Vaticano, regido
pela Igreja Católica e tendo como autoridade máxima o Papa.
Mas para que existe o princípio de laicidade? A
laicidade é um dispositivo de proteção à livre consciência e expressão de todas
as crenças, de modo a garantir o reconhecimento da diversidade social em
sociedades democráticas. Esse modelo surge pela necessidade de garantir e
respeitar os direitos individuais, dando ao Estado a autonomia exclusiva para
sua administração política soberana.
Existem dois tipos de laicidade: a neutra e a
pluriconfessional.
O Estado francês pode ser considerado um exemplo de
Estado laico neutro, porque veta todo e qualquer símbolo e discursos religiosos
nos poderes e instituições públicas. Existem correntes de pensamento que
consideram que a França está alinhada ao laicismo, um tipo de ideologia que
prega o racionalismo e a neutralidade total. Em seu extremo, o laicismo corre o
perigo de se tornar uma ideologia totalitária, ao não permitir nenhum aspecto
religioso na vida cultural da sociedade. Na Coreia do Norte, por exemplo, o
regime socialista chegou a proibir a prática de qualquer religião e a vetar
livros religiosos.
Embora apele para a defesa da laicidade, a proibição
do uso do burquíni na França pode ser contraditória. Isso porque o princípio
fundamental do Estado laico é a liberdade religiosa, ele assegura que todo
cidadão tem o direito de ter ou adotar uma religião ou uma crença de sua
escolha. Assegura ainda o direito de não ter crença, como o direito de ser
ateu.
A Declaração Universal dos Direitos Humanos foi
promulgada pela Assembleia Geral das Nações Unidas em 1948 e reconhece a liberdade
religiosa como um direito humano. O artigo 18 diz: “tal direito inclui a
liberdade para mudar de religião ou crença, bem como a liberdade para
manifestar, de forma particular ou em comum, de forma pública ou privada, sua
religião ou crença no ensino, nas práticas, no culto e na observância dos
ritos”.
Desta forma, o Estado não pode restringir ou
discriminar as convicções religiosas, sendo assegurado o livre exercício dos
cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto,
ao uso de símbolos religiosos e a suas liturgias.
Já a laicidade pluriconfessional traz o respeito à
diversidade religiosa e brechas para que elas influenciem em doutrinas do
Estado. No entanto, essa influência deve respeitar princípios básicos como a
liberdade religiosa e a igualdade de representatividade de diferentes grupos
sociais dentro da esfera pública. Ou seja, o Estado não pode ter condutas que
criem barreiras para a coexistência em condições igualitárias de todas as
religiões cultuadas no país.
Oriunda dos Estados Unidos, a laicidade
pluriconfessional é mais próxima do que é praticado no Brasil hoje. O Brasil é
um Estado laico e a Constituição Federal garante a liberdade de pensamento e a
liberdade religiosa como um direito constitucional.
Apesar disso, o Brasil não pratica em todas as esferas
o laicismo. Isso porque o Estado brasileiro reconhece a possibilidade de
incluir discursos religiosos na estrutura política. Na carta constituinte de
1988, lê-se: “promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte Constituição da
República Federativa do Brasil”. O Estado brasileiro também autoriza o ensino
religioso em algumas escolas públicas e tolera a existência de símbolos
religiosos em instituições públicas, como escolas públicas, parlamentos e tribunais
de justiça.
Embora o Brasil seja considerado um Estado laico, nos
últimos anos a interferência de grupos religiosos na política brasileira
aumentou drasticamente e acendeu um alerta sobre a questão da separação entre
religião e Estado. O que chama a atenção é o poder da chamada bancada
evangélica, com representes eleitos democraticamente e cada vez mais fortes nas
eleições. Em 2015, o grupo contava com um número recorde de 78 representantes
no Congresso.
O problema é que, ao propor leis sob um viés
religioso, políticos podem ameaçar a liberdade dos direitos individuais, impor
a visão moral de uma determinada religião sobre outras e barrar projetos que
poderiam ter o respaldo do Poder Judiciário.
Várias das propostas da bancada podem ter impacto considerável
no dia a dia dos brasileiros. São exemplos o Estatuto da Família, que discute
se um casal pode ser formado apenas por homem e mulher (dificultando o
reconhecimento das uniões entre pessoas do mesmo sexo e até o direito à adoção
de crianças) e a proposta do deputado Marcos Feliciano (PSC-SP) de criar um
projeto de lei que busca incluir o ensino do criacionismo nas escolas, ou seja,
a crença na criação do homem a partir de Deus.
Geografia:
a economia brasileira passa por um processo de desindustrialização?
Pontos-chave
A participação
da indústria na economia brasileira é cada vez menor. Dados recentes sugerem
que o Brasil passa por um processo de desindustrialização, fenômeno que se
refere à perda acentuada da atividade industrial.
Em 1985, a indústria de transformação respondia por
25% do PIB brasileiro. Desde então, foi perdendo substância e hoje em dia
responde por menos do que 15% do PIB do país.
Nos países
desenvolvidos, a desindustrialização é um processo natural. Com o
desenvolvimento econômico, a participação dos serviços sofisticados aumenta, e,
em consequência, a participação da indústria de transformação cai. Mas não é o
caso do Brasil.
Esse processo foi causado por uma série de fatores
como a competição com a economia chinesa, o câmbio sobrevalorizado (valorização
da moeda), a falta de inovação, os juros elevados e os custos implícitos do
sistema produtivo nacional.
Quando foi a última vez que você comprou um produto
fabricado no Brasil? É provável que a maior parte dos produtos que você use
seja importada. Não por acaso. A participação da indústria na economia
brasileira é cada vez menor. Dados recentes sugerem que o Brasil passa por um
processo de desindustrialização, fenômeno que se refere à perda acelerada da
atividade industrial.
O principal problema está no setor de manufaturados. É
ele que abrange a produção de bens com maior complexidade. Em 1985, a indústria
de transformação, aquela que converte matérias-primas em produtos, respondia
por 25% do PIB brasileiro. Desde então, foi perdendo substância e hoje em dia
responde por menos do que 15% do PIB do país. Em 2014, o setor chegou a 10,9%,
segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
A indústria tem por finalidade transformar
matéria-prima em produtos que possam ser vendidos. Ela é uma das três
atividades econômicas (ao lado dos serviços e da agropecuária) e possui grande
importância para o Produto Interno Bruto (PIB) de um país. Desde que a
indústria surgiu na Revolução Industrial, no fim do século 18, ela tem sido o
motor de crescimento do capitalismo.
A globalização e a tecnologia
Após a Guerra Fria, o mundo sofreu um processo de
globalização que trouxe a integração econômica dos continentes e o aumento dos
fluxos internacionais de mercadorias. O capitalismo global é caracterizado por
forte competição econômica, não apenas entre as empresas, mas entre os países.
Um dos efeitos da globalização é a dispersão espacial da indústria. Ao invés de
produzir em seu país de origem, empresas transnacionais montam unidades
industriais em países que oferecem custos mais baratos.
Nos anos 1990, países que até então eram considerados
menos desenvolvidos entraram na rota da internacionalização da produção
industrial como China, Singapura, Coreia do Sul, Taiwan, Indonésia e Índia. As
economias emergentes conquistaram seu espaço no mercado mundial ao oferecer
abundância de matéria-prima e baixos salários.
Os países asiáticos foram os que alcançaram o maior
crescimento, com destaque para a China. A partir de 1990, os chineses se
tornaram gigantes do setor industrial, com uma política orientada para a
exportação e investimento em infraestrutura. O país elevou a marca de 3% da
produção global de manufaturados em 1990 para aproximadamente 20% em 2010,
superando os Estados Unidos. Em três décadas, a China multiplicou o PIB em 17
vezes.
A globalização também trouxe a inovação como um
fator-chave de uma economia dinâmica. Novas tecnologias revolucionaram o modo
como as pessoas se relacionam com o mundo. A produção de tecnologia de ponta se
tornou um importante vetor de mudanças, em um ritmo cada vez mais acelerado.
A inovação introduz novos produtos, processos e
modelos de negócios. Isso não quer dizer que países em desenvolvimento não
possam ter tecnologias inovadoras, como a indústria aeronáutica do Brasil e a
eletrônica da China.
Os serviços também ganharam cada vez mais importância
na estrutura econômica. Nos países industrializados mais avançados a maior
contribuição para o PIB vem atualmente do setor de serviços, não do industrial.
Isso significa que a estrutura econômica está mais concentrada em itens de
maior valor agregado.
Até mesmo na indústria. A indústria é, hoje, uma
grande consumidora de serviços que agregam valor: marketing, planejamento,
logística, serviços financeiros e assistência técnica. Quanto mais complexa a
estrutura industrial de um país, mais sofisticada é a rede fornecimento de
serviços.
O fenômeno da desindustrialização pode ser observado
em cidades e em países industrializados. Seria um processo natural em locais
que tiveram grande crescimento industrial e que atingiram seu pico de
desenvolvimento, possuem uma estrutura industrial de ponta ou foram impactados
por mudanças no mercado.
Se nos países asiáticos o estímulo do desenvolvimento foram
os baixos custos de produção, nos países desenvolvidos a inovação e o
conhecimento se transformaram nos motores da economia. Com investimento em
pesquisa e desenvolvimento, cada vez mais a vantagem competitiva dos países
desenvolvidos não está na produção e exportação de manufaturas em si, mas no
uso de tecnologia exclusiva, das atividades criativas, na força da marca e na
criação de produtos diferenciados.
Enquanto a montagem de um produto foi terceirizada
para os países emergentes, os países ricos passaram a investir mais em
educação. Novos polos industriais de tecnologia surgiram em diversos países,
como o Vale do Silício, na Califórnia (EUA), que oferece um grande cenário de
investimentos. São lugares que não se localizam mais nas áreas onde existe
abundância de matérias-primas, mas próximos a importantes centros de pesquisa e
de ensino universitário.
Em países em desenvolvimento, a desindustrialização
está muito mais ligada aos processos de substituição de importações. Esse pode
ser o caso do Brasil. Aqui o setor de serviços já responde por 71% do PIB
brasileiro. Mas não porque temos uma indústria de ponta. Segundo economistas, a
desindustrialização no Brasil seria um processo precoce (a indústria ainda não
teria atingido o seu potencial máximo) e se deve a deficiências internas,
principalmente à perda da competitividade das empresas brasileiras, impactada
com a falta de inovação local e a entrada maciça de produtos asiáticos no
mercado doméstico.
A industrialização brasileira e gargalos
A industrialização no Brasil começou tardia, no início
do século XX. Em 1920, o Brasil já possuía 200 mil operários nas indústrias.
Durante o Estado Novo (1937-1945) a economia brasileira se caracterizou pela
forte intervenção estatal do governo de Getúlio Vargas. Até 1950 foram criadas
importantes companhias estatais no setor de base que foram fundamentais para o
processo de desenvolvimento industrial, como a Companhia do Vale do Rio Doce, a
Companhia Siderúrgica Nacional e a Petrobras.
Na década de 1940 a atividade industrial teve um
impressionante crescimento de 11,25% ao ano. Nas décadas seguintes houve um
grande investimento em infraestrutura (portos, ferrovias, estradas, energia
elétrica, etc.) e a indústria continuou a crescer, impulsionada pelo forte
mercado consumidor interno. O processo se consolida até o final da década de
1970, período em que o Brasil possuía uma estrutura industrial diversificada e
integrada.
A partir de 1980, a indústria brasileira começa um
período de declínio e estagnação e o país viveu um período de inflação alta.
Nos anos 1990, o país fez uma abertura comercial e diminuiu as tarifas de
importações, o que abriu o mercado para novos concorrentes. O mercado interno
foi inundado por bens importados.
A partir dos anos 2000, a inflação foi controlada
(gerando estabilidade de preços) e houve o crescimento do consumo no Brasil,
impulsionado por políticas públicas. Apesar desse cenário, os produtos
manufaturados brasileiros perderam competitividade e espaço no mercado interno
e global. O governo estimulou o consumo da população, mas a indústria não
conseguiu melhorar a capacidade produtiva e crescer.
Um dos principais problemas é que o custo de se
produzir aqui é maior em relação aos asiáticos. Segundo dados de 2013 da FIESP
(Federação das Indústrias do Estado de São Paulo), o produto nacional é em
média 34% mais caro do que um similar importado. Esse processo foi causado por
uma série de fatores como a competição com a economia chinesa, o câmbio
sobrevalorizado (valorização da moeda), a falta de inovação, os juros elevados
(que dificultam financiamento e diminuem o consumo interno) e os custos
implícitos do sistema produtivo nacional.
Com os preços baixos praticados por países como a
China, alguns setores da indústria brasileira não conseguiram suportar a
entrada de produtos importados. É o caso do setor têxtil, que desde 1990 sofre
problemas com a concorrência com produtos asiáticos. Para uma marca de roupas
brasileira, compensa mais importar tecidos de outro país e focar apenas na
criação da marca. Com baixa competitividade, muitas fábricas de tecido e
confecções brasileiras fecharam.
Em relação ao câmbio, uma taxa de câmbio competitiva
influencia no preço da importação de insumos e nas exportações de produtos manufaturados.
Se a moeda brasileira está muito forte, a indústria precisa aumentar os preços
dos produtos que serão exportados e perde competitividade. Se a taxa está em
equilíbrio, estimula os investimentos orientados para a exportação. Ela também
influencia em decisões de investimentos de um empresário.
Outro problema a ser enfrentado é o chamado “Custo
Brasil”, uma expressão que se refere aos custos de produção e do ambiente de
negócios do país, influenciando as condições de oferta: a tributação, acesso e
tipos de financiamento, as relações do trabalho (custos para manter um
trabalhador), a qualidade das estradas e portos e a infraestrutura.
Segundo a Fiesp, o Brasil possui alta carga
tributária, há um gargalo no sistema de escoamento da produção nacional (o que
encarece o preço final de um produto) e a contratação de funcionários seria
mais cara do que em outros lugares.
Se o Brasil não consegue vender produtos a preços
baixos, o caminho poderia ser a inovação e a modernização das empresas para
agregar valor aos produtos. Mas seria necessário um investimento em novas
máquinas, tecnologias, educação, modelos de gestão inovadores e pesquisa.
A baixa qualidade da educação brasileira e as
deficiências no ensino superior limitam a capacidade de inovar das empresas. Em
termos de disponibilidade de engenheiros e cientistas, por exemplo, o relatório
Global Competitiveness Report 2012-2013 avalia que o Brasil está na 113ª
posição entre 144 países. A possibilidade do Brasil se tornar uma potência de
inovação parece estar em um cenário ainda distante.
Outras saídas para a recuperação da indústria seriam o
investimento em novos mercados que o Brasil teria um potencial natural, como
tecnologias e projetos de sustentabilidade ambiental, ou ainda, agregar valor
em setores como a agricultura, pecuária e o extrativismo. Por exemplo, não
exportar apenas a laranja, mas o suco já processado (uma manufatura).
A ascensão das commodities
Enquanto a indústria brasileira está estagnada, as
commodities ganham cada vez mais espaço na atividade econômica do país.
Commodities são matérias-primas negociadas nos mercados internacionais e
consideradas produtos de baixo valor agregado. São esses produtos que seguram a
atual balança comercial brasileira.
Em 2001, commodities agrícolas, combustíveis e
minerais respondiam por menos da metade das exportações brasileiras. Dez anos
depois, esse valor subiu para 70% e o setor continua aumentando suas
exportações e sua relevância no comércio internacional. Os principais produtos
que o Brasil exporta são grãos como a soja, milho e algodão, metais como o
minério de ferro e riquezas como o petróleo. Nos últimos anos, o Brasil exporta
matéria-prima para países como a China, que vende ao Brasil produtos
industrializados.
O aumento da população mundial e o crescimento de
outros países geram uma maior demanda por recursos naturais e alimentos. Isso
faz com que a comercialização de commodities continue a ganhar escala no
Brasil.
No entanto, a forte dependência das commodities na
balança comercial pode gerar um risco em caso de queda nos preços desses
produtos e por isso revitalizar a indústria nacional geraria um maior
equilíbrio.
Eleições:
qual é a importância de um prefeito na nossa vida?
PONTOS-CHAVE
O prefeito é o chefe do poder Executivo municipal.
Cabe a ele administrar e planejar a cidade e manter em bom funcionamento os
serviços públicos essenciais à população local.
Ele também decide onde serão aplicados os recursos
provenientes dos impostos, quais obras devem ser executadas e programas
sociais, culturais e de desenvolvimento a serem implantados.
Ao viver em uma cidade, somos beneficiados por
diversos serviços públicos. Decidir onde e como vai ser aplicado o dinheiro
arrecadado é uma tarefa do prefeito.
Cerca de 160 milhões de brasileiros estão vivendo nas
cidades. De acordo com o Censo de 2010, 84 de cada 100 habitantes moram em área
urbana no país. São lugares com populações que variam de 800 habitantes até
mais de 11 milhões, com características e desafios muito diferentes entre si.
Em outubro deste ano, os brasileiros terão eleições
para definir os próximos prefeitos e vereadores das 5.570 cidades do país
(apenas Brasília e Fernando de Noronha não votam no cargo).
Mas você sabe o que faz um prefeito? A palavra
“prefeito” deriva do latim praefectus, que significa "homem que está à
frente de qualquer coisa; governador, intendente, administrador, chefe”. A
pessoa que recebia este cargo na Roma Antiga era “colocada à frente” do comando
de certas instituições ou grupos.
O prefeito é o chefe do poder Executivo municipal.
Cabe a ele administrar e planejar a cidade e manter em bom funcionamento os
serviços públicos essenciais à população local. Ele também decide onde serão
aplicados os recursos provenientes dos impostos, quais obras devem ser
executadas e programas sociais, culturais e de desenvolvimento a serem
implantados.
O mandato de um prefeito é de quatro anos e ele pode
ser reeleger, mas apenas uma única vez. Seu salário é definido pela Câmara
Municipal e a única regra é que ele não pode ser maior do que ganha um ministro
do Supremo Tribunal Federal (STF).
O desenvolvimento local é um processo gradual de
melhoria de qualidade de vida de um território. A função social da cidade está
prevista no artigo 182 da Constituição Federal, que entende que a cidade é um
bem comum que pertence ao conjunto de sua população. Ela deve oferecer
qualidade de vida de forma equilibrada a todas e todos, com oportunidades em
variadas dimensões: cultura, lazer, saúde, educação, assistência e inclusão social,
transporte, trabalho e renda, moradia, infraestrutura, entre outros.
Ao viver em uma cidade, somos beneficiados por
diversos serviços públicos: escolas e creches, habitação, o recolhimento do
lixo e construção de aterros sanitários, o fornecimento de água e esgoto, a
organização do trânsito, a limpeza das ruas, energia elétrica nas vias
públicas, transporte coletivo (ônibus, metrô e trens), postos de saúde e
hospitais, segurança pública e defesa civil.
Além disso, a prefeitura define como será realizado o
planejamento do uso do solo e do território urbano, as obras de infraestrutura,
a concessão de licença para localização e funcionamento de estabelecimentos
industriais, comerciais e prestadores de serviços, políticas de preservação
ambiental e uso racional dos recursos naturais, entre outros.
Decidir onde e como vai ser aplicado o dinheiro
arrecadado é uma tarefa do prefeito. Ele deve entender os principais problemas
das comunidades para fazer um planejamento eficiente. Como líder político,
eleito pelo povo, ele precisa dialogar com a população, conhecer suas
necessidades, mobilizar recursos e negociar conflitos de interesse.
O prefeito dirige toda a máquina da Prefeitura, com o
auxílio de uma equipe de secretários e dos responsáveis por diversos setores.
Ele e sua equipe montam uma proposta de orçamento, que precisa ser aprovada
pela Câmara de Vereadores. Em algumas cidades, a definição do orçamento também
conta com a participação da população (o chamado orçamento participativo).
Existe ainda o planejamento participativo, que conta
com a participação de grupos e representantes da sociedade civil e a realização
de audiências para toda a população interessada. Nesse caso, é desenhado
coletivamente um Plano Diretor da cidade, que tem como objetivo ordenar o pleno
desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem-estar de seus
habitantes.
Para realizar todas as tarefas essenciais à população,
as prefeituras contam principalmente com o dinheiro arrecadado pelo IPTU
(Imposto Predial e Territorial Urbano) e ISS (Imposto Sobre Serviços). Na
grande maioria das cidades essa verba não é suficiente, por isso, elas contam
com um repasse de recursos do Governo Federal e do Governo Estadual.
Realizar uma boa gestão financeira tem sido o
principal desafio dos prefeitos do Brasil hoje.
Em 2016, 80% do dinheiro gasto por mais de dois terços das prefeituras
vêm de transferências e fontes externas à sua arrecadação. Dessas fontes de
recursos, a maior parte tem origem no Fundo de Participação dos Municípios
(FPM), mantido pelo Governo Federal.
O município é regido pela lei orgânica elaborada por
sua câmara municipal, que permite autonomia jurídica para legislar sobre
assuntos de interesse local. Além da Constituição Federal, a lei orgânica deve
respeitar as normas da constituição estadual.
Os vereadores discutem e votam projetos na Câmara
Municipal que podem ser transformados em leis. As propostas aprovadas pelos
vereadores são enviadas ao prefeito, que tem o poder de sancionar (aceitar) ou
vetar essas leis, ou ainda, apresentar novas propostas. O prefeito também
precisa do apoio da maioria na Câmara Municipal, para conseguir aprovar os
projetos de que necessita.
E como saber ser a gestão da prefeitura está sendo
realizada do jeito correto? Todo ano o prefeito precisa prestar contas de sua
gestão em um relatório geral. Esse documento precisa ser aprovado pela Câmara
Municipal e pelo Tribunal de Contas municipal. Se essa prestação tiver alguma
irregularidade e for rejeitada por 2/3 da Câmara, ele pode perder o mandato e
ficar proibido de se candidatar de novo.
O trabalho também pode ser fiscalizado pela população.
A Lei Complementar 131/2009, conhecida como a “Lei da Transparência”, determina
a disponibilização, em tempo real, de informações sobre a execução orçamentária
de cada Ente da Federação. Já a Lei 12.527/2011 – “Lei de Acesso à Informação”
– permite ao cidadão ter informações dos órgãos públicos que sejam de seu
interesse particular ou coletivo.
Um bom jeito de acompanhar os dados da sua cidade é acessar
os chamados “Portais da Transparência”, sites que disponibilizam na internet
informações sobre a execução orçamentária e financeira de um município. Outra
opção para acompanhar a gestão da prefeitura é ler a publicação do Diário
Oficial da sua cidade, um jornal criado e mantido pelo governo local para
publicar todos os atos oficiais e ações da administração pública executiva,
legislativa e judiciária.
Turquia:
país sofre tentativa de golpe e tensão política aumenta
Pontos-chave
• Em 15 de julho, parte das forças armadas da Turquia
se rebelou contra o governo do presidente Recep Tayyip Erdogan e tentou dar um
golpe de Estado. A situação foi revertida por tropas leais ao governo.
• O Presidente turco acusa o opositor Fethullah Gülen
de estar por trás da tentativa de golpe.
• Outra possibilidade é que o golpe seja liderado por
militares de orientação secularista.
• A oposição acredita que uma das primeiras
consequências da tentativa de golpe é que o ato possa aumentar o autoritarismo
do presidente e aumentar o seu poder.
O que se seguiu foram confrontos na rua, que deixaram
um saldo de mais de 260 pessoas mortas. O presidente Recep Tayyip Erdogan, do
partido AKP, estava de férias em um resort. Um pelotão de soldados havia se
dirigido ao seu hotel, mas ele conseguiu entrar em um avião a tempo e não
sofreu o ataque. Durante a tentativa, Erdogan entrou na internet ao vivo e
conclamou o povo a defender o governo e preservar a democracia. As massas foram
às ruas e tentaram deter os golpistas. Quase 3.000 militares suspeitos de
envolvimento no levante foram detidos rapidamente pelas forças leais ao
presidente.
O que aconteceu?
Ainda não se sabe o contexto real, as causas e o
tamanho da parcela da população que apoiou a tentativa de levante. Durante a
revolta, militares rebeldes declararam em documento que "a administração
política que perdeu toda a legitimidade foi forçada a cair”. Na retórica, os
líderes apontaram a corrupção e a ameaça ao secularismo turco como causas de
suas ações.
Políticos e o líder do principal partido opositor, o
CHP, descartou apoiar o golpe e disse que respalda o governo democraticamente
eleito. O governo acusa um grupo militar da Turquia a se associar com a
organização Hizmet para realizar o recente golpe de Estado fracassado. O vazamento
de que estaria em curso uma depuração maciça de gülenistas nas Forças Armadas é
apontado como uma das hipóteses para explicar a rebelião.
A Hizmet é uma organização civil fundada nos anos 1960
por Fethullah Gülen, clérigo e pensador muçulmano. Considerado de uma linha
moderada do Islã, ele prega a união do islamismo com a democracia e o mundo
moderno. O movimento possui grande influência na sociedade turca e criou uma
poderosa rede de escolas, empresas, instituições de caridade e órgãos da mídia
na Turquia.
Erdogan e Gülen já foram aliados políticos no passado,
mas agora são rivais. Aos 60 anos, Erdogan é visto como um líder carismático,
responsável pelo crescimento econômico do país. Apesar disso, ele é considerado
pela oposição como um “ditador” islamita, que ameaça a liberdade de expressão.
Em 2013, Erdogan foi acusado de corrupção e diversos
aliados seus foram presos. As acusações ganharam força com a publicação na
internet de uma série de conversas telefônicas grampeadas. Nesta época, ele denunciou
"uma conspiração" organizada pelos aliados do pregador Fethullah
Gülen para derrubar o governo. Erdogan então rompeu com Gülen. No mesmo ano,
milhares de pessoas se reuniram em volta da praça Taksim em Istambul,
desafiaram o governo e denunciaram o autoritarismo do primeiro-ministro. O
governo, por sua vez, respondeu reprimindo as manifestações e censurando a
mídia.
Gülen se encontra exilado nos Estados Unidos desde
1999 e nega qualquer envolvimento com a tentativa de golpe em julho. Atualmente
o governo turco classifica a organização como terrorista, tanto que se refere
ao Hizmet como FETO (Organização de Terror Fethullah).
Este mês, um tribunal de Istambul emitiu um mandado de
prisão contra Gülen. A medida abre caminho para um pedido formal de extradição
do inimigo do presidente Erdogan a Washington. O fato de os EUA abrigarem o
opositor é um ponto delicado na relação entre os dois países.
A oposição acredita que uma das primeiras
consequências da tentativa de golpe é que o ato possa aumentar o autoritarismo
do presidente, que teria “carta livre” para perseguir os gülenistas,
simpatizantes de seu opositor. Desta forma, consolidaria ainda mais o seu
poder. Segundo essa teoria, o golpe seria conveniente para um presidente que
precisava de um pretexto para realizar a prisão de pessoas da oposição.
O presidente turco declarou no dia 20 estado de
emergência de três meses. Nesse período, ele pode aprovar leis sem a
autorização do Parlamento e suspender os direitos individuais da população.
Segundo o primeiro-ministro turco, Binali Yildirim, desde 15 de julho, ao menos
20 mil pessoas foram indiciadas e detidas. Universitários foram proibidos de
sair do país e 24 televisões e rádios tiveram suas licenças de emissão
canceladas. Mais de cinco mil funcionários, sobretudo policiais, professores,
economistas, políticos, juízes e jornalistas foram suspensos ou destituídos de
suas funções, acusados de apoiarem as ideias de Gülen.
Países-membros da União Europeia criticaram as prisões
e demissões em massa, e as classificaram como medidas antidemocráticas.
"Não há dúvida nenhuma de que estas medidas são preocupantes",
afirmou a chanceler alemã Angela Merkel.
Turquia e a geopolítica
Situado na fronteira entre Europa e Oriente Médio, a
Turquia é um país europeu, de maioria muçulmana e que define seu regime como
democrático. Sua posição geográfica é estratégica por fazer a fronteira com a
Europa e o Oriente Médio.
No campo político, a Turquia é considerada pelo
Ocidente como um modelo de sucesso de integração do mundo islâmico com um
Estado laico, democrático e com relações com países ocidentais.
A Turquia é a principal porta de entrada para os
refugiados que buscam a Europa, oriundos de países em conflito como a Síria e o
Líbano. O país tem o papel de ser um “tampão”. Para conter o intenso fluxo
migratório, a União Europeia criou um programa de ajuda econômica de US$ 3,4
bilhões para a Turquia receber imigrantes. Em troca, o país teria maior
possibilidade de se integrar à União Europeia, papel que é acompanhado com atenção
pelo mundo.
O país também atua na guerra civil da Síria, ajudando
tropas locais a combater o Estado Islâmico (EI). Porém, analistas avaliam que o
real objetivo turco na região é evitar o crescimento das forças da etnia curda.
Milícias curdas sírias combatem o EI no norte e sudeste do país. Na Turquia,
existe um conflito permanente entre o governo e os rebeldes curdos do PKK
(Partido dos Trabalhadores do Curdistão), que buscam estabelecer um Estado
curdo independente. Após a tentativa de golpe na Turquia, o PKK intensificou
seus ataques terroristas.
A Turquia secularista
Internamente, uma das principais questões da Turquia é
a tensão entre o secularismo e islamismo. A atual constituição do país tem
caráter secular e garante que o Estado é laico. Isso significa que ela não
reconhece alguma religião oficial do país e proíbe qualquer manifestação
religiosa nas instituições políticas e sociais.
Quem implementou o laicismo foi Kemal Atatürk (1831-
1938). Ele é considerado como o pai da Turquia moderna, sendo reverenciado pela
população como um herói nacional. Após a derrota do Império Otomano, Atatürk
comandou levantes e assumiu a presidência em 1920. Durante o processo de
modernização, suprimiu em 1922 o sultanato e em 1924, o califado. À frente do
Partido Popular Republicano, fundado por ele próprio, chegou a presidente da
República Turca em 1923 e fez significativas reformas, como o sistema judicial
inspirado nos dos países europeus, monogamia, alfabeto latino, indumentárias
ocidentais e restrições religiosas.
Durante o século 20, a Turquia sofreu diversas
tentativas de golpes militares (1960, 1971, 1980 e 1997), o que a torna sua
democracia ainda frágil. As Forças Armadas usaram a defesa do Estado laico e do
secularismo como uma das bandeiras para a realização dos golpes. Eles estariam
defendendo a herança secularista de Kemal Atatürk. Em relação à tentativa do
golpe de julho, existe ainda a hipótese de que determinadas elites do exército
secularista tenham sido afastadas do poder pelo governo de Erdogan.
O presidente também não é bem visto entre as alas mais
liberais, que acreditam que ele tomou diversas medidas de inspirações
islâmicas. Muitos se referem a ele como “inimigo do secularismo”. Entre as
medidas polêmicas da gestão de Erdogan estão a suspensão da proibição do uso de
véus pelas mulheres muçulmanas em escolas e universidades e as fracassadas
tentativas de criminalizar o adultério e proibir a venda de álcool em alguns
bairros.
Cidadania:
Lei Maria da Penha completa 10 anos
Pontos-chave
A Lei Maria da Penha (Lei 11.340), sancionada em 7 de
agosto de 2006, completa dez anos de vigência. Ela foi criada para combater a
violência doméstica e familiar, garante punição com maior rigor dos agressores
e cria mecanismos para prevenir a violência e proteger a mulher agredida.
De acordo com a legislação, configura violência
doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero
que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano
moral ou patrimonial.
Hoje essa lei é a principal ferramenta legislativa na
questão da violência doméstica e familiar contra as mulheres no Brasil. Ela
também é considerada pela Organização das Nações Unidas (ONU) como uma das três
mais avançadas do mundo nessa questão.
Com a Lei Maria da Penha, a violência contra a mulher
torna-se visível e deixa de ser interpretada como um problema individual da
mulher e passa a ser reconhecida como problema social e do Estado, que deve
prever assistência, prevenção e punição para esses casos.
“Em briga de marido e mulher não se mete a colher”.
Esse ditado popular revela muito sobre como o país tratou a violência doméstica
e contra a mulher. Isso porque durante séculos, esse tipo de agressão nem
sempre foi considerada uma violência pela sociedade brasileira. Essa frase
naturaliza um ato abusivo, como algo sem importância e de interesse particular,
uma situação que não precisa de ajuda ou “não é problema meu”.
A cada ano, mais de um milhão de mulheres são vítimas
de violência doméstica no país, segundo dados do Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística (IBGE). Outros dados mostram a gravidade da questão: a
cada cinco minutos uma mulher é agredida no Brasil e uma em cada cinco mulheres
já sofreu algum tipo de violência de um homem (conhecido ou não) e o parceiro é
responsável por 80% dos casos reportados. Os dados são de uma pesquisa de 2010
da Fundação Perseu Abramo.
Apesar da gravidade do problema, a previsão de uma lei
específica no Brasil que trata da violência contra as mulheres, em especial nas
relações domésticas familiares e afetivas, é algo recente e só ocorreu com a
Lei Maria da Penha (Lei 11.340), sancionada em 7 de agosto de 2006, e que
completa dez anos de vigência.
A lei recebeu o nome em homenagem à farmacêutica Maria
da Penha Fernandes. Em 1982, ela sofreu duas tentativas de assassinato por
parte do então marido. Na primeira, depois de um tiro nas costas, ficou
paralítica. Ela enfrentou luta judicial de quase 20 anos para vê-lo punido. Em
1998, em razão da morosidade no julgamento do ex-marido, Maria da Penha
denunciou seu caso à Corte Interamericana de Direitos Humanos denunciando a
tolerância do Estado brasileiro com a violência doméstica, com fundamento na
Convenção Belém do Pará e outros documentos de direitos humanos no sistema de
proteção da Organização dos Estados Americanos. Graças à sua iniciativa, o
Brasil foi condenado pela Corte, que recomendou ao país a criação de lei para
prevenir e punir a violência doméstica.
Em 2006, o Congresso Nacional aprovou a Lei Maria da
Penha (Lei 11.340), que foi o ponto de partida jurídico para enfrentar a
violência doméstica e familiar contra as mulheres no Brasil e hoje é
considerada como o principal dispositivo legal nessa questão. Ela também é
considerada pela ONU como uma das três mais avançadas do mundo no tema, atrás
apenas das leis da Espanha e do Chile.
Além de inovadora, a lei teve grande repercussão
social e hoje é considerada como uma das leis mais conhecidas pelos
brasileiros. Segundo a pesquisa Violência e Assassinatos de Mulheres (Data
Popular/Instituto Patrícia Galvão, 2013) 98% da população conhece a legislação.
Para 86% dos entrevistados, as mulheres passaram a denunciar mais os casos de
violência.
O que diz a lei
Desde 1988 a Constituição brasileira já trazia o princípio
da igualdade entre homens e mulheres, em todos os campos da vida social. O
artigo 226 diz que “o Estado assegurará a assistência à família na pessoa de
cada um dos que a integram, criando mecanismos para coibir a violência no
âmbito de suas relações”.
A inserção desse artigo atribui ao Estado a obrigação
de intervir nas relações familiares para coibir a violência, bem como de
prestar assistência às pessoas envolvidas. No entanto, os casos de violência
contra a mulher eram considerados de menor potencial ofensivo e a punição
dependia muito da interpretação do juiz.
Até 2006, havia um massivo arquivamento de processos
de violência doméstica. Eram comuns casos em que agressões físicas foram
punidas apenas com o pagamento de cestas básicas. Ou ainda, situações fatais,
em que o agressor mata a mulher e tem sua responsabilidade diminuída: a mulher
cometeu adultério e o marido acaba sendo absolvido na Justiça por estar
defendendo a sua honra ou o assassino que cometeu “um homicídio passional” por
ciúmes.
Nesse contexto, muitas brasileiras não denunciavam as
agressões porque sabiam que seriam ignoradas pelas autoridades e os
companheiros não seriam punidos. Outros fatores também contribuem para que a
mulher não consiga sair da relação com o agressor: ela é ameaçada e tem medo de
apanhar de novo ou morrer se terminar a relação, ela depende financeiramente do
companheiro, tem vergonha do que a família e amigos vão achar, acredita que o
agressor vai mudar e que não voltará a agredir ou pensa que a violência faz
parte de qualquer relacionamento.
A Lei Maria da Penha foi amparada no artigo 226 e em
acordos internacionais, altera o Código Penal e aumenta o rigor nas punições
para agressões de pessoas próximas. A lei tirou da invisibilidade e inovou ao
tratar a violência doméstica e de gênero como uma violação de direitos humanos.
A Lei 11.340 configura violência doméstica e familiar
contra a mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte,
lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial:
I - no âmbito da unidade doméstica, compreendida como
o espaço de convívio permanente de pessoas, com ou sem vínculo familiar,
inclusive as esporadicamente agregadas;
II - no âmbito da família, compreendida como a
comunidade formada por indivíduos que são ou se consideram aparentados, unidos
por laços naturais, por afinidade ou por vontade expressa;
III - em qualquer relação íntima de afeto, na qual o
agressor conviva ou tenha convivido com a ofendida, independentemente de
coabitação.
Entre as inovações, está a velocidade no atendimento
aos casos. Depois que a mulher apresenta queixa na delegacia de polícia ou à
Justiça, o juiz tem o prazo de até 48 horas para analisar a concessão de
proteção. Além disso, a Lei Maria da Penha ampara a mulher dentro e fora de
casa. Também considera a agressão psicológica e patrimonial como violência
doméstica e familiar contra a mulher, ou seja, abrange abusos que não deixam
marcas no corpo.
A aplicação da lei Maria da Penha contempla ainda agressões
de quaisquer outras formas, do irmão contra a irmã (família); genro e sogra
(família, por afinidade); a violência entre irmãs ou filhas (os) e contra a mãe
(família). Além disso, garante o mesmo atendimento para mulheres que estejam em
relacionamento com outras mulheres. Recentemente, o Tribunal de Justiça de São
Paulo garantiu a aplicação da lei para transexuais que se identificam como
mulheres em sua identidade de gênero.
Medidas protetivas
A Lei Maria da Penha criou dois tipos de medidas protetivas:
à ofendida (mulher em situação de violência) e medidas obrigatórias ao agressor
(autor da violência), de acordo com o risco que a mulher corre.
As medidas protetivas buscam oferecer um atendimento
integral e qualificado às mulheres, a partir do contexto da violência, como
encaminhar a ofendida e seus dependentes a um programa de proteção ou de
atendimento, determinar o afastamento da ofendida do lar e a separação de
corpos.
Em relação ao autor da violência, a lei prevê que ele
não pode cumprir penas alternativas ou ser punido com multas, e pode ser
enquadrado na suspensão da posse ou restrição do porte de armas, na prisão
preventiva do suspeito, no afastamento do lar ou local de convivência com a
ofendida, na proibição de contato com a ofendida e no pagamento de pensão
alimentícia à família.
Serviços públicos de apoio
Com a vigência da lei, o governo teve que investir na
criação de serviços públicos de apoio à mulher e o problema passou a existir
“oficialmente” na esfera pública. Foram fortalecidas as Delegacias de
Atendimento à Mulher, criados novos juizados especializados de violência
doméstica e familiar contra a mulher, além de amparar serviços de assistência,
como a Casa da Mulher Brasileira e a Central de Atendimento à Mulher - Ligue
180.
A violência contra a mulher torna-se visível e deixa
de ser interpretada como um problema individual da agredida e passa a ser
reconhecida como problema social e do Estado, que deve prever assistência,
prevenção e punição para esses casos.
Apesar de significar um marco na questão da violência
doméstica, ainda falta muito para que a violência contra a mulher terminar. A
Lei Maria da Penha precisa ser implementada nos Estados de forma eficiente.
Além disso, é preciso mudar a cultura de violência e o machismo da sociedade
brasileira. Uma questão que demanda educação, trabalho e tempo.
A Lei do Feminicídio
A Lei Maria da Penha também está salvando vidas. Em
2015, o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) divulgou um estudo que
estimou o impacto da lei nas taxas de homicídios de mulheres. Segundo a
pesquisa, a lei contribuiu para reduzir, em 10%, o número de feminicídios no
Brasil. O termo “feminicídio” é usado para designar o assassinato de uma mulher
pelo simples fato de esta ser mulher.
A Lei Maria da Penha também abriu caminho para que
fosse criada a Lei do Feminicídio (Lei 13.104). Sancionada em 2015, a lei
classifica o homicídio qualificado como crime hediondo, o que aumenta a pena
para o autor. Segundo a Organização das Nações Unidas (ONU), o Brasil ocupa o
5º lugar no ranking global de homicídios de mulheres.
Tecnologia:
uso de drones dispara e equipamentos prometem mudar o mundo
Pontos-chave
Drones são veículos não tripulados, controlados à
distância.
Esses equipamentos já são usados há muito tempo na
área militar, mas nos últimos anos, viraram uma febre para as mais diversas
finalidades.
A segurança do espaço aéreo e a garantia de
privacidade da população são questões que preocupam a população em relação aos
drones.
Elas são leves, voam em uma altura que os helicópteros
não alcançam, entram em espaços considerados pequenos e fazem manobras com
facilidade. Mas não são aviões. As aeronaves remotamente pilotadas (RPAs), mais
popularmente conhecidas como drones, são máquinas voadoras operadas a distância
por controle remoto.
Os drones aéreos surgiram durante a Segunda Guerra
Mundial e buscavam evitar mortes de soldados em operações de risco. Durante a
Guerra Fria, foram usados pelas Forças Armadas dos Estados Unidos em operações
de espionagem. Na Guerra do Iraque, em versões modernizadas, foram usados para
bombardeios.
Em 2014, o presidente Barack Obama anunciou que os EUA
passariam a utilizar drones em operações antiterroristas para combater grupos
jihadistas em países como a Síria, Afeganistão, Somália e Iêmen. Na última
década, a frota de drones dos EUA aumentou de 50 para mais de 7 mil aeronaves,
incluindo minidrones e drones sem armas, que podem ser pilotados a partir de
bases norte-americanas.
Cientistas apostam em uma terceira revolução na
tecnologia bélica (depois da pólvora e das armas atômicas) na qual a guerra
passa a se fazer por automação e inteligência artificial, com drones
terrestres, marítimos e subterrâneos. Seu uso militar promete “uma guerra sem
combate”. Segundo David Deptula, um oficial da força aérea norte-americana, a
verdadeira vantagem deles é “projetar poder sem projetar vulnerabilidade”, ou
seja, não é necessário enviar tropas e coloca-las em risco.
Para o filósofo francês Grégoire Chamayou, pesquisador
do Centro Nacional de Pesquisa Científica francês, o drone bélico propõe um
dilema ético: o ataque só coloca em risco a vítima e estabelece uma distância
entre a violência e o campo de comando. Em um cenário tradicional de conflito,
os lados envolvidos estão tecnicamente vulneráveis a ataques físicos no campo
de batalha. No ataque de um drone, as vítimas são apenas de um lado e o
operador pode voltar pra casa como se nada tivesse acontecido. Por não estar
presente, ele sentiria uma menor “responsabilidade” por um ato letal.
Daí surge outra questão ética: se um drone matar um
civil por acidente, de quem é a culpa? Em 2010, a ONU (Organização das Nações
Unidas), alertou contra o uso de drones na guerra. A ONU destacou os riscos dos
operadores de drones se desligarem do contexto por estarem em estações longe do
conflito e recomendam uma maior atenção à sua formação psicológica.
Nos últimos anos, a tecnologia de drones evoluiu e
esses “robôs voadores” começaram a se tornar menores e relativamente baratos,
conquistando o mercado civil. Seu uso mais conhecido é na captação de imagens
aéreas para fotografia e vídeos, quando o equipamento voa com câmera acoplada,
trazendo diferenciais como a capacidade de aproximação e ângulos inusitados em
produções cinematográficas, publicitárias e jornalísticas. Mas o uso do drone
mudará radicalmente em pouco tempo e suas possibilidades parecem ser infinitas.
A Lux Research, empresa norte-americana que presta
consultoria em pesquisas de mercado, estima que mais de 1 milhão de drones
deverão ser comercializados no mundo até 2025. No Brasil, a expectativa de
faturamento do setor é de R$ 220 milhões em 2016, segundo um estudo do
Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio.
E tudo isso apenas para captar imagens? Não. Esses equipamentos
também podem ter um papel estratégico no ramo de transportes. Nos Estados
Unidos, por exemplo, a empresa Amazon vem testando essas aeronaves como
entregadores em larga escala, com capacidade para levar uma carga de até 25 kg.
A empresa quer entregar produtos nas casas dos consumidores norte-americanos em
apenas 30 minutos. Em 2016, uma empresa chinesa desenvolveu o protótipo Ehang
184, o primeiro drone criado para levar passageiros. O veículo autônomo é
semelhante a um mini-helicóptero, consegue carregar até 100 Kg e voa a uma
altura de 11 mil pés.
Além destas utilidades, drones ainda têm um
diferencial: podem chegar com mais facilidade a locais com condições adversas a
seres humanos. Esses equipamentos já foram utilizados em operações de busca e
salvamento em Fukushima, no Japão, após acidente nuclear de 2011, provocado
pelo tsunami que atingiu a costa do país. Os drones também já foram testados
por bombeiros para apagar incêndios e em missões humanitárias para entregar de
medicamentos e vacinas em áreas de difícil acesso.
Alguns projetos de combate ao crime já inserem esses
equipamentos na rotina. Na Espanha, a polícia usa drones para patrulhar praias
turísticas e identificar várias situações de risco. Eles podem detectar
banhistas em dificuldade, embarcações à deriva e incêndios na vegetação
costeira. No Brasil, O Ministério do Trabalho e Emprego anunciou que começará a
usar drones para combater o trabalho análogo à escravidão no meio rural.
No campo, diversos projetos começaram a monitorar extensas
áreas rurais por drones equipados com softwares inteligentes, que buscam
coletar e processar dados de precisão. Por exemplo, empresas usam as imagens
captadas pelo equipamento para observar falhas na lavoura, identificar ataques
por pragas e outros problemas de solo.
As aeronaves também estão sendo usadas para pulverizar
agroquímicos na agricultura de larga escala. Esses defensivos químicos, em
geral, são pulverizados manualmente sobre as lavouras ou com o auxílio de
tratores. Protótipos de drones mostraram-se eficazes ao liberar quantidades
controladas de agroquímicos em áreas predeterminadas, levando em conta aspectos
meteorológicos e as rotas calculadas pelo seu sistema de GPS. Desta forma,
realizam uma pulverização mais segura e eficiente, capaz de melhorar a
cobertura da aplicação e a qualidade do processo de cultivo.
Os aparelhos não tripulados também são úteis na gestão
de áreas protegidas e no monitoramento de florestas em recuperação. Um projeto
da ONG WWF conseguiu evitar a atividade de caçadores sobre rinocerontes e
elefantes em áreas protegidas na África. No Brasil, a ONG realiza o
monitoramento de florestas e sua regeneração em matas ciliares no município de
Lençois (SP). E no Parque Estadual do Cantão (TO), drones são usados pelo Instituto
Araguaia para fiscalizar a pesca irregular.
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Carregar pílulas abortivas e fiscalizar provas: veja
atividades feitas por drones13 fotos 11 / 13
Romantismo - O roqueiro chinês Wang Feng inovou no
pedido de casamento e utilizou um drone para levar as alianças à atriz Zhang
Ziyi, que ficou famosa por atuar em filmes como "O Tigre e o Dragão"
e "Memórias de uma gueixa". Na festa de aniversário de Zhang, ocasião
escolhida para o músico fazer o pedido, o avião não-tripulado chamou mais atenção
do que o anel de diamante de 9,15 quilates
Segurança, vigilância e privacidade
Durante a abertura dos Jogos Olímpicos de 2016, um
drone sobrevoou o espaço aéreo do Estádio Maracanã e mobilizou militares da
Força Nacional de Segurança. Militares se prepararam para abatê-lo, entretanto,
ele se afastou e não foi mais localizado. Por medida de segurança, os aparelhos
foram proibidos de voarem em toda a região do Rio de Janeiro durante a
realização do evento.
Um objeto não identificado sobrevoando cidades gera
receio por parte dos órgãos governamentais. Isso porque, dependendo do motivo
pelo qual é usado, os drones podem atrapalhar o tráfego aéreo, provocando
acidentes, ou funcionar como um instrumento de espionagem e ataque.
Outra questão é a garantia de privacidade da
população. A vigilância dessas máquinas voadoras praticamente favorece ver sem
ser visto. E nas mãos erradas, drones podem “espionar” propriedades e pessoas
em locais privados, gravando de tudo e sem a autorização de quem é filmado. O
problema pode piorar no futuro. Engenheiros já projetam uma nova geração de
drones ainda menores, parecidos com insetos e pequenos pássaros, o que
permitiria que a vigilância fosse feita de maneira ainda mais despercebida.
A tecnologia anda mais rápida do que a legislação e
controlar os passos e os usos desses aparelhos ainda não é uma tarefa simples.
No Brasil só o uso de drones para o aeromodelismo é autorizado, mas a
fiscalização é precária. Para outras operações, é necessário autorização. Este
documento reúne outras informações sobre qual deve ser a velocidade do
equipamento, altura e outras especificações.
Entre os requisitos estão o de informar a Força Aérea
Brasileira (FAB) com antecedência de 30 dias antes de cada voo, manter pelo
menos 5,5 Km de distância de aeroportos e sobrevoar pessoas e prédios com no
mínimo 30 metros de distância. Usar um drone sem autorização pode render
penalidades que constam no Código Brasileiro de Aeronáutica e vão desde multa
(de R$ 800 a R$ 30 mil), à detenção, interdição ou apreensão do drone.
O próximo passo será a regulação na Agência Nacional
de Aviação Civil (Anac), cujo processo ainda está tramitando. A Anac entende
que pilotos de drones que comandam aeronaves com mais de 25 quilos deverão ter
uma licença e autorização oficial. A regulamentação deve facilitar as regras
para quem trabalha com filmagens aéreas e máquinas pequenas.
Outros países também estão criando novas leis sobre o
assunto. Em 2015, os EUA anunciou um regulamento para garantir o uso seguro dos
artefatos com fins recreativos. O cidadão americano que tenha um drone com peso
até 25 quilos deverá registrar o aparelho antes de começar a usá-lo ao ar
livre. Não comunicar os dados do artefato e o contato de seu proprietário pode
levar a multas de até 250.000 dólares e três anos de prisão. Ao lançar a nova
regra, Anthony Foxx, secretário de Transportes disse “Não se engane: os
entusiastas de aparelhos não tripulados são aviadores, e isso traz consigo uma
grande responsabilidade”.
Homofobia:
preconceito, violência e crimes de ódio
O atentado na boate Pulse ocorrido em junho, em
Orlando, nos Estados Unidos, é considerado o maior ataque a tiros da história
dos Estados Unidos. Usando um fuzil e uma pistola, Omar Mateen, cidadão
americano, filho de afegãos, assassinou 49 pessoas e deixou 53 feridas antes de
ser morto pela polícia no local.
Logo após o massacre, Mateen declarou ter agido em
nome do Estado Islâmico, que mais tarde reivindicou a ação. Mesmo que se
confirme a ligação do atirador com o grupo terrorista Estado Islâmico, o crime
pode ser considerado um ato de homofobia, porque a boate Pulse era conhecida
por ser frequentada pelo público LGBT. Depois do atentado, o presidente
americano Barack Obama afirmou: "O lugar onde foram atacados é mais que
uma casa noturna – é um lugar de solidariedade e empoderamento onde pessoas se
reúnem para se informar, se expressar e lutar por seus direitos civis".
A palavra “homofobia” surgiu na década de 1960, deriva
do grego e significa “medo ou terror de iguais”. Entende-se por homofobia a
discriminação (e demais violências daí decorrentes) contra pessoas em função de
sua orientação sexual e/ ou identidade de gênero.
Pessoas homofóbicas sentem grande desconforto e
intolerância quando pensam em homossexualidade. Motivada pelo preconceito, a
homofobia pode levar a violência física, institucional, psicológica e sexual
contra gays, lésbicas, bissexuais, travestis ou transexuais.
Brasil e os crimes de homofobia
A população LGBT constitui um grupo vulnerável, sendo
alvo de inúmeras violações de direitos humanos em muitas partes do mundo. Em
vários países, o afeto e as relações sexuais consentidas entre adultos do mesmo
sexo são consideradas crime e punidas com prisão ou até com a pena de morte.
O Brasil é um dos países mais perigos para gays,
lésbicas e transexuais. Em média, uma pessoa LGBT é morta a cada 27 horas.
Segundo dados da organização Grupo Gay da Bahia, nos últimos quatro anos e
meio, 1,6 mil pessoas morreram em ataques homofóbicos no país. Os números de
mortes foram coletados com base em registros policiais e notícias. Em 2015, 318
pessoas foram mortas vítimas de homofobia.
Dados da Secretaria de Direitos Humanos do Governo
Federal revelam que, em 2013, foram registradas 1.965 denúncias de 3.398
violações relacionadas à população LGBT. O número pode ser ainda maior devido
ao elevado índice de subnotificação (casos que não são relatados para a
polícia). As denúncias incluem espancamentos, agressões e até os chamados
“estupros corretivos”.
Proporcionalmente, as travestis e transexuais são as
mais vitimizadas, apesar da população ser considerada pequena. O risco de uma
“trans” ser assassinada é 14 vezes maior que um gay. Segundo a rede Transgender
Europe, mais da metade dos homicídios registrados contra transexuais do mundo ocorrem
no Brasil. De 2008 a 2015, ocorreram no Brasil 802 casos. Um dos motivos é que
o grupo está em maior situação de vulnerabilidade social e marginalização.
Direitos e Leis
Em 2011, o IBGE identificou 67 mil casais homoafetivos
vivendo juntos no país. Os números podem ser bem maiores, considerando que nem
todos LGBT se declaram homossexuais nas pesquisas.
Nas últimas decádas, a visibilidade da população LGBT
no Brasil é cada vez maior. A Parada Gay de São Paulo é hoje considerada a
maior do mundo. E cada vez mais empresas estão apresentando seus produtos em
propagandas que mostram casais formados por dois homens ou duas mulheres, para
refletir os novos arranjos familiares.
No campo jurídico, o casamento homoafetivo é estendido
a todo o Brasil desde 2013, quando entrou em vigor a Resolução 175, do CNJ
(Conselho Nacional de Justiça), que determina que cartórios de todo o país não
podem se recusar a celebrar casamentos civis de pessoas do mesmo sexo. Antes
disso, já havia decisões do STF (Supremo Tribunal Federal) e do STJ (Superior
Tribunal de Justiça) que reconhecem que o cidadão deve ter direitos civis
iguais.
O país, no entanto, está longe de acabar com o
preconceito e a violência contra o público LGBT. São comuns relatos de casais
do mesmo sexo que enfrentam diariamente constrangimentos e não se sentem
seguros em manifestar o afeto em bares, restaurantes e locais de comércio. Nas
ruas, enfrentam o assédio e ameaças verbais; no trabalho e nas escolas,
adolescentes e jovens muitas vezes são vítimas de bullying.
Diversos países adotam leis específicas contra crimes
de ódio, aqueles cometidos quando o criminoso seleciona intencionalmente a sua
vítima em função de esta pertencer a um certo grupo. Na Espanha, Suécia, Canadá
e Inglaterra, por exemplo, o Código Penal prevê punições para crimes motivados
pelo ódio e incluem a orientação sexual na lista de motivações da violência.
A lei nº 7.716 decreta que serão punidos “os crimes
resultantes de discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou
procedência nacional”. Movimentos sociais buscam incluir na Constituição outros
tipos de crimes de ódio e que atentam contra a dignidade humana.
Apesar dos recentes avanços nos direitos LGBT, a
prática da homofobia não é tipificada como crime no Brasil. Projetos de leis
nesse sentido foram apresentados no Congresso Nacional e buscam criminalizar as
manifestações de homofobia e os crimes de ódio contra os homossexuais.
Defensores dessas propostas entendem que a
Constituição tipifica crimes de intolerância, aqueles praticados por
preconceito ou discriminação. Mas na legislação ainda não há enquadramento
específico para a discriminação sexual, ao contrário da lei que pune crimes
raciais, por exemplo. Como não há uma lei que determine a homofobia como crime,
não existe punição. Uma lei específica poderia ajudar no combate a essas
agressões e ter uma função “educativa” ou que seja um instrumento de prevenção.
A lei 7716/89 deu à prática do racismo a tipificação
de crime inafiançável e definiu como crime, dentre outras questões, quando a
pessoa negra é proibida de entrar em locais públicos ou quando alguém tenta
impedir, por qualquer meio ou forma, o casamento ou a convivência familiar e
social em razão da cor da pele.
Em 2006, a Câmara dos Deputados aprovou um projeto da
deputada Iara Bernardi que criminaliza a homofobia. O PLC (projeto de lei
complementar) 122 alterava a Lei do Racismo, que prevê punição para
discriminação ou preconceito por causa de raça, cor, etnia, religião ou
nacionalidade. Para esses crimes, a pena pode chegar a cinco anos de prisão.
Caso houvesse a aprovação da proposta, seriam incluídos na lei crimes de ódio
por gênero, sexo, orientação sexual ou identidade sexual. Porém, em 2015 a
PLC-122 foi arquivada ao chegar ao Senado.
A tentativa de criminalizar homofobia pode voltar por
outras propostas legislativas. Um dos mais recentes é o projeto de autoria da
deputada Maria do Rosário, que tipifica crimes de ódio e intolerância contra
diferentes grupos.
Grupos evangélicos e cristãos estão entre os
principais críticos de leis que criminalizam a homofobia, alegando que elas
poderiam impor uma “mordaça” aos líderes religiosos ao ameaçar a liberdade de
expressão dos fieis. Outro argumento é que já existem leis que punem homicídios
e agressões físicas no Brasil. Porém, esse pensamento não leva em conta as
formas de violência mais sutil, como a verbal e a psicológica.
Motivações da Homofobia
A orientação sexual se refere a desejos e atrações
sexuais de um indivíduo. No passado, a homossexualidade já foi considerada uma
doença. Hoje, o Conselho Federal de Psicologia a entende como uma variação
normal da orientação sexual humana. Em 1990, a Organização Mundial da Saúde
tirou a homossexualidade da lista de doenças ou transtornos.
A homofobia tem raízes na cultura da nossa sociedade.
Tradicionalmente, a nossa cultura se assenta numa estrutura “heteronormativa”.
O termo significa que a norma, o padrão ou o considerado “normal” em uma
sociedade é que a pessoa seja heterossexual (sinta atração pelo gênero oposto).
Nesse sentido, todas as outras formas de variações de comportamento e
orientação sexual seriam consideradas “antinaturais”, como o homossexual
(aquele que sente atração pelo mesmo gênero), o bissexual (atraído pelos dois
gêneros) ou o assexual (que não tem desejo sexual).
Pessoas homofóbicas acreditam que a
heteronormatividade é o correto, e quando elas são confrontadas com outras
formas de sexualidade, não as toleram e podem sentir raiva, vontade de agredir
o outro ou aversão total à aprovação de direitos individuais LGBT. Ou seja, não
se trata apenas de aceitar ou não uma orientação sexual, mas de se colocar de
maneira hostil e agressiva a ela, sem o respeito ao outro e às diferenças.
Casos extremos de homofobia trabalham com a “lógica do
extermínio” e podem ser comparados ao sentimento de terroristas muçulmanos
quererem matar ocidentais porque não têm as mesmas crenças. Ou ainda, ao
preconceito de brancos contra negros durante o período do apartheid na África
do Sul, que acreditava na divisão racial.
Pontos-chave
- Homofobia é a discriminação (e demais violências daí
decorrentes) contra pessoas em função de sua orientação sexual e/ ou identidade
de gênero.
- O Brasil tem uma morte de LGBT a cada 27 horas.
Segundo dados da organização Grupo Gay da Bahia, nos últimos quatro anos e
meio, 1,6 mil pessoas morreram em ataques homofóbicos no país.
- No Brasil, apesar dos recentes avanços em direitos
LGBT, a prática da homofobia não é tipificada como crime.
Acordo
histórico: Colômbia e Farc assinam cessar-fogo
PONTOS-CHAVE
• O governo da Colômbia e as Farc assinaram um
cessar-fogo bilateral e definitivo.
• O conflito armado entre as Farc o exército
colombiano é considerado o mais antigo da América Latina, com meio século de
existência.
• A negociação entre governo e guerrilha se dá com
base em cinco eixos principais: situação das vítimas, minas armadilhas e
explosivos, tráfico de drogas, entrada na vida política e reforma agrária.
• O acordo também prevê o desarmamento dos
guerrilheiros e a possibilidade de transformá-los em um partido político.
Uma nova era se inaugura na Colômbia. Em cerimônia na
cidade de Havana, capital de Cuba, o presidente colombiano Juan Manuel Santos e
o líder do grupo guerrilheiro Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia
(Farc), Rodrigo Londoño Echeverri, assinaram em junho um acordo de cessar-fogo
definitivo, abrindo caminho para um tratado de paz que dê fim ao conflito
armado mais antigo da América Latina.
Desde 1964 o conflito já matou mais de 220 mil pessoas
e causou o deslocamento de seis milhões de colombianos. Ao longo dos anos, as
Farc se tornaram uma organização coesa, presente em mais da metade do
território da Colômbia e que chegou a ter 20 mil combatentes. As autoridades
estimam que hoje existam oito mil guerrilheiros.
O acordo é o mais sólido já alcançado entre as partes,
pois foi a primeira vez que desde meados da década de 1980 que ambos concordam
com uma trégua bilateral. Os bastidores desse processo de paz revelam uma
intensa negociação.
Desde novembro de 2012 representantes do governo
colombiano e das Farc se encontram em Havana para costurar o acordo de paz.
Cuba e Noruega atuam como países mediadores desse diálogo e também contam com o
apoio da Venezuela e do secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon como observadores
internacionais.
A etapa do cessar-fogo bilateral definitivo prevê o
cumprimento de um cronograma para tratar diversos temas espinhosos para o fim
do conflito, como o desarmamento, a reintegração à vida civil, a reparação para
as vítimas das guerrilhas e garantias de segurança para os ex-guerrilheiros das
Farc.
Com esse acordo, mais de sete mil guerrilheiros devem
entregar as armas. Parte do arsenal de fuzis deve ser derretido para que a
Organização das Nações Unidas possa criar três monumentos em homenagem à paz.
Origem das Farc
A história política da Colômbia é marcada por
conflitos. Entre os anos de 1948 e 1958, os dois partidos tradicionais da
República Colombiana protagonizaram um período conhecido como “A Violência”,
marcado por confrontos armados. Nesse contexto, surgiram diversos grupos
guerrilheiros de “autodefesa”, de inúmeras orientações políticas e ligados a
diferentes partidos.
A origem das Farc é em um pequeno foco de resistência
camponesa comunista. Em 1964, o movimento fez uma tentativa de fundar uma zona
autônoma marxista e proclamou a criação da República de Marquetalia, que foi
posteriormente atacada pelo Exército. A resposta a esse ataque foi a criação de
diversos focos de guerrilha, que, unidos, se tornaram as Farc. Esses grupos
montaram uma estrutura militar, com acampamentos em selvas e nas montanhas
colombianas.
Inspirados pelo êxito da Revolução Cubana, o projeto
político do grupo era pautado pela reforma agrária e a criação de um Estado
socialista. Para isso, buscaram combater o governo. Uma das principais formas
de financiamento do grupo era a cobrança do “imposto revolucionário”, uma taxa
imposta à população local.
A partir dos anos 1980, os guerrilheiros também
começaram a atuar no tráfico de drogas, na mineração ilegal e na indústria dos
sequestros para financiar suas atividades. Em seus anos de maior atuação, as
Farc praticaram sequestros, ataques e assassinatos. Por esses crimes, a
organização integra a lista internacional de organizações terroristas. Apesar
dos indícios, as Farc negam todas as acusações de envolvimento com o
narcotráfico.
O poder das Farc na Colômbia contribuiu para o
surgimento de grupos paramilitares de extrema direita, financiados por grandes
fazendeiros e empresários. Muitos são contratados para assassinar guerrilheiros
clandestinos e líderes de movimentos sociais. Atualmente, grupos paramilitares
tentam controlar as zonas produtoras de coca e o comércio das drogas.
O que há no processo de paz?
Durante as últimas décadas, várias foram as tentativas
de negociação frustradas entre o governo colombiano e a guerrilha. A negociação
entre as duas partes se dá com base em cinco eixos principais: situação das
vítimas, minas armadilhas e explosivos, tráfico de drogas, entrada na vida
política e reforma agrária.
Pesquisas de opinião mostram que a população
colombiana anseia por colocar o fim à guerra, mas tem dúvidas sobre diversos
pontos do acordo. Hoje, 70% da população apoiam as negociações para a paz.
Apesar disso, 80% dos colombianos se opõem à proposta de anistia aos
guerrilheiros, e 77% rejeitam a possibilidade de ex-combatentes se lançando
como candidatos em futuras eleições.
• Participação política
A ideia é que as Farc se tornem um partido político.
Agora, o acordo prevê o estabelecimento de garantias legais e segurança para o
surgimento de forças políticas de oposição.
• Reforma agrária
A reforma agrária é uma das principais reinvidicações
políticas das Farc. Se prosperar, a negociação lançará bases para uma aposta
robusta do governo no modelo de produção agrícola familiar nas regiões mais
afetadas pelo conflito.
• Reparação das vítimas
Em dezembro de 2015, as partes anunciaram um dos
acordos mais complexos da negociação que busca reparar as vítimas e sancionar
os responsáveis de delitos graves. Como parte desse acordo, serão formados
tribunais especiais que julgarão os guerrilheiros e agentes do Estado
envolvidos em crimes relacionados com o conflito. Os principais responsáveis
por crimes hediondos deverão ser julgados e punidos.
• Minas e explosivos
Mesmo se a guerra acabar, a Colômbia terá de conviver
com o perigo de minas enterradas em diversas regiões. Será preciso identificar
os locais infestados e realizar a descontaminação. Essas operações serão
realizadas por militares e deverão durar anos.
• Tráfico de Drogas
Desde a década de 1980, o narcotráfico alimenta e
agrava o conflito. Em maio de 2014, as Farc chegaram a um acordo com o governo
para a substituição de cultivos ilegais de coca em áreas de influência. Segundo
o governo dos Estados Unidos, as Farc controlam cerca de 70% do território onde
se cultiva a coca na Colômbia.
Guerra
do Contestado: 100 anos do fim
PONTOS-CHAVE
1. A Guerra do Contestado (1912-1916) foi um conflito
armado que opôs forças do governo e camponeses que viviam na região disputada
pelos Estados de Santa Catarina e Paraná.
2. A estrada de ferro entre São Paulo e Rio Grande do
Sul estava sendo construída por uma empresa norte-americana. Para a construção
da estrada de ferro, milhares de famílias de camponeses perderam suas terras.
Essas famílias de sertanejos pobres foram atraídas para o movimento liderado
pelo Monge José Maria.
3. Em meio à disputa entre Santa Catarina e Paraná, o
Monge José Maria e seus fieis fundaram “cidades-santas”, povoados autônomos que
atraíam os pobres e camponeses. Vistos como fanáticos e monarquistas, os
sertanejos foram reprimidos pelas forças oficiais. Estima-se que mais de 10 mil
pessoas morreram na guerra.
No final de julho de 1916, Adeodato Ramos estava
embrenhado na mata fugindo de tropas do exército. Ao sair para a estrada, foi
avistado por uma patrulha e, então, o último líder rebelde da Guerra do
Contestado se entregou. Sua captura colocou fim à revolta mais sangrenta do
século 20 no Brasil.
A Guerra do Contestado (1912-1916) foi um conflito
armado que opôs forças do governo e camponeses que viviam na região disputada
pelos Estados de Santa Catarina e Paraná. Ocorrido durante a República Velha, o
sangrento conflito teve origem na disputa de terras e deixou mais de 10 mil
mortos, vítimas dos combates, da fome e de doenças. No final, os rebeldes e
sertanejos pobres foram violentamente massacrados.
Causas da Guerra
Vários motivos contribuíram para a eclosão da guerra.
Desde o Império, Santa Catarina e Paraná tentavam definir seus limites
territoriais. A região da fronteira conhecida como “contestado” era alvo de
disputa judicial entre os dois Estados no início do século 20. Em 1904, o
Supremo Tribunal Federal deu ganho de causa aos catarinenses e reafirmou sua
decisão nos anos seguintes, mas a sentença era ignorada pelo governo
paranaense.
O governo brasileiro autorizou a construção de uma
estrada de ferro ligando os Estados de São Paulo e Rio Grande do Sul e que
cruzava as terras do contestado. Para isso, desapropriou uma faixa de terra de
30 quilômetros ao lado da rodovia, uma espécie de "corredor" por onde
passaria a linha férrea e que poderia ser explorada pela companhia que a
construísse.
A responsável pela construção foi a empresa
norte-americana Brazil Railway Company, do empresário Percival Farquhar. Além
das terras ocupadas para a construção, ele comprou uma grande área onde fundou
a Southern Brazil Lumber & Colonization, empresa que se tornou a maior
companhia madeireira da América do Sul.
Originalmente, os moradores dessas regiões de
concessão eram posseiros caboclos e pequenos fazendeiros que viviam da
comercialização de erva-mate e da madeira. Não tinham título da terra, mas
viviam há algumas gerações por ali. Com os empreendimentos de Farquhar, os
sertanejos que ali moravam foram desalojados à força e passaram a viver em
piores condições.
O clima ficou ainda mais tenso quando a estrada de
ferro ficou pronta. Ao fim das obras, o grande número de migrantes que se
deslocou para o local ficou sem emprego, formando uma legião de mão-de-obra
desempregada. Eles permaneceram na região sem qualquer apoio por parte da
empresa norte-americana ou do governo.
O messianismo do Monge José Maria
A exemplo da Guerra de Canudos (1896-1897), na Bahia,
a Guerra do Contestado foi uma revolta messiânica. E assim como Canudos, também
tinha um fundo antirrepublicano.
O messianismo é uma doutrina que acredita que o
Messias voltará para libertar o seu povo do mal e criar um lugar de paz e de
prosperidade. Na história dos séculos 19 e 20, esses movimentos eram liderados
por um líder carismático que fundava uma Cidade Santa, governada pelas leis
divinas. Os messianismos são considerados movimentos sociais por serem
coletivos e buscarem a destruição de estruturas consideradas injustas e a
construção de um novo mundo a partir da fé.
O principal líder da Guerra do Contestado foi o Monge
José Maria, que ganhou fama na região por seus supostos dons de cura e
profecias. Ele encontrou um povo sedento por ajuda e fez a promessa de
construir um povoado onde todos viveriam em paz, com prosperidade, justiça e
terras para trabalhar.
Guiados pela utopia de uma vida comunitária, o grupo
do beato passou a criar "cidades-santas" que atraíram os camponeses
expulsos das terras pela construção da estrada de ferro. Logo o líder passou a
envolver-se também com questões políticas. O Monge profetizava que a República
seria um sinal dos fins dos tempos e que os caboclos deviam lutar contra o
governo e pela volta do governo de Deus, o Regime Imperialista.
As comunidades eram autônomas e viviam sob os
princípios da igualdade e da irmandade. Sua existência começou a incomodar os
coronéis e grandes fazendeiros. Para os grupos políticos que mandavam na
região, os seguidores de José Maria eram vistos como “fanáticos” e “monarquistas”.
A Igreja Católica também não enxergava com bons olhos a liderança do profeta. O
governo passou a acusá-lo de ser um inimigo da República, que tinha como
objetivo desestruturar a ordem estabelecida.
Em 1912, o Monge José Maria foge com seus fieis para
Irani (SC). A chegada do grupo foi vista pelo Paraná como uma investida de
Santa Catarina para forçar a posse do território contestado. Uma expedição paranaense é montada para
prender o beato, que resulta no ataque chamado de “Combate do Irani”. O
confronto acaba com a morte de José Maria e do comandante das tropas oficiais.
O episódio deflagrou a Guerra do Contestado. Com a
morte de José Maria, cresceu a crença em sua ressurreição e os discípulos mais
fieis voltaram a se reunir e a criar novos redutos, nos quais se seguiam os
ensinamentos do monge. Era o início de uma ofensiva rebelde generalizada,
também caracterizada por saques e invasões de propriedades de coronéis.
Coronéis locais, forças estaduais e Exército se uniram
para combater o movimento e foram apoiados pelo presidente da República, Hermes
da Fonseca. Os camponeses, armados com armas precárias como espingardas de
caça, facões e enxadas, resistiram aos primeiros avanços.
Embora tenham tido pouco sucesso nos dois primeiros
anos do conflito, as forças oficiais obtiveram, a partir de 1914, sucessivas
vitórias sobre os revoltosos. Em muitos lugares, coronéis contrataram capangas
para caçar rebeldes. Entre março e abril de 1915, após longa batalha, veio
abaixo o povoado de Santa Maria (SC), a maior das cidades santas, com mais de
20.000 habitantes e que hoje está extinta.
Dados do Exército revelam que houve a participação de
mais de um terço do exército republicano brasileiro, a utilização de armamento
pesado e o pioneirismo da aviação militar em operações de guerra. Nesse
conflito, o Exército usou pela primeira vez pequenos aviões nos combates.
Violência:
Brasil tem o maior número absoluto de homicídios no mundo
PONTOS-CHAVE
1. Resultados do Atlas da Violência 2016 mostram que o
Brasil tem o maior número absoluto de homicídios no mundo. Uma em cada dez
vítimas de violência letal reside no Brasil.
2. Homens, jovens, negros e com baixa escolaridade são
a maioria das vítimas.
3. Na análise por cidades, a taxa de homicídios tem
diminuído nas grandes cidades, como São Paulo e Rio de Janeiro, e aumentado no
interior.
4. Os estados que implementaram políticas de segurança
mais efetivas tais como São Paulo, Pernambuco e Rio de Janeiro testemunharam
queda das taxas de mortes violentas.
**
Você tem medo de ser assassinado? No ano passado, o
Instituto Datafolha revelou que 8 entre 10 pessoas que vivem em cidades
brasileiras têm medo de morrer assassinadas. Mas o medo é desproporcional à
realidade. Ainda assim, os números registrados da violência letal estão cada
vez mais elevados.
Resultados do Atlas da Violência 2016 mostram que o
Brasil tem o maior número absoluto de homicídios no mundo. Uma em cada dez
vítimas de violência letal reside no Brasil. O estudo foi desenvolvido pelo
Instituto de Pesquisa Econômica aplicada (Ipea) e pelo Fórum Brasileiro de
Segurança Pública (FBSP), que analisaram dados do número de vítimas de
registros policiais e do Ministério da Saúde.
As informações mais recentes são de 2014, ano em que o
país bateu seu recorde histórico de homicídios - 59.627 registros– o que
equivale a uma taxa de homicídios de 29,1 (a taxa é calculada por 100 mil
habitantes). O índice é considerado epidêmico pela Organização das Nações
Unidas (ONU). Só para ter uma ideia, há dez anos, em 1996, a taxa de homicídios
nacional foi de 24,8 e em 2011 e atingiu a marca dos 27,1.
Em relação à taxa de homicídios, o Brasil está em 15º
no ranking mundial. Mas os dados do Atlas da Violência 2016 tornam o Brasil
campeão mundial de assassinatos, em números absolutos. Segundo o relatório,
“além de outras consequências, tal tragédia traz implicações na saúde, na
dinâmica demográfica e, por conseguinte, no processo de desenvolvimento
econômico e social”.
Segundo dados do Banco Mundial, em 2013, houve 437 mil
vítimas de homicídio em todo o planeta. Chama a atenção que 14 dos 20 países
considerados mais perigosos do mundo (aqueles com as maiores taxas de
homicídio) estão localizados na América Latina e no Caribe.
As vítimas no Brasil: jovem, negro e pobre
O gênero, cor e a educação podem determinar as chances
de alguém morrer? Segundo a pesquisa, se fossemos escolher um símbolo para
personificar a principal vítima de morte violenta no país, suas características
seriam um homem, jovem, negro e com baixa escolaridade. Ele ainda teria 21
anos, a idade em que o risco de ser assassinado é maior.
Isso porque os homens (92%) e jovens entre 15 e 29
anos (54%) são a maioria das vítimas. Em 2013, cerca de 29 jovens foram
assassinados por dia no Brasil. E mais: a probabilidade de um jovem com
escolaridade inferior a sete anos de estudo sofrer homicídio é 15,7 vezes maior
do que aqueles que possuem ensino superior completo.
Em relação à cor, 77% dos jovens que morrem
assassinados no Brasil são negros. E no período analisado de dez anos (entre
2004 e 2014) da pesquisa, foi registrado crescimento de 18,2% na taxa de
homicídio de negros e pardos, enquanto houve redução de 14,6% na taxa de
pessoas brancas, amarelas e indígenas. Em 2014, para cada não negro que sofreu
homicídio, 2,4 indivíduos negros foram mortos.
Essas discrepâncias são alarmantes. O estudo avalia
que uma possível explicação é que a taxa de homicídios diminuiu mais nos
Estados onde há proporcionalmente menos negros, como na região Sudeste e no
Sul. Ainda assim, se a comparação for feita por unidade federativa, a violência
contra a população negra é maior em quase todos (à exceção de Roraima e
Paraná), o que mostra que o grupo está mais exposto a situações de
vulnerabilidade e que essa situação reflete o racismo estrutural do país.
Os Estados
Entre os Estados, a situação de Alagoas é a que mais
preocupa. Os alagoanos estão no topo do ranking, com taxa de 63 homicídios por
100 mil habitantes. Em seguida aparecem Ceará, Sergipe, Rio Grande do Norte,
Goiás, Pará e Mato Grosso. O Estado que tem a menor taxa é Santa Catarina
(12,7%). Se Alagoas fosse comparado aos países mais violentos, ele estaria em
segundo lugar na lista.
Em seis Estados brasileiros, o aumento das taxas foi
superior a 100%, todos na Região Nordeste. O Rio Grande do Norte foi o que
apresentou maior crescimento no indicador (308%), seguido do Maranhão (209,4%)
e Ceará (166,5%).
Por outro lado, São Paulo teve a maior redução na taxa
de homicídios, com queda de 52,4% entre 2004 e 2014. Outros sete Estados
apresentaram redução no indicador no mesmo intervalo: Rio de Janeiro (-33,3%),
Pernambuco (-27,3%), Rondônia (-14,1%), Espírito Santo (-13,8%), Mato Grosso do
Sul (-7,7%), Distrito Federal (-7,4%) e Paraná (-4,3%).
Nos Estados em que se verificou queda, o estudo
identificou que políticas de segurança pública foram adotadas, como no caso de
São Paulo, Espírito Santo, Rio de Janeiro e Pernambuco, esse último, o único do
Nordeste a diminuir a taxa.
Ações como a integração da Polícia Militar no Paraná,
a implementação das Unidades de Polícia Pacificadora no Rio de Janeiro e o
programa Pacto Pela Vida em Pernambuco foram citadas como possíveis
contribuições para a queda.
No estado pernambucano, por exemplo, o programa do
governo começou em 2007 e a curva de homicídios caiu nos anos seguintes. Apesar
dos avanços, os dados da violência do PE voltaram a subir este ano e o motivo
apontado é justamente a falta de continuidade das políticas do programa criado.
Diminuição nas grandes cidades e aumento nas cidades
do interior
Na análise por cidades, a taxa de homicídios tem
diminuído nas grandes cidades e aumentado no interior. As maiores quedas da
violência letal ocorreram nas localidades com maior população, enquanto os
maiores aumentos aconteceram em localidades com menor povoamento, mas com
crescimento rápido.
Entre 2004 e 2014, a maior diminuição da taxa foi
observada em São Paulo (-65%), com quase 15 milhões de habitantes. A queda
seria resultado de novas políticas públicas de segurança, como a integração das
polícias Civil e Militar e o desenvolvimento de sistemas de informações mais
eficientes, voltados às atividades de inteligência e análise criminal.
O crescimento mais acelerado foi observado na
microrregião de Senhor do Bonfim, na Bahia, com aumento de 1.136,9% no mesmo
período. Outro destaque é Cajazeiras, na Paraíba, que teve alta de 771%.
Desarmamento e a violência
A grande maioria dos homicídios no Brasil é cometida
com armas de fogo (76%). Segundo o estudo, o Estatuto do Desarmamento, em vigor
desde 2003, teria contribuído para uma menor circulação de armas no país. O
estudo estima que, se ele não tivesse sido implementado, o número médio de
homicídios entre 2011 e 2013 seria de 77.889, e não de 55.113.
O Estatuto passou a exigir do interessado em comprar
arma para sua defesa alguns requisitos básicos, como teste de aptidão e
psicológico. Segundo o IPEA, após a lei, a média de armas compradas anualmente
no mercado civil brasileiro caiu 40%. Não se sabe o número de armas ilegais no
país.
O que faz o Brasil matar demais?
A violência é
um fenômeno social complexo, influenciado por diversos fatores. Segundo
especialistas, as desigualdades econômicas e sociais estruturais, a
criminalidade associada ao tráfico de drogas, a existência de grupos de
extermínio, as práticas repressivas em detrimento das ações preventivas e de
investigação, a violência policial e as altas taxas de impunidade da Justiça
(somente 5 a 8% dos homicídios no Brasil chegam a virar processo criminal) são
algumas explicações para as altas taxas do país.
Brexit:
Reino Unido decide deixar a União Europeia
Os
pontos-chave
1. Plebiscito do Reino Unido votou por saída da União
Europeia e a decisão histórica foi chamada de Brexit.
2. Políticos britânicos que apoiam a saída consideram
que o Reino Unido deve criar restrições a imigrantes e de exercer uma política
econômica independente da União Europeia.
3. A grave recessão econômica e o aumento do número de
refugiados reacendeu o sentimento anti-imigração, a xenofobia e o medo de que
os estrangeiros passem a competir no mercado de trabalho com o cidadão
britânico.
4. A decisão do Reino Unido pode balançar o futuro da
União Europeia e estimular outros países-membros a sair do bloco.
Em junho, um plebiscito foi realizado por todo o Reino
Unido, perguntando se a população queria continuar ou sair da União Europeia
(UE). A votação foi apertada e apontou que 52% dos britânicos apoiam a saída do
bloco comum. A decisão gerou grande repercussão.
Após a inesperada vitória do “sim”, o primeiro-ministro
britânico David Cameron anunciou que vai renunciar, por não concordar com o
resultado. "Um novo primeiro-ministro precisa liderar as negociações sobre
a saída da Grã-Bretanha da UE", disse ele.
O Reino Unido é formado pela Inglaterra, País de
Gales, Irlanda do Norte e Escócia. A União Europeia foi criada oficialmente em
1992 e se tornou o maior bloco econômico do mundo, com 28 países da Europa.
Suas origens remontam à Comunidade Econômica Europeia (CEE), criada em 1957. O
Reino Unido aderiu à CEE em 1973.
A União Europeia representa hoje um processo bastante
avançado de integração econômica, garantindo a livre circulação de pessoas,
bens, serviços e capitais. Além disso, diversos membros adotaram uma moeda
comum, o Euro, e uma plataforma política e de valores democráticos, com o
funcionamento de um Parlamento Europeu que possui responsabilidades
legislativas, orçamentais e de supervisão.
Desde que foi criada, nenhum país-membro deixou a
União Europeia e a decisão do Reino Unido é inédita. O rompimento histórico dos
britânicos com a UE está sendo chamado de “Brexit”, expressão que mistura as
palavras “Britain” (“Bretanha”) e “exit” (“saída”). A palavra foi usada
inicialmente para identificar o movimento de quem estava a favor da saída.
A campanha pelo Brexit foi liderada por vários
políticos conservadores. Alguns políticos de esquerda também apoiam a saída e
criticam as políticas de austeridade fiscal e liberalismo econômico promovidas
pelo bloco.
Um dos principais articuladores do movimento foi o
partido nacionalista UKIP. Horas antes do resultado das urnas, o então líder do
UKIP, Nigel Farage, desejou que o resultado do referendo "leve à
destruição deste projeto falhado [a UE] e permita criar uma Europa de nações
soberanas com relações comerciais".
Ao longo da campanha, Farage e outros políticos
atiçaram o eleitorado com uma propaganda que foi acusada de exagerar os riscos
trazidos pela imigração e de apelar para a identidade nacional. O argumento
central era de que o Reino Unido não poderia controlar o número de pessoas
entrando no país enquanto continuasse no bloco.
Esses políticos favoráveis ao Brexit consideram que o
Reino Unido deve exercer a soberania nacional e ditar suas próprias regras. Entre
as reivindicações, o desejo de criar restrições a imigrantes e de exercer uma
política econômica independente (que não dependa das decisões da União
Europeia).
O que muda com a saída do Reino Unido?
O futuro ainda é incerto. A saída do Reino Unido da UE
ainda não tem data definida para acontecer e o processo de afastamento deve ser
feito gradualmente em até dois anos. Para sair do bloco, o Reino Unido deve
informar formalmente a sua intenção e protocolar o artigo 50 do Tratado de
Lisboa, que regula o desligamento de membros do bloco. As negociações da saída
serão conduzidas por outro premiê que ainda será eleito.
O mercado único, sem impostos nem tarifas comerciais,
é o grande motor das relações comerciais na Europa. No processo de saída, o
Reino Unido deixará de fazer parte dos tratados que a UE celebra e pode levar
alguns anos para alterar todas as leis e acordos de cooperação entre os membros
do bloco e negociar novas relações comerciais com os vizinhos.
O mercado financeiro avaliou a decisão dos britânicos
como extremamente negativa. Analistas indicam que a economia britânica poderá
sofrer perdas significativas de investimentos e benefícios comerciais.
Especialistas do FMI (Fundo Monetário Internacional) se pronunciaram afirmando
que o desemprego aumentaria e o valor da libra esterlina (moeda britânica)
cairia.
Risco de contágio
O maior temor é que outros países da União Europeia
possam optar pelo mesmo caminho do Reino Unido. “O resultado do referendo é um
divisor de água para o projeto europeu”, disse a chanceler alemã Angela Merkel.
Por outro lado, alguns analistas acreditam que o Brexit servirá de estímulo
para mudanças no funcionamento da União Europeia e que pode impulsionar uma
reforma da política de imigração.
O fato é que muitos europeus estão descontentes com o
bloco. Uma recente pesquisa conduzida pelo Instituto Ipsos Mori, revelou que
45% dos europeus entrevistados acreditam que seu país deve convocar um
referendo de igual teor ao realizado pelo Reino Unido. Entre os italianos, 58%
da população quer um referendo e 48% votaria pela saída, caso essa consulta
acontecesse. Já entre os franceses, 55% deseja esse referendo e 41% também
votaria em deixar o bloco.
Um dos mais fortes candidatos a sair da União Europeia
é a Grécia, que enfrenta uma grave crise econômica. Recentemente a União
Europeia interveio no país e concedeu novos empréstimos sob a condição de que o
país impusesse várias medidas de austeridade, o que acabou piorando a situação.
Alexis Tsipras, primeiro-ministro grego e líder do
partido Syriza, ponderou que a decisão britânica reflete "as escolhas
extremas de austeridade que aprofundaram a desigualdade entre países do norte e
do sul, as cercas e as fronteiras fechadas e a recusa em dividir o fardo das
crises financeiras e de refugiados".
Mas nem todos os membros do Reino Unido concordam com
o resultado do plebiscito. A Escócia, por exemplo, protestou oficialmente
contra a saída da UE. Após o plebiscito, Nicola Sturgeon, primeira-ministra
escocesa, disse que “um novo referendo de independência na Escócia é muito
provável” e que considera “democraticamente inaceitável” que os escoceses, que
votaram em sua maioria pela permanência no bloco, sejam excluídos da UE.
Imigração, refugiados e xenofobia
O tema da imigração é um dos principais focos de
tensão na Europa. Um dos motivos é que a União Europeia adota o princípio da
livre circulação entre os Estados-Membros. Na prática, as fronteiras internas
dos países são abertas aos cidadãos da UE, que só precisam apresentar o bilhete
de identidade ou o passaporte para entrar no chamado Espaço Schengen (países
signatários do Acordo de Schengen). Cerca de 3 milhões de cidadãos da UE vivem
no Reino Unido, que é a nona com a maior
proporção de imigrantes do bloco no universo da população total.
Recentemente, guerras e conflitos no Oriente Médio e
na África levaram milhões de refugiados a fugir da crise humanitária e buscar
as fronteiras da Europa. A Síria, por exemplo, que vive uma guerra civil desde
2011, já gerou o deslocamento de mais de 4 milhões de pessoas para os países
vizinhos. O destino final de preferência são os países europeus. A Alemanha
espera a chegada de cerca de 800 mil refugiados neste ano.
Refugiados e imigrantes são categorias diferentes de
estrangeiros. O refugiado vai para outro país por uma questão de sobrevivência,
em razão de perseguição política ou conflitos. Já o imigrante busca emprego,
estudo e melhores condições de vida.
Além do intenso fluxo de refugiados, a ameaça
terrorista, que aumentou após os ataques em Paris, levanta a suspeita de que
terroristas e grupos radicais entrem no espaço da UE e se desloquem com
facilidade.
Essa onda migratória de refugiados e o medo da
violência eleva a pressão sob as fronteiras da UE e reacende o preconceito
contra estrangeiros. Em grego, “xénos” significa estrangeiro. “phobos”,
“fobia”, ou seja, medo. É da junção dessas duas palavras que surgiu o termo
xenofobia: medo ou aversão ao estrangeiro.
No Reino Unido, após o resultado do plebiscito,
ataques xenófobos aconteceram contra estrangeiros nas redes sociais e em
diversas regiões. Uma das comunidades mais atingidas foi a de imigrantes
poloneses. Na sede da associação da comunidade polaca, cartões com a frase
"Deixem a União Europeia, não queremos mais insetos polacos" foram
distribuídos pelas caixas do correio das famílias polacas e entregues nas
imediações de escolas no condado de Cambridgeshire. Atualmente 850 mil
poloneses vivem no Reino Unido.
A xenofobia se agravou no Reino Unido a partir de
2008, com a crise financeira que levou o governo a adotar medidas de
austeridade fiscal. A grave recessão econômica reacendeu o sentimento
anti-imigração e o medo de que os estrangeiros passem a competir no mercado de
trabalho e a disputar benefícios sociais com o cidadão britânico. Por outro
lado, diversos estudos mostram que os imigrantes europeus contribuem para a
economia britânica e para o dinamismo do mercado de trabalho, em um continente
que envelhece cada vez mais e que terá dificuldades no equilíbrio da
Previdência Social.
O sentimento de xenofobia dos europeus deve se agravar
nos próximos anos. A Hungria, que tem o partido político de extrema-direita
Jobbik, levantou um muro na fronteira com a Sérvia. Na França, cresce a
influência do Frente Nacional, partido político de extrema-direita comandado
por Marine Le Pen e que tem como um dos pilares principais a contenção da
imigração para a Europa, e uma agenda anti-UE.
Dívida
pública: Municípios e Estados brasileiros estão com os cofres vazios
Pontos-chave
A grave crise econômica do Brasil afetou a arrecadação
de impostos do governo e desestabiliza o equilíbrio financeiro das cidades, que
têm forte dependência das verbas da União. Em 2016, 60% dos municípios vão
fechar o ano com contas a pagar.
Com contas em vermelho, as prefeituras cortam despesas
e reduzem o funcionamento dos serviços essenciais oferecidos à população.
Os estados sofrem com o aumento da dívida e dos gastos
com pessoal. Estados entraram com recurso no STF (Supremo Tribunal Federal)
para decidir o tipo de juros aplicados no pagamento da dívida.
Os municípios devem cumprir a Lei de Responsabilidade
Fiscal, que determina um limite e um percentual de gasto com o funcionalismo
que não pode ser descumprido.
O pacto federativo, entre outras coisas, define a
forma como a receita tributária e as atribuições de União, estados e municípios
estão distribuídas na Constituição. Vários projetos visando a descentralização
desses recursos estão em tramitação no Congresso.
Falta de remédios nos hospitais. Redução da merenda
escolar. Ambulâncias sem gasolina. Carros de polícia sem manutenção. Lixeiros
em greve. Aposentados sem receber. Suspensão de programas sociais. Esse cenário
de colapso financeiro pode se tornar a realidade da maioria das cidades até o
final do ano. Isso porque a crise econômica do Brasil afetou a arrecadação de
impostos em todos os níveis do governo e deixou as contas públicas mais
desequilibradas.
Em 2015, o PIB do Brasil (a soma da riqueza de um
país) recuou 3,8% - a maior queda em 25 anos. Com a economia em recessão, caiu
o recolhimento de tributos vinculados ao setor industrial e ao comércio. Entre
2014 e 2015, a arrecadação caiu 4,5%. Com menos emprego e renda, as pessoas
diminuem o consumo e, com isso, também há um recolhimento menor de impostos.
Enquanto a economia não se recupera, a previsão do
governo federal é terminar o ano de 2016 com um déficit (quando as despesas são
maiores que as receitas) de R$ 170,5 bilhões. Esse seria o maior rombo fiscal
na história do país, resultado da queda das receitas e do aumento contínuo das
despesas. Será o terceiro ano seguido com as contas no vermelho. Em 2014, houve
um déficit de R$ 32,5 bilhões e, em 2015, o rombo foi de R$ 111 bilhões.
Diante da queda, o governo teria que cortar gastos
e/ou elevar impostos para fechar as contas e evitar um endividamento
descontrolado. Em 2015, ele já começou a aumentar tributos sobre carros,
cosméticos, água, luz, bebidas, combustível, entre outros. De acordo com o
Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação (IBPT), em 2016, o brasileiro
trabalhará 153 dias ou cinco meses somente para pagar impostos e taxas aos
cofres públicos. Esse comprometimento
chega a 41% da renda. Um aumento de impostos poderia gerar ainda mais recessão.
Apesar do aumento na receita, nos últimos anos, os
gastos do governo só cresceram: com Previdência Social, salário de servidores e
gastos obrigatórios que não podem ser reduzidos por lei (como educação e
saúde). Existe ainda a questão das desonerações de impostos promovidas pelo
governo federal para enfrentar os efeitos da crise internacional de 2008 e
incentivar a atividade econômica em determinados setores produtivos. Entre 2009
e 2013, o governo abriu mão de arrecadar R$ 6,1 bilhões de IPI (imposto sobre
produtos industrializados). Mas essas desonerações não surtiram o efeito
desejado e diminuíram ainda mais as receitas.
Hoje a matemática é simples. O governo gasta mais do
que arrecada e tem pouco dinheiro para investir. Os municípios são a parte mais
frágil dessa situação financeira. O Brasil possui hoje 5.568 municípios. Em
2015, 42,6% deles não conseguiram pagar todas as suas despesas. O número pode
aumentar. Segundo pesquisa da Confederação Nacional dos Municípios (CNM), 60%
das prefeituras vão terminar o ano de 2016 no vermelho.
Sem dinheiro em caixa, essas prefeituras não possuem
recursos para despesas como o pagamento de salários de funcionários e
fornecedores, benefícios sociais, obras de infraestrutura, além de serviços
públicos essenciais como saúde, educação do ensino fundamental e infantil,
segurança e limpeza urbana.
O orçamento apertado atinge diretamente o
funcionalismo público e a qualidade dos serviços. Em 576 cidades do Brasil, os
prefeitos não têm conseguido pagar em dia o salário dos servidores. Desse
total, 11% estão com atraso superior a seis meses, segundo levantamento da CNM.
Em 2015, por exemplo, sete em cada dez municípios de Minas Gerais tiveram
alguma dificuldade para pagar o 13º de funcionários.
Um dos primeiros sintomas da crise foram problemas na
educação e na saúde. Cerca de 70% dos municípios da pesquisa da CNM estão com
dificuldades na área, como o pagamento do piso do magistério, incapacidade de
transporte para a zona rural e falta de merenda escolar. Na saúde, 55% sofrem
com a falta de medicamentos e 33% relatam a falta de médicos em postos de
saúde.
Os municípios têm três fontes de receita: a
arrecadação própria (de Imposto Territorial, Imposto sobre Serviços e outras
taxas), uma parcela do Imposto sobre Circulação de Mercadorias (ICMS)
arrecadado pelo estado a as transferências de verbas do Fundo de Participação
dos Municípios (FPM), composto pela arrecadação do Imposto de Renda (IR) e
Imposto sobre Produto Industrializado (IPI).
O grande problema das cidades é a forte dependência
das verbas da União. Atualmente, apenas 10% delas conseguem obter, por seus
próprios meios, receita para sustentar suas despesas. A principal fonte de
receita da maioria dos municípios (para 60% deles) são os repasses da União do
Fundo de Participação dos Municípios (FPM).
Os repasses do FPM são fundamentais principalmente
para as pequenas cidades e para as que possuem baixa atividade econômica e que
não conseguem gerar receitas. No primeiro trimestre desse ano, o fundo diminuiu
seus recursos em 14% em comparação com o mesmo período do ano passado. Como a
dependência do FPM é alta, quanto menos o governo federal arrecada, menos
recebem as prefeituras.
Estados endividados
Em relação aos Estados, o problema da deterioração das
contas é o elevado endividamento e o crescimento das despesas com funcionários
públicos. Com a crise econômica, os juros e o dólar aumentaram e o cenário de
endividamento se agravou.
Os Estados com maiores dívidas em 2015 são o Rio Grande
do Sul, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Alagoas e São Paulo. O Rio de Janeiro
fechou o ano de 2015 com o maior endividamento junto a bancos federais, segundo
dados do Tesouro Nacional. Foram R$ 21 bilhões em dívidas.
O Rio Grande do Sul, que fechou o ano de 2015 com a
dívida em 227% da receita, ou R$ 68 bilhões – bem acima do estipulado pela lei,
que determina um teto de 200% sobre a receita. Desde 2015 o governo gaúcho vem
atrasando o pagamento da dívida com a União. Quando isso acontece, o Estado fica
impedido de contrair novos empréstimos e de receber transferências voluntárias
do governo federal, como os repasses do Fundo de Participação dos Estados
(FPE).
Mas a dívida não é a única culpada. Segundo o
Ministério da Fazenda, o maior gasto dos Estados foi com o aumento da folha
salarial. Um estudo do ministério mostra que a folha de pagamento em todos os
Estados e no DF subiu, em média, 96,6% entre 2009 e 2015.
No Rio de Janeiro, essas despesas subiram 146% durante
o período analisado. Nos últimos meses, o RJ atrasou e parcelou o pagamento de
servidores públicos e aposentados. Este ano, o governo fluminense indicou que
todos os órgãos e entidades da administração estadual terão de reduzir, em pelo
menos, 30% suas despesas.
Em 2016, diversos Estados tentam renegociar as dívidas
com a União. No início deste ano, o Supremo Tribunal Federal (STF) acatou ações
de 11 estados e começou a julgar se eles podem usar juros simples no cálculo
das dívidas com a União. Hoje está em vigor os juros compostos. A decisão final
deve sair no final de junho e poderá ajudar os estados a pagarem menos que o
exigido pelo governo.
O problema da chamada dívida pública dos Estados vem
se agravando desde a década de 90. Em 1997, houve uma grande negociação e a
União assumiu as dívidas dos Estados. Os governos estaduais passaram a dever
para o Tesouro e melhoraram os prazos de pagamento e taxas desse endividamento.
Esses contratos de dívidas passaram a ser reajustados sob a forma de juros
compostos.
Ao trocar a lógica dos juros compostos para os juros
simples, os saldos devedores dos Estados diminuirão consideravelmente. Porém, o
Ministério da Fazenda calcula que o governo federal pode perder R$ 313 bilhões
se o STF confirmar as decisões liminares e permitir aos estados pagarem suas
dívidas com juros simples. Para o ministério, a solução seria alongar o prazo
desses débitos, o que geraria um alívio extra no pagamento das parcelas mensais
das dívidas.
A Lei da Responsabilidade Fiscal
Muitos países adotam princípios e práticas de
responsabilidade fiscal para que a administração pública apresente condições
que promovam estabilidade e crescimento. No Brasil, a principal ferramenta é a
Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei 101/2000) que visa combater os gastos e
endividamentos desenfreados públicos. Ela foi inspirada em experiências de
países da União Europeia, do Canadá e da Nova Zelândia.
A Lei de Responsabilidade Fiscal determina um limite e
um percentual de gasto com o funcionalismo que não pode ser descumprido. Ela
fixa o limite de até 60% das receitas com a folha de pessoal. A prefeitura que
ultrapassar o limite poderá ter punições, como deixar de receber transferências
do governo federal, ser penalizada com multa ou até mesmo ter a prisão do
gestor decretada em casos extremos.
O grande desafio dos Estados e municípios é realizar
um planejamento financeiro eficiente e deixar os gastos dentro da Lei de
Responsabilidade Fiscal. Com a atual crise, muitas administrações não vão
conseguir cumprir a lei.
Dados da Confederação Nacional dos Municípios (CNM)
mostram que, até abril, 22,5% das prefeituras haviam ultrapassado o limite com
a folha de pessoal fixado pela LRF. A lei dispõe que, nesses casos, as
prefeituras não poderão receber transferências voluntárias e de projetos e nem
contratar empréstimos que não se destinem à redução de despesas com pessoal.
O problema mais grave é na região Nordeste. A CNM
calcula que cerca de 80% dos 1,8 mil municípios do Nordeste descumprem o limite
de gasto com pessoal, correndo o risco de não conseguir honrar os compromissos
e manter o equilíbrio orçamentário por muito mais tempo.
O Pacto Federativo
A legislação determina quais impostos a União, Estados
e municípios podem cobrar e quais despesas têm de pagar. A Constituição de 1988
determinou as regras de distribuição das receitas tributárias da União entre os
três entes federativos.
Os constituintes de 1988 atribuíram à União a maior
parcela da receita fiscal, para que a atuação dela reduzisse os fortes
desequilíbrios regionais do país. Houve um incremento de aporte de recursos aos
municípios, mas em contrapartida, novas atribuições foram transferidas para a
responsabilidade deles.
O problema é que, ao definir as atribuições, a
Constituição criou necessidades e deveres, sem ter assegurado as fontes de
recursos. Assim, muitas cidades são obrigadas a prestar serviços essenciais,
mas não têm receita financeira ou capacidade para arcar com esses custos.
A Câmara dos Deputados possui diversas propostas de
alterações no sistema do Pacto Federativo. Segundo os defensores dessas
medidas, um novo pacto federativo pode ajudar a reduzir os desequilíbrios
regionais, evitar a guerra fiscal e impedir que a União prejudique as finanças
dos demais entes federativos no atendimento das necessidades da população.
Uma dessas propostas é a PEC 172/2012, que impede a
imposição ou transferência por lei de qualquer encargo ou prestação de serviços
aos estados ou aos municípios, sem a previsão de repasses financeiros
necessários ao seu custeio, como proposto na Lei de Responsabilidade Fiscal.
Para prefeitos e governadores, o governo federal
precisa dividir melhor o bolo e dar maior autonomia fiscal aos entes
federativos. Por exemplo, o sistema federativo brasileiro concentra as receitas
arrecadadas na União e transfere para os estados 24% e para os municípios 18%
dessa arrecadação.
Reforma
política: O que está em discussão?
O recente processo de abertura do impeachment da
presidente Dilma Rousseff que ocorreu em maio na Câmara dos Deputados e no
Senado mostrou o perfil de parlamentares que muitos eleitores ainda não
conheciam. Dos 511 deputados que participaram da votação histórica, apenas 34
tiveram votos suficientes para se elegerem sozinhos. Eles foram eleitos por
causa do sistema de voto proporcional (explicação abaixo). O sistema dá margem
para que um candidato seja eleito com relativamente poucos votos pessoais
porque seu partido recebeu muitos votos.
A votação do impeachment e os protestos de 2013
retomaram o debate da necessidade de uma reforma política, um conjunto de
propostas de leis e regulamentações para mudar as regras do nosso sistema
político. Ela tem vários objetivos, como acabar com distorções, definir o sistema
eleitoral, facilitar a participação plena da população no direito de escolher
seus representantes políticos, diminuir a corrupção e reduzir os gastos
públicos.
A ideia de uma reforma política não é nova. Desde que
a Constituição foi promulgada, em 1988, já se discute o tema. Em 2013, a
presidente Dilma Rousseff (PT) propôs a realização de um plebiscito para
instituir uma Assembleia Constituinte exclusiva para realizar uma reforma
política que contaria com cinco pontos-chave: financiamento de campanhas,
sistema eleitoral, suplência no Senado, coligações partidárias e voto secreto
no Senado. Em 2015, o Congresso Nacional votou alguns itens da PLC 75/2015 que
trata da reforma política, mas a maioria das medidas aprovadas pouco alterou a
atual estrutura política do Brasil.
Uma das decisões mais importantes veio do Supremo
Tribunal Federal (STF). Em setembro de 2015 o STF julgou inconstitucional o
financiamento e a doação de empresas a partidos e candidatos nas eleições.
Serão permitidas somente doações de pessoas físicas (limitadas a 10% dos
rendimentos no ano anterior) e recursos do fundo partidário. A decisão é válida
a partir das eleições de 2016 e pretende evitar desequilíbrios no processo
eleitoral, como a corrupção e a influência do poder econômico no resultado das
eleições. A Operação Lava-Jato, por exemplo, descobriu que empreiteiras usaram
doações a partidos como moeda de troca para contratos de obras públicas. Veja o
que está em discussão na reforma política:
Fim do voto proporcional
No sistema de voto proporcional, as eleições de
deputados federais, estaduais e vereadores dependem do cálculo do quociente
eleitoral, a quantidade necessária de votos para a eleição de um deputado em
seu Estado. O quociente é definido pela divisão do número de votos válidos pela
quantidade de vagas que cabe a cada Estado. A partir desse cálculo, são
estipuladas as vagas a que cada partido terá direito. Assim, o eleitor tem que
ficar de olho em qual partido vai votar. O problema é que os votos acabam indo
para deputados que o eleitor não escolheu. Candidatos com poucos votos podem
ser eleitos, “puxados” por aqueles mais votados do mesmo partido, mas que não
defendem os interesses do eleitor. Em 2014, Celso Russomanno (PRB), deputado
federal mais votado em São Paulo, ajudou a eleger outros quatro candidatos. Na
mesma eleição, o deputado federal Tiririca levou mais dois deputados do PR para
o Congresso.
Voto distrital
Uma das alternativas ao sistema proporcional seria a
adoção do voto distrital. Nesse modelo, os Estados seriam divididos em
distritos de acordo com o número de vagas para deputados, garantindo uma
quantidade semelhante de eleitores em cada um. Com isso, seria eleito no
distrito só o candidato que obtivesse mais votos, independentemente da votação
do partido. Os defensores dessa fórmula argumentam que a proposta aproxima o
candidato de seu eleitorado e garante a representatividade de todas as partes
do Estado. Quem é contra afirma que tende a fortalecer os chamados “caciques
regionais” (políticos poderosos) e eliminar as minorias – que podem ficar sem
representação se não atingirem a maioria em nenhum distrito.
Limite do número de partidos
O sistema eleitoral brasileiro é partidário, ou seja,
os candidatos a se elegerem precisam estar filiados a partidos políticos. Em
2015, o Tribunal Superior Eleitoral reconheceu oficialmente três novos partidos
políticos – o Partido Novo, a Rede Sustentabilidade e o Partido da Mulher
Brasileira. Hoje o Brasil tem 35 partidos registrados oficialmente na Justiça
Eleitoral. Quem defende o limite de siglas argumenta que o atual número
dificulta a governabilidade, como o apoio de bancadas a propostas a serem
votadas. Alguns partidos pequenos também são criticados por um problema: não
possuem candidatos e cedem seu tempo no horário político na TV para siglas
maiores e depois são recompensados com cargos ou ministérios. Para diminuir
esse número de partidos, pode ser criada uma cláusula de barreira. Só entra no
Poder Legislativo quem conseguir uma porcentagem mínima de votos nacionais, por
exemplo, 5 a 8%. O problema é que partidos pequenos teriam dificuldade de
atingir a porcentagem e crescer.
Fundo Partidário para todos
O Fundo Partidário destina mensalmente recursos
públicos para assistência financeira aos partidos políticos registrados na
Justiça Eleitoral. Todos os partidos têm direito a uma parte maior ou menor do
Fundo Partidário e do tempo de propaganda no rádio e na TV. A proposta de
restrição limita o direito a recursos do Fundo Partidário e do tempo de mídia
para partidos que tenham concorrido com candidatos próprios (sem levar em conta
a coligação) e que tenham elegido pelo menos um representante para a Câmara dos
Deputados ou Senado.
Fim da reeleição
A reeleição para os cargos executivos foi adotada em
1997, no governo de Fernando Henrique, que se reelegeu presidente. No modelo
atual, os governantes (presidente, governador e prefeito) se elegem para
exercer um mandato de quatro anos, com direito à reeleição. A nova proposta
parte do entendimento de que o detentor de cargo executivo leva vantagem sobre
seus concorrentes, já que tem mais visibilidade. A alternância no poder permite
diferentes pontos de vista para lidar com os problemas do país, mas pode
dificultar projetos de governo que buscam resultados no longo prazo. A proposta
de mudança geralmente está associada à ampliação dos mandatos para cinco anos.
Fim do voto obrigatório
No Brasil, o voto é obrigatório para todos os
brasileiros com mais de 18 anos e menos de 70. O voto só é facultativo aos
maiores de 16 e aos analfabetos. Mas muitas pessoas votam ser ter uma
consciência política, apenas pela obrigação e não porque se identificam com as
proposta do candidato. Atualmente, vários países, entre eles EUA, Alemanha e
Inglaterra, adotam o voto facultativo, pelo qual o cidadão decide livremente
comparecer ou não às urnas. O ponto negativo é que o processo democrático pode
acabar nas mãos de poucos ou estimular a prática do “voto de cabresto”, a troca
do voto por benefícios pessoais.
Parlamentarismo
Um sistema de governo é a forma como o poder político
de um país é dividido e exercido. A democracia brasileira é dividida entre os
poderes Legislativo (cria leis), Executivo (executa as leis) e Judiciário
(verifica se as leis são cumpridas). O poder legislativo brasileiro é exercido
pelo Congresso Nacional, que, por sua vez, é composto pela Câmara dos Deputados
e pelo Senado Federal. O Presidente da República é eleito pelo povo e atua como
a autoridade máxima do Poder Executivo.
A adoção do parlamentarismo substituiria o atual presidencialismo
de coalizão, modelo no qual o presidente precisa construir uma base aliada
entre os congressistas para conseguir aprovar suas propostas. Este modelo
estimula uma barganha por parte do Executivo, que oferece cargos da
administração pública a partidos em troca de apoio às propostas do governo. O
resultado é a crise de representatividade enfrentada por diversos presidentes.
No parlamentarismo, a chefia do governo é exercida por um primeiro-ministro
eleito pelos parlamentares. Desta forma, o Congresso ganharia mais poder na
política nacional. A fragilidade do sistema é que bancadas menores teriam
dificuldade de aprovar propostas.
Unificação das eleições
Hoje as eleições acontecem a cada dois anos,
intercalando pleitos para prefeitos e vereadores em um ano, e para presidente,
governadores, deputados e senadores dois anos depois. A proposta de eleições unificadas pretende
realizar eleições no mesmo ano. Dessa forma, haveria redução nos custos das
eleições.
Cultura
do estupro: Você sabe de que se trata?
Estupro. A palavra é forte. O crime, bárbaro. Pior, a
violência sexual é um medo pelo qual praticamente toda mulher já passou em
algum momento da sua vida.
E esse temor pode morar em situações corriqueiras,
como ao entrar no ônibus de noite sozinha ou andar por uma rua mal iluminada e
sem companhia. Agora, pense, será que esse medo deveria ser assim, algo quase
naturalizado em nossa sociedade?
Na última semana, dois casos de estupro recolocaram
esse tipo de violência na pauta. O assunto voltou com força -- nas redes
sociais e fora delas.
Os crimes que ganharam as telas dos computadores e das
TVs: uma adolescente de 16 anos foi violentada por um grupo (talvez mais de um
grupo) de homens no Rio de Janeiro, e teve vídeos disponibilizados na internet
da agressão. No Piauí, uma outra adolescente, de 17 anos, foi violentada por
quatro menores e um homem de 18 anos.
O que espanta, nos dois casos, é uma reação de
"normalidade", de "naturalidade" com que os agressores
trataram seus crimes. No caso da adolescente fluminense, o vídeo começou a
circular nas redes sociais como se fosse um troféu -- com a circulação do
vídeo, centenas de denúncias começaram a chegar no MP (Ministério Pùblico)
antes mesmo de a menina ir à polícia. O delegado responsável pelo caso do Piauí
conta que os menores disseram julgar "normal" o sexo do colega com a
menina desacordada.
O que caracteriza o estupro é ausência de
consentimento. O crime de estupro está previsto no artigo 213 do Código Penal
Brasileiro. A lei brasileira de 2009 considera estupro qualquer ato libidinoso
contra a vontade da vítima ou contra alguém que, por qualquer motivo, não pode
oferecer resistência. Ou seja, não importam as circunstâncias, se foi contra a
vontade própria da pessoa ou ela está desacordada é crime. Antes, o ato só era
caracterizado quando havia conjunção carnal com violência ou grave ameaça.
Diante da perplexidade de todos, os movimentos
feministas e pelos direitos humanos passaram a fazer campanhas contra a
"cultura do estupro".
Mas,
afinal, o que é cultura do estupro?
A expressão "cultura do estupro" surgiu nos
anos 1970 e foi usada por feministas para indicar um ambiente cultural propício
a esse tipo de crime por ter mecanismos culturais (normas, valores e práticas)
em que as pessoas acabam naturalizando e aceitando algumas violências em
relação à mulher.
Segundo esse conceito, o princípio que norteia essa
cultura é a desigualdade social existente entre homens e mulheres. As mulheres
são vistas como indivíduos inferiores e, muitas vezes, como objeto de desejo e
de propriedade do homem -- o que autoriza, banaliza ou alimenta diversos tipos
de violência física e psicológica, entre as quais o estupro.
"Ela provocou”, “ela estava de saia curta”, “ela
não deveria sair sozinha”, “ela não deveria estar na rua naquela hora”, “ela
não deveria ter bebido” ou “ela é uma mulher fácil” -- quando surge esse tipo
de comentário que coloca em dúvida a denúncia da vítima, estamos diante de um
traço da famigerada cultura do estupro.
Nesse contexto, as mulheres acabam se sentindo
responsáveis, culpadas pela violência que sofreram e ficam com vergonha de
denunciar.
Outra situação recorrente é quando surge a
argumentação de que o homem não consegue controlar seus instintos diante de uma
mulher por quem sente atração e, por isso, ele não teria culpa pela sua falta
de controle. É como se o ato brutal, a agressão, a violação fosse mera questão
sexual como se a responsabilidade não fosse do agressor já que ele "não
consegue se controlar".
A piada machista e depreciativa, o meme que compara
uma mulher a um animal, o assédio no trabalho, a cantada na rua, o xingamento a
uma mulher que se veste com roupas curtas, o silêncio e a omissão diante de um
caso de agressão. Todos esses atos e exemplos reforçam e sustentam a violência
contra a mulher. São comportamentos e hábitos vistos como banais, mas que podem
reforçar a ideia de que a mulher seja vista como um objeto ou como alguém que
vale menos.
Em uma cultura de estupro, o que se naturaliza são as
diversas formas de violência associadas à sexualidade da mulher e seu direito
ao próprio corpo e a seus desejos.
Crime
sem denúncias e falta de punição
Quando se fala em “estuprador”, é recorrente que a
imagem seja de um sujeito doente, um psicopata, um “monstro” à espreita
perseguindo mulheres na rua.
Mas a maioria dos casos de violência é praticada por
homens considerados pessoas "comuns" pela sociedade e, em muitas
situações, os abusadores são parentes ou amigos próximos da vítima.
O levantamento realizado pelo Ipea aponta que 24,1%
dos agressores das crianças são os próprios pais ou padrastos, e 32,2% são
amigos ou conhecidos da vítima.
Dados de 2014 registraram a ocorrência de 47,6 mil
episódios de violência sexual contra as mulheres. Isso significa que, a cada 11
minutos, uma mulher é estuprada no país. Em 2015, as delegacias registraram
51.090 ocorrências. Mas o número de vítimas pode ser ainda maior.
Segundo estimativas do Instituto de Pesquisa Econômica
Aplicada (Ipea), 527 mil pessoas sofrem algum tipo de violência sexual por ano
no Brasil. A projeção foi feita em 2013 e tem como base dados do Ministério da
Saúde, que fez o levantamento de vítimas em hospitais e postos de saúde da rede
pública.
A incerteza do número de casos de estupro se deve ao
fato de ele ser um dos crimes mais subnotificados no mundo todo. Nos Estados
Unidos, por exemplo, 68% das ocorrências não são denunciadas pelas vítimas. No
Brasil, o número é similar. Dados do Ministério da Justiça revelam que 64% das
agressões sexuais não são notificadas na polícia para posterior investigação e
punição.
Entre os motivos de a vítima não denunciar a violência
estão a vergonha moral do ato, o medo do julgamento social, o sentimento de
culpa e o medo de ser julgada e maltratada por autoridades e por aqueles de
quem deveria receber apoio e ajuda – em casa, na delegacia ou no hospital.
Existem ainda casos em que a vítima é menor de idade e convive com o agressor
dentro de casa ou que o agressor é o próprio companheiro.
Além de subnotificado, esse é um crime conhecido pela
impunidade. No Rio de Janeiro, por exemplo, dados do Ministério Público mostram
que apenas 6% dos casos de estupro chegam à Justiça.
Além disso, o exame de corpo delito é indispensável.
No entanto, nem sempre o estupro deixa provas (como hematomas, material
genético ou testemunhas) que possam provar se a relação sexual foi consentida
ou não. Isso porque estupro pode ser realizado sem que haja outras violências
físicas, basta uma ameaça. As provas mais comuns são o testemunho da vítima e
as informações colhidas na unidade de Saúde que realizou o primeiro
atendimento.
O drama da mulher que sofreu um estupro também não
para depois da violência. Quando a vítima busca justiça, muitas vezes ela é
desencorajada pelas pessoas ao seu redor. Ela vai sofrer críticas, e sua
palavra será questionada em frases como “você tem certeza que não quis?”,
"você vai denunciar mesmo, não quer voltar para casa e pensar
melhor?". Quando uma pessoa é
assaltada, por exemplo, quase nunca é questionada se ela foi vítima de um
assalto ou roubo. Já no estupro é usual presumir que a vítima esteja mentindo.
Tais fatores fazem com que a vítima se cale e sofra de maneira omissa por muito
tempo, não denunciando o autor por medo ou por acreditar que ele não será
punido.
O apoio do Estado no atendimento às vítimas também tem
falhas. A conduta jurídica em muitos casos está impregnada de preconceitos e
discriminações, especialmente em relação à mulher. Por exemplo, se uma
prostituta afirmar que foi estuprada, a reputação sexual da vítima pode ser um
motivo de preconceito em uma delegacia e o crime ser analisado a partir de uma
questão moral, como se isso pudesse justificar a desqualificação da mulher que
vive uma situação de violência.
No caso da adolescente que denunciou ter sido
estuprada no Rio, ela relata os constrangimentos a que foi inicialmente
submetida na delegacia. Os policiais buscavam descaracterizar o crime, tentando
retirar-lhe a condição de vítima, como se ela tivesse provocado a situação por
livre e espontânea vontade.
Nas redes sociais, internautas questionaram a
adolescente carioca por ela usar drogas, ser menor de idade e ter um filho,
conhecer traficantes, mostrar fotos sensuais em perfis da rede ou frequentar
bailes funk. A vítima, além de ter sido estuprada, foi vista como mentirosa e
ainda recebeu ameaças de morte dos internautas. O delegado da investigação
inicial foi afastado e a nova delegada que cuidou do caso pôde comprovar o
crime com base em imagens de vídeo em que a jovem, desacordada, tem o corpo
manipulado pelos agressores.
Uma
construção histórica
O Brasil tem uma herança cultural patriarcal. No
período colonial a mulher ficava submissa a regras que limitavam seu modo de
agir e se comportar. Algumas dessas funções eram definidas pelo grau de posição
social, raça e hierarquia familiar. Prevalecia a busca pela conservação dos
padrões da moral cristã e da honra. No entanto, havia uma clara hierarquia
social. Por exemplo, a sociedade escravagista tolerava o estupro de negras
escravas e índias por senhores de engenho.
No século 19, homens considerados “de bem” saiam
impunes de casos judiciais de estupro (sedução, rapto e defloramento). No
Código Civil de 1916, o homem era o chefe da família e a mulher era considerada
“relativamente incapaz”. Até os anos 1970, a tese de “legítima defesa da honra”
era admitida para inocentar quem assassinava a esposa. Nesse mesmo período,
debatia-se no meio jurídico se o marido poderia ser sujeito ativo do crime de
estupro contra sua esposa, uma vez que era dever dos cônjuges manter relações
sexuais.
Internet:
Privacidade versus segurança digital
Em fevereiro deste ano, uma batalha jurídica entre a
empresa Apple e o FBI se tornou pública. Após várias semanas, o FBI conseguiu
desbloquear o celular de um dos terroristas responsáveis pelo ataque que matou
14 pessoas na cidade San Bernardino (EUA) em dezembro de 2015.
O terrorista foi morto e o FBI dizia que informações
no celular bloqueado poderiam ajudar a elucidar as investigações. Assim, pediu
a Apple para desenvolver um novo software, uma espécie de “chave mestra” ou
“supersenha” para burlar a criptografia do iPhone e acessar a memória contida
no aparelho.
A Apple negou o pedido, alegando que isso
estabeleceria um precedente perigoso. Se o software caísse em mãos erradas,
colocaria em risco a segurança de todos os iPhones e a credibilidade da
empresa. Em nota, a empresa declarou “a Apple acredita profundamente que
cidadãos dos EUA e de outras partes do mundo merecem proteção aos seus dados,
segurança e privacidade. Sacrificar um desses itens em detrimento de outro só
coloca as pessoas e países em grande risco”. O posicionamento da Apple diante
do caso foi apoiado por outras empresas de tecnologia, como Google, Facebook e
Microsoft.
Após a negação da empresa, a questão foi parar na
justiça, o que poderia demorar muito tempo. A solução não aconteceu dentro do
judiciário – o governo americano dispensou a ajuda da Apple e conseguiu invadir
o iPhone de outra forma, com o apoio de especialistas em segurança digital. O
mecanismo de invasão não foi divulgado e o FBI retirou sua ação judicial. A
Apple afirmou que vai investir ainda mais na segurança dos aparelhos.
Este caso inédito levantou uma ampla discussão sobre
liberdades civis, segurança coletiva e a privacidade de dados digitais. Este é
um duelo judicial, mas também uma questão ética. Se perguntarmos se o governo
deve ter acesso aos nossos celulares, todos dizem “nem pensar”. Se a seguir
perguntarmos se a polícia deve poder entrar no celular de um terrorista ou de
uma pessoa morta, muitos dizem "claro que sim”.
A segurança de dados se tornou uma das grandes
questões do nosso tempo, em que a democratização da tecnologia digital e o uso
de redes sociais são crescentes. Além de informações pessoais como contas
bancárias, Imposto de Renda, fotos íntimas e e-mails, senhas e dados
criptografados protegem informações estratégicas de servidores e banco de dados
de empresas, instituições de pesquisa, agências do governo, usinas de energia e
bases militares.
Em 1999 Scott Mcneally, o CEO da Sun Microsystems, deu
declarações polêmicas afirmando inexistir privacidade quanto aos dados pessoais
armazenados em sistemas. No entanto, cada vez mais as pessoas esperam das
empresas uma maior segurança da informação. Na Europa o direito à proteção dos
dados pessoais é um direito fundamental da Carta Europeia dos Direitos
Fundamentais. A lei se aplica a todos os membros da União Europeia.
O caso do analista de sistemas Edward Snowden foi
emblemático na questão de segurança digital. Em 2013, o ex-funcionário da CIA
divulgou para a imprensa uma série de documentos sigilosos da Agência de
Segurança Nacional dos EUA que comprovaram atos de espionagem do governo
norte-americano em diversos países. Algumas autoridades brasileiras, dentre
elas a presidente da república, Dilma Rousseff, foram monitoradas pela NSA
(Agência Nacional dos Estados Unidos).
Depois do escândalo revelado por Snowden, há hoje um
maior consenso de que a privacidade digital faz parte dos direitos humanos e
que os Estados devem ser impedidos de forçar as empresas de tecnologia a
facilitar os acessos. Hoje diversos países sofrem pressão para criar ou
reforçar leis que evitem o acesso ilegal de dados.
No Brasil, um caso judicial recente de acesso a dados
foi o bloqueio do WhatsApp por ordem da Justiça. Em maio deste ano, a justiça
do estado de Sergipe determinou que operadoras de telefonia realizassem o
bloqueio do aplicativo de mensagem instantânea por 72 horas.
O bloqueio foi pedido porque o Facebook, dono do
WhatsApp, não cumpriu uma decisão judicial anterior de compartilhar informações
que subsidiariam uma investigação criminal sobre crime organizado e tráfico de
drogas. Em novembro de 2015, o juiz Marcel Montalvão pediu que o Facebook informasse
o nome dos usuários de uma conta no WhatsApp em que informações sobre drogas
eram trocadas no aplicativo.
Em nota, o WhatsApp Brasil declarou que "esta
decisão pune mais de 100 milhões de brasileiros que dependem do nosso serviço
para se comunicar, administrar os seus negócios e muito mais, para nos forçar a
entregar informações que afirmamos repetidamente que nós não temos."
O não fornecimento de informações sobre usuários do
aplicativo já havia resultado na prisão do presidente do Facebook para América
Latina em março deste ano. Não é a
primeira vez que um tribunal decide pela suspensão do acesso ao aplicativo no
Brasil. O bloqueio anterior ocorreu em dezembro de 2015, quando a Justiça de
São Paulo ordenou que as empresas impedissem a conexão por 48 horas em
represália ao WhatsApp ter se recusado a colaborar com uma investigação
criminal. O aplicativo ficou inacessível por 12 horas e voltou a funcionar por
decisão do Tribunal de Justiça de SP.
No Brasil, ainda não existe uma lei específica para
proteção de dados pessoais. Uma das principais leis a regulamentar o direito
digital é o Marco Civil da Internet (Lei n. 12.965/14), que entrou em vigor
este mês e que busca regularizar direitos e garantias de usuários e empresas em
relação ao uso da internet.
O Marco Civil da Internet prevê diversas
interpretações para a questão da proteção de dados pessoais. A lei entende como
uma das garantias de direitos do cidadão é o direito à inviolabilidade da
intimidade e da vida privada, assegurado o direito à proteção e à indenização
pelo dano material ou moral decorrente de sua violação; o direito à
inviolabilidade e ao sigilo de suas comunicações pela internet e comunicações
privadas armazenadas, salvo por ordem judicial e o não fornecimento a terceiros
de seus dados pessoais, inclusive registros de conexão, e de acesso a
aplicações de internet, salvo mediante consentimento livre.
O princípio da liberdade de expressão também é outro
pilar do Marco Civil, que entende que qualquer pessoa pode se expressar no meio
digital. As aplicações e provedores de acesso não serão responsabilizados por
postagens de seus usuários e as publicações só serão retiradas do ambiente
online mediante a ordem judicial.
Em maio deste ano, o PR (Partido da República)
ingressou no STF (Supremo Tribunal Federal) com Ação Direta de
Inconstitucionalidade para derrubar artigo do Marco Civil da Internet que daria
abertura para a suspensão do funcionamento de aplicativos usados para troca de
mensagens pela internet, como o WhatsApp.
Segundo o comando nacional do PR, a suspensão de
aplicativos como WhatsApp traria prejuízo à população e a profissionais
"antes de ser uma punição à empresa responsável, torna-se, em verdade, uma
medida que penaliza a própria população em geral, que confia no funcionamento
de tais serviços de comunicação para a dinâmica de seus relacionamentos
pessoais e profissionais".
Um dos artigos do Marco Civil poderia permitir à
justiça suspender aplicativos na internet, nos casos de descumprimento de
decisão judicial para quebra de sigilo. Porém, o referido artigo trata de
coleta, armazenamento, guarda e tratamento de registros, de dados pessoais ou
de comunicações por provedores de conexão e de aplicações de internet, ou seja,
se refere à privacidade e guarda de dados.
Outra discussão no debate sobre privacidade na
internet é a questão do direito ao “esquecimento digital”, uma garantia
jurídica para solicitar o apagamento de dados pessoais disponíveis na internet,
tais como informações sensíveis (questões políticas e econômicas, dados
médicos, religião, sexualidade) e dados individuais (perfil de compra,
circulação geográfica, imagens, salário etc).
Neste sentido, em 2014, o Tribunal de Justiça da União
Europeia determinou que a empresa Google e outros motores de busca devem
remover de seus resultados de buscas os links que remetam para páginas com
informações pessoais a respeito de cidadãos europeus que não quiserem ver seus
nomes associados a fatos que eles próprios considerem inadequados, irrelevantes
ou descontextualizados. Apesar disso, a regra não se aplica à imprensa, que tem
o seu direito de liberdade garantido.
No Brasil ainda não existe uma legislação clara sobre
o assunto. Em 2013, o debate teve início com o Enunciado 531 da VI Jornada de
Direito Civil, produzida através do CJF (Conselho da Justiça Federal). Baseado
no princípio da dignidade humana, o texto determinou que dentre os direitos
protegidos no que diz respeito à personalidade da pessoa humana na sociedade da
informação, deve estar o direito de ser esquecido. Assim, o Estado estaria
protegendo a intimidade e a vida privada das pessoas envolvidas.
Eleição
de Macri: Vitória reforça crise da esquerda na América do Sul?
Um fenômeno político tem chamado atenção na América do
Sul: presidentes mais populares e governos de esquerda estão perdendo espaço
para alas mais ao centro e conservadoras. A crise econômica seria um dos
principais motivos. E a recente mudança na Argentina é exemplo desse cenário.
A política argentina mudou de rumo com a eleição do
presidente Mauricio Macri em dezembro de 2015, após derrotar o candidato do
governo, o peronista Daniel Scioli. Ele é considerado de perfil mais
conservador que sua antecessora, Cristina Kirchner, de centro-esquerda.
A vitória de Macri pôs fim a 12 anos de governo
kirchnerista. Cristina governou o país desde 2007 e é viúva do presidente
Néstor Kirchner, presidente entre 2003 e 2007. O kirchnerismo é o termo que se
refere ao período que começou com o mandato de Néstor Kirchner. O casal
governou com estilo confrontativo e com um discurso considerado populista e de
esquerda.
No começo da gestão de Néstor, ele combateu a dívida
pública e o país registrou crescimento, com programas sociais voltados à classe
trabalhadora e apoio a medidas de direitos humanos. Nos últimos quatro anos, no
entanto, a economia caiu em recessão.
Após um calote em 2001, a Argentina praticamente não
teve mais acesso ao crédito internacional. Em 2011, Cristina implementou uma
política de controle cambial para frear a fuga de capitais. O resultado teve
efeito contrário e os investidores sumiram. O peso argentino se desvalorizou e,
hoje, os argentinos convivem com pelo menos três tipos de câmbio. Poupar em
dólares para se defender da inflação e pensar na moeda americana na hora da
compra e venda de imóveis são, por exemplo, hábitos tradicionais no país.
O presidente eleito Macri é considerado de perfil mais
conservador e liberal em relação à economia. Com uma nova postura avessa às
barreiras protecionistas, ele prometeu liberar o mercado de câmbios, estimular
a iniciativa privada, diminuir a pobreza, atrair investimentos internacionais e
fazer ajustes fiscais nas contas do Estado.
A economia argentina será a principal pedra no sapato
do novo presidente. Outro desafio de Macri será estabelecer alianças no
Congresso, onde o kirchnerismo tem maioria absoluta no Senado e é a primeira
força na Câmara dos Deputados.
A inflação está galopante e chegou a 35% em fevereiro.
Os preços dispararam nos últimos meses. Macri aumentou tarifas de serviços
públicos, transporte, luz e gás e o mercado reajustou os preços dos alimentos e
aluguéis. Houve um aumento de 300% na tarifa de eletricidade, colocando fim aos
subsídios concedidos nos últimos 12 anos ao fornecimento de energia elétrica.
Um dos efeitos mais imediatos do ajuste econômico é a
queda na renda e no poder de consumo dos mais pobres. Um estudo divulgado em
março pelo Centro de Inovação dos Trabalhadores da Argentina mostrou que o
poder aquisitivo dos 10% mais pobres do país caiu 23,8% desde dezembro de 2015.
O cenário elevou as pressões sociais e a mobilização de protestos da população.
No entanto, os sinais da economia indicam que a
Argentina está atraindo investimentos externos e aumentou suas exportações
agrícolas. Por enquanto a aprovação do presidente está em 60%. O aumento do
desemprego é a principal preocupação dos argentinos. A aposta do governo é que
os investimentos possam aumentar os indicadores sociais.
Outros países
Na Venezuela, nas eleições legislativas de dezembro
passado, o governo chavista de Nicolás Maduro foi derrotado. A oposição ganhou
maioria nas eleições parlamentares e viu nisso o começo de uma mudança política
no país em meio a uma crise. Foi a primeira vez que a oposição saiu vitoriosa
no Parlamento desde que ele foi criado, no ano de 2000, após a dissolução do
antigo Congresso.
A grave crise econômica (a inflação em 2015 foi de
180,9%) trouxe consequências amargas para a população venezuelana como apagões
de energia e escassez de produtos, alimentos e remédios. A insatisfação popular
cresce. Em janeiro e fevereiro, o Observatório Venezuelano de Conflitividade
Social (OVCS) registrou 1.014 pequenos protestos em todo o país, além de 64
saques a estabelecimentos comerciais.
Maduro atribui à crise atual a queda dos preços do
petróleo e a uma "guerra econômica" de empresários de direita para
desestabilizar seu governo. Já a oposição culpa o modelo socialista bolivariano
iniciado pelo já falecido ex-presidente Hugo Chávez em 1999.
Agora a oposição começou a coletar assinaturas para
ativar um referendo revogatório contra seu mandato. Para revogar o mandato de
Maduro é preciso que a votação seja feita até dezembro e o "sim"
supere o número de votos que ele recebeu quando foi eleito em 2013: pouco mais
de 7,5 milhões. Pesquisas independentes estimam que de 60% a 70% dos eleitores
votariam contra o presidente. Se obtiver sucesso, novas eleições presidenciais
poderiam ser convocadas.
Na Bolívia, o presidente Evo Morales teve este ano sua
primeira derrota eleitoral desde sua chegada ao poder em 2006. Os bolivianos
rejeitaram em referendo, realizado em fevereiro deste ano, a reforma
constitucional promovida pelo presidente para poder se candidatar a um quarto
mandato (2020-2025). Sua intenção era garantir seu projeto político para depois
de 2020, quando termina seu atual mandato.
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